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31/08/2018

TRIBUNAL DO JÚRI. QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE ENTRE OS JURADOS. MEMBRO DO CONSELHO DE SENTENÇA QUE AFIRMOU EM PLENA FALA DA ACUSAÇÃO QUE HAVIA CRIME. NULIDADE. OCORRÊNCIA.

Deve ser declarado nulo o júri em que membro do conselho de sentença afirma a existência de crime em plena fala da acusação. Durante seção plenária de julgamento pelo tribunal do júri, houve, por parte de um dos membros do conselho de sentença, expressa manifestação ouvida por todos e repreendida pelo juiz, acerca do próprio mérito da acusação, pois afirmou que havia "crime", durante a fala da acusação. Em tal hipótese, houve quebra da incomunicabilidade dos jurados, o que, por expressa disposição legal, era causa de dissolução do conselho de sentença e de imposição de multa ao jurado que cometeu a falta. Veja-se que, afirmar um jurado que há crime, em plena argumentação do Ministério Público, pode, sim, ter influenciado o ânimo dos demais e, pois, é de se reconhecer a nulidade, como adverte a doutrina: "a quebra da incomunicabilidade não implica apenas exclusão do jurado do conselho de sentença, mas a dissolução do conselho de sentença, se for constatada durante o julgamento, ou a nulidade absoluta do julgamento, caso somente seja constatada depois de encerrada a sessão."

HC 436.241-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, por unanimidade, julgado em 19/06/2018, DJe 27/06/2018


CPC/2015. DECISÃO QUE JULGA PROCEDENTE IMPUGNAÇÃO EM CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ENCERRAMENTO DE FASE PROCESSUAL. RECURSO CABÍVEL. APELAÇÃO.

No sistema regido pelo NCPC, o recurso cabível da decisão que acolhe impugnação ao cumprimento de sentença e extingue a execução é a apelação. Inicialmente, de acordo com a sistemática vigente, dois são os critérios para definição do pronunciamento jurisdicional como sentença: (I) conteúdo equivalente a uma das situações previstas nos arts. 485 ou 489 do CPC/2015; e (II) determinação do encerramento de uma das fases do processo, conhecimento ou execução. Importa salientar, ainda, que, o processo de execução será adequado para as situações em que esta é fundada em título extrajudicial (art. 771, NCPC). Nos demais casos, a execução ocorrerá numa fase posterior à sentença, denominada cumprimento de sentença (art. 513, NCPC), no bojo do qual será processada a impugnação oferecida pelo executado, e que se resolverá a partir de pronunciamento judicial que pode ser sentença ou decisão interlocutória, a depender de seu conteúdo e efeito. Destarte, se a decisão impugnada extinguiu a execução, nos termos do art. 924, juntamente com o previsto no § 1º do art. 203, é possível concluir que sua natureza jurídica é de sentença e não de decisão interlocutória, sendo cabível, nesses termos, o recurso de apelação, por expressa disposição do art. 1.009 do CPC/2015. Ademais, registre-se que o recurso cabível em face de decisões proferidas no cumprimento de sentença – acolhendo apenas em parte a impugnação e as que decidirem por sua total improcedência – é o agravo.

REsp 1.698.344-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 22/05/2018, DJe 01/08/2018


AÇÃO DE RESTAURAÇÃO DE AUTOS. PRAZO PARA PROPOSITURA. PROVIMENTO DA CORREGEDORIA LOCAL. NORMA DE NATUREZA PROCESSUAL. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DA UNIÃO. VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.

Tribunal de Justiça não tem competência para, por meio de provimento da respectiva Corregedoria, estabelecer prazo para a propositura de ação de restauração de autos. A restauração de autos visa à recomposição do conjunto de peças documentais do processo desaparecido, assim como à responsabilização do causador do desaparecimento. No entanto, verifica-se que o CPC/1973 e o CPC/2015 não preveem prazo para a sua propositura. No caso analisado, Corregedoria de Tribunal de Justiça fixou termo final para o seu ajuizamento sob pena de a parte perder o direito à restauração dos autos e ser obrigada a propor novamente a ação principal, criando verdadeiro prazo decadencial. A desse prazo decadencial é norma que impõe limite ao exercício do direito pela parte e, consequentemente, à prestação da atividade jurisdicional pelo Estado, razão pela qual não pode ser considerada mera regra de procedimento. Normas puramente procedimentais, com efeito, não podem adentrar aspectos típicos do processo, como competência, prazos, recursos ou provas são normas que versam sobre questões internas do órgão jurisdicional (interna corporis), de simples organização judiciária, a exemplo da autuação, distribuição e protocolo, custas processuais, lavratura de certidões, informações estatísticas, etc. Tal previsão, ademais, viola a garantia do devido processo legal, na sua vertente substancial, porquanto não é razoável que o silêncio do legislador possa ser interpretado pelo órgão jurisdicional em prejuízo da parte que não deu causa ao desaparecimento dos autos, sequer em favor daquela que se beneficia da suspensão do processo. Assim, ao estabelecer prazo para a propositura da ação de restauração de autos com a apresentação dos documentos necessários, o Tribunal de Justiça editou norma processual – cuja competência legislativa foi atribuída, pela Constituição Federal, privativamente à União (art. 22, I, CF/1988) – em ofensa ao devido processo legal, e violou os arts. 1.063 e seguintes do CPC/1973 (arts. 712 e seguintes do CPC/2015).
REsp 1.722.633-MA, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 07/08/2018, DJe 10/08/2018


USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. PRESCRIÇÃO AQUISITIVA. PRAZO. IMPLEMENTAÇÃO. CURSO DA DEMANDA. POSSIBILIDADE. FATO SUPERVENIENTE. ART. 462 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. CONTESTAÇÃO. INTERRUPÇÃO DA POSSE. INEXISTÊNCIA.

É possível o reconhecimento da usucapião de bem imóvel com a implementação do requisito temporal no curso da demanda. Registre-se inicialmente que, à luz do art. 462 do Código de Processso Civil de 1973, é dever do magistrado levar em consideração algum fato constitutivo ou extintivo do direito ocorrido após a propositura da ação, podendo fazê-lo independentemente de provocação das partes. O legislador consagrou o princípio de que a decisão deve refletir o estado de fato e de direito no momento de julgar a demanda, desde que guarde pertinência com a causa de pedir e com o pedido. Assim, cabe ao magistrado examinar o requisito temporal da usucapião ao proferir a sentença, permitindo que o prazo seja completado no curso do processo judicial. Essa linha de raciocínio também é confirmada pelo Enunciado n. 497 da V Jornada de Direito Civil (STJ/CJF), segundo o qual "o prazo, na ação de usucapião pode ser completado no curso do processo, ressalvadas as hipóteses de má-fé processual do autor". Evita-se, com isso, que o autor proponha nova ação para obter o direito que já poderia ter sido reconhecido se o Poder Judiciário apreciasse eventual fato constitutivo superveniente, cuja medida se encontra em harmonia com os princípios da economia processual e da razoável duração do processo. Na hipótese, havendo o transcurso do lapso vintenário na data da prolação da sentença e sendo reconhecido pelo tribunal de origem que estão presentes todos os demais requisitos, deve ser declarada a usucapião. Além disso, incumbe ressaltar que a contestação apresentada pelo réu não impede o transcurso do lapso temporal. Com efeito, a mencionada peça defensiva não tem a capacidade de exprimir a resistência do demandado à posse exercida pelo autor, mas apenas a sua discordância com a aquisição do imóvel pela usucapião. Contestar, no caso, impõe mera oposição à usucapião postulada pelos autores, e não à posse.
REsp 1.361.226-MG, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 05/06/2018, DJe 09/08/2018.


SERVIDOR PÚBLICO. PRETENSÃO DE REINTEGRAÇÃO EM CARGO PÚBLICO. AFASTAMENTO MOTIVADO POR PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. REGIME MILITAR. IMPRESCRITIBILIDADE.

São imprescritíveis as ações de reintegração em cargo público quando o afastamento se deu em razão de atos de exceção praticados durante o regime militar. É certo que a prescrição representa a regra, devendo o seu afastamento apoiar-se em previsão normativa. No entanto, verifica-se que a Constituição da República não prevê lapso prescricional para o exercício do direito de agir quando se trata de defender o direito inalienável à dignidade humana, sobretudo quando violados durante o período do regime de exceção. Nesse cenário, observa-se que esta Corte orienta-se no sentido de reconhecer a imprescritibilidade da reparação de danos, moral e/ou material, decorrentes de violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar, período de supressão das liberdades públicas. Por seu turno, a ação buscando a reintegração ao cargo público, deve seguir o mesmo regramento das ações indenizatórias, porquanto a causa de pedir também decorre da violação de direitos fundamentais perpetrada durante o regime militar. De fato, o retorno ao serviço público, nessa perspectiva, corresponde à reparação intimamente ligada ao princípio da dignidade humana, porquanto o trabalho representa uma das expressões mais relevantes do ser humano, sem o qual o indivíduo é privado do exercício amplo dos demais direitos constitucionalmente garantidos. Vale ressaltar, contudo, que a imprescritibilidade da ação que visa reparar danos provocados pelos atos de exceção não implica o afastamento da prescrição quinquenal sobre as parcelas eventualmente devidas. Diante desse quadro, a compreensão que melhor enaltece as balizas centrais da Constituição da República aponta no sentido de não incidir a prescrição para as pretensões de reintegração em cargo público quando o afastamento foi motivado pelos atos de exceção praticados durante o regime militar.

REsp 1.565.166-PR, Rel. Min. Regina Helena Costa, por unanimidade, julgado em 26/06/2018, DJe 02/08/2018


CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS FORA DO LIMITE DE VAGAS. SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS. EXCEPCIONALIDADE DO CASO CONCRETO. MANIFESTAÇÃO INEQUÍVOCA DA ADMINISTRAÇÃO SOBRE A NECESSIDADE DE SEU PROVIMENTO. AUSÊNCIA DE PROVA DE RESTRIÇÃO ORÇAMENTÁRIA. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO.

O candidato aprovado em concurso público fora do número de vagas tem direito subjetivo à nomeação caso surjam novas vagas durante o prazo de validade do certame, desde que haja manifestação inequívoca da administração sobre a necessidade de seu provimento e não tenha restrição orçamentária, ou qualquer obstáculo financeiro. Inicialmente, é preciso destacar que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 837.311/PI, Rel. Min. Luiz Fux, sob a sistemática da repercussão geral, reconheceu que da aprovação em concurso público decorrerá direito subjetivo à nomeação, se estiver demonstrada alguma das seguintes situações: a) quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas inserido no edital (RE 598.099); b) quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação (Súmula 15 do STF); e c) quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos aprovados fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da administração. Ocorre que o julgado consignou, ao final, outra premissa de direito: se surgirem novas vagas e houver manifestação inequívoca da administração sobre a necessidade de seu provimento e inexistir prova de restrição orçamentária ou de qualquer outro obstáculo de ordem financeira, a ser provado pelo poder público, para tal nomeação. A referida premissa, embora tratada como excepcionalidade do caso, aplica-se na situação em exame. Em primeiro lugar, porque o Banco Central do Brasil, autarquia a quem interessava o provimento dos cargos, dentro do período de validade do certame, enviou pedido escrito ao Ministério do Planejamento, no qual informava a existência das vagas e da "extrema relevância" quanto à nomeação adicional. Em segundo lugar, porque a própria área técnica interna do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, após ressaltar a viabilidade orçamentária do pleito da Presidência do Banco Central do Brasil, fez acostar a própria minuta autorizativa de nomeação, a qual nunca foi implementada. Assim, restou reconhecida a ilegalidade da omissão e o direito à nomeação dos candidatos aprovados ao cargo público.
MS 22.813-DF, Rel. Min. Og Fernandes, por maioria, julgado em 13/06/2018, DJe 22/06/2018
Informativo STJ nº630

COMPETÊNCIA. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO PERANTE O STJ. REGRA DA KOMPETENZ-KOMPETENZ. ART. 105, I, "A" DA CF/1988. INTERPRETAÇÃO SIMÉTRICA ÀQUELA CONFERIDA, PELO STF, AO ART. 102, I, "B" E "C". QO NA AP 937. MARCO TEMPORAL PARA A PRORROGAÇÃO DA COMPETÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR. PUBLICAÇÃO DO DESPACHO DE INTIMAÇÃO PARA APRESENTAÇÃO DE ALEGAÇÕES FINAIS.

As hipóteses de foro por prerrogativa de função perante o STJ restringem-se àquelas em que o crime for praticado em razão e durante o exercício do cargo ou função. Inicialmente cumpre salientar que, em atenção ao princípio ou à regra da Kompetenz-Kompetenz, esta Corte superior deve exercer o controle da própria competência, máxime em se tratando de ações originárias, porquanto atua, nesses casos, não como corte de revisão ou de superposição, mas como primeiro julgador da causa. O caso em tela limita-se a determinar, diante do enunciado normativo do art. 105, I, "a", da Constituição Federal, qual é o sentido e o alcance que se lhe deve atribuir, isto é, qual é, de acordo com a exegese sistemática e teleológica do ordenamento jurídico nacional, a norma jurídica que se deve extrair do referido dispositivo constitucional. A Corte Suprema, no julgamento na QO na AP 937, fixou o entendimento de que "o foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas", aplicando tal entendimento ao caso então em análise, que se referia a Deputados Federais e Senadores. Impõe-se conferir ao art. 105, I, "a", que trata da competência penal originária desta Corte Superior, interpretação simétrica àquela conferida pelo Supremo Tribunal Federal, ao art. 102, I, "b" e "c", sob pena de se quebrar a coerência, a integridade e a unidade da Constituição, máxime tendo em vista que ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio ("onde existe a mesma razão fundamental, prevalece a mesma regra de direito"). Depreende-se de uma simples leitura dos referidos dispositivos constitucionais que ambos possuem redação simétrica, isto é, ambos estabelecem competências penais originárias, distinguindo-se, tão somente, no que diz respeito aos sujeitos ali elencados. Ademais, fixada a tese segundo a qual o foro por prerrogativa de função se aplica apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas, impende assestar o marco temporal para fins de prorrogação da competência do STJ. Nesse diapasão, o critério do fim da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, parece adequado como marco temporal para a prorrogação da competência desta Corte superior para julgamento das ações penais originárias, visto constituir referência temporal objetiva, privilegiando, ainda, o princípio da identidade física do juiz, ao valorizar o contato do magistrado julgador com as provas produzidas na ação penal.

AgRg na APn 866-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 20/06/2018, DJe 03/08/2018


PRERROGATIVA DE FORO. COMPETÊNCIA CRIMINAL ORIGINÁRIA DO STJ. ART. 105, I, "A", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CRIME EM TESE SEM RELAÇÃO COM O CARGO. DESEMBARGADOR. INSTRUÇÃO NÃO ENCERRADA. QO NA APN 937/STF. IMINÊNCIA DA PRESCRIÇÃO. PRORROGAÇÃO DA COMPETÊNCIA. EXCEPCIONALIDADE.

A iminente prescrição do crime praticado por Desembargador excepciona o entendimento consolidado na APn 937 – o foro por prerrogativa de função é restrito a crimes cometidos ao tempo do exercício do cargo e que tenham relação com o cargo – e prorroga a competência do Superior Tribunal de Justiça. Inicialmente cumpre salientar que o voto condutor do acórdão proferido pelo STF na QO na APn 937 considerou que a cláusula constitucional que confere prerrogativa de foro a agentes públicos deve ser compreendida à luz dos princípios constitucionais estruturantes da igualdade e da República. Isto porque, tal como qualquer outro cidadão, os agentes públicos devem responder comumente pela prática de delitos que não guardem relação com o desempenho das funções inerentes ao cargo que ocupam. Como o foro por prerrogativa de função é uma exceção ao princípio republicano, concluiu o STF que ele deve ser interpretado restritivamente, de modo a funcionar como instrumento para o livre exercício de certas funções públicas, mas não de modo a acobertar agentes públicos da responsabilização por atos estranhos ao exercício de suas funções. Na sessão de julgamento de 20/06/2018, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça finalizou o julgamento da Questão de Ordem na Ação Penal 857 e efetuou o julgamento de Agravos Regimentais na Ação Penal 866, fixando o entendimento de que as razões de decidir adotadas pelo STF no julgamento da QO na AP 937 se impunham igualmente na interpretação da extensão da prerrogativa de foro que a Constituição (art. 105, I, "a") confere aos Conselheiros de Tribunais de Contas e aos Governadores. Na hipótese, situação em que o réu é Desembargador, em que, como visto, a extensão da prerrogativa de foro é questão a ser ainda enfrentada pela Corte Especial, e o cumprimento da pena pelo crime cometido pode restar prejudicado pela iminente ocorrência da prescrição, o processamento da ação penal permanecerá no Superior Tribunal de Justiça.

QO na APn 703-GO, Rel. Min. Benedito Gonçalves, por unanimidade, julgado em 01/08/2018, DJe 09/08/2018.


ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA. MAIORIDADE CIVIL. AQUISIÇÃO POSTERIOR A FATO EQUIPARADO A DELITO PENAL. IRRELEVÂNCIA PARA A CONTINUIDADE DO CUMPRIMENTO DA MEDIDA ATÉ 21 ANOS.

A superveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso, inclusive na liberdade assistida, enquanto não atingida a idade de 21 anos. De início, note-se que a partir do momento em que foi sancionado o Estatuto da Criança e do Adolescente, observou-se um período intermediário, compreendido entre os 18 e os 21 anos, no qual se poderia ter um indivíduo considerado relativamente incapaz para a prática dos atos da vida civil, porém, sob o aspecto criminal, seria capaz. Daí exsurge a premissa de o legislador ter previsto no parágrafo único do art. 2º da Lei n. 8.069/1990, que, nos casos expressos em lei, aplicar-se-iam as normas previstas no ECA, também, às pessoas entre 18 e 21 anos. Ainda que inexistente norma expressa no sentido da extinção da medida socioeducativa pelo implemento da maioridade civil, é inegável que a inserção desta excepcionalidade de aplicação do ECA para além dos 18 anos – e da qual nos valemos para impor a execução das medidas de semiliberdade e internação até os 21 anos, se o caso – deu-se ante a iminente necessidade de, à época, se ampliar a proteção integral prevista na Lei n. 8.069/1990, para até o atingimento da maioridade civil, mesmo que, nessa faixa etária, o agente não pudesse mais ser considerado criança e nem sequer adolescente. Sobre o tema, este Superior Tribunal considera que, nos termos da interpretação do art. 121, § 5º, da Lei n. 8.069/1990, para sujeitar o adolescente às medidas socioeducativas, [...] deve ser considerada a inimputabilidade penal à data do fato. Diante disso, esta Corte assentou o entendimento segundo o qual a superveniência de maioridade relativa (período entre 18 e 21 anos) não tem o condão de extinguir a medida socioeducativa, a qual ocorrerá apenas com a liberação compulsória do menor, aos 21 anos de idade [...] (HC n. 352.662/RJ, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 24/2/2017). Nesses termos é que foi editada, pela Terceira Seção deste Superior Tribunal, a Súmula 605/STJ: A superveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso, inclusive na liberdade assistida, enquanto não atingida a idade de 21 anos. REsp 1.705.149-RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 13/06/2018, DJe 13/08/2018.


PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR FECHADA. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA PATROCINADORA. EVENTUAL ATO ILÍCITO PRATICADO PELO PATROCINADOR. EXCLUSÃO DO ÂMBITO DA MATÉRIA AFETADA.

O patrocinador não possui legitimidade passiva para litígios que envolvam participante/assistido e entidade fechada de previdência complementar, ligados estritamente ao plano previdenciário, como a concessão e a revisão de benefício ou o resgate da reserva de poupança, em virtude de sua personalidade jurídica autônoma. Não se incluem, no âmbito da matéria afetada, as causas originadas de eventual ato ilícito, contratual ou extracontratual, praticado pelo patrocinador. A questão controvertida consiste em saber se, em ação de revisão de benefício de previdência privada, possui a patrocinadora legitimidade passiva para figurar em litisconsórcio envolvendo a entidade previdenciária. Na hipótese, como se trata de relação contratual em que a entidade fechada de previdência privada não opera com patrimônio próprio, havendo mutualismo, a legislação de regência impõe e fomenta um sentido de autorresponsabilidade à coletividade dos participantes e assistidos dos planos de benefícios ao, efetivamente, propiciar ampla participação, não só no tocante à gestão, mas também no que diz respeito ao controle dos atos de gestão envolvendo o plano de benefícios. Conforme a lei de regência, portanto, a forma de composição do déficit, em respeito à própria autonomia privada e à regra legal a impor que os participantes e assistidos também participem do equacionamento do resultado deficitário, não será estabelecida arbitrariamente pelo Judiciário, mas decorrerá de prévia deliberação no âmbito interno da própria entidade previdenciária, isto é, do Conselho Deliberativo, com a participação de representantes do patrocinador e dos participantes e assistidos (que são eleitos por seus pares). Outrossim, também a título de oportuno registro, é bem de ver que o art. 6º, § 3º, da Lei Complementar n. 108/2001, estabelece ser vedado ao patrocinador assumir encargos adicionais para o financiamento dos planos de benefícios, além daqueles previstos nos respectivos planos de custeio. A única responsabilidade solidária prevista na legislação de regência ocorre entre patrocinadores ou entre instituidores, e apenas quando expressamente previsto no convênio de adesão (art. 13, § 1º, da Lei Complementar n. 109/2001). Nessa hipótese, o patrocinador pode responder por dívida de outro patrocinador, mas não pela parte que cabe aos participantes e assistidos. Assim, não se trata de hipótese em que o litisconsórcio é imposto pela lei, tampouco se cuida de uma única relação jurídica indivisível. As entidades de previdência privada têm personalidade jurídica e patrimônios próprios, e consoante dispunham os artigos 14 e 39 da Lei n. 6.435/1977 e dispõem os artigos 32 e 36 da Lei Complementar n. 109/2001, operam os planos de previdência privada, não havendo cogitar em formação de litisconsórcio passivo com a patrocinadora e/ou participantes e beneficiários do plano de previdência privada. No ponto, é antiga e firme a jurisprudência das turmas de direito privado, em afastar a legitimidade do(a) patrocinador(a) para figurar no polo passivo de litígios envolvendo participante e entidade de previdência privada, em que se discute matéria referente a simples aplicação de disposição regulamentar de plano de benefícios, aplicação de índices de correção monetária, resgate de valores vertidos ao fundo, entre outros temas afins.

REsp 1.370.191-RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 13/06/2018, DJe 01/08/2018


PREVIDÊNCIA PRIVADA FECHADA. HORAS EXTRAORDINÁRIAS HABITUAIS. INCORPORAÇÃO AO SALÁRIO. RECONHECIMENTO PELA JUSTIÇA TRABALHISTA. INCLUSÃO NOS CÁLCULOS DE PROVENTOS DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRÉVIO CUSTEIO. EVENTUAL PREJUÍZO DO PARTICIPANTE. AÇÃO PRÓPRIA NA JUSTIÇA DO TRABALHO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO. POSSIBILIDADE DE RECÁLCULO DO BENEFÍCIO EM AÇÕES JÁ AJUIZADAS.

Teses definidas para os fins do art. 1.036 do CPC/2015: a) a concessão do benefício de previdência complementar tem como pressuposto a prévia formação de reserva matemática, de forma a evitar o desequilíbrio atuarial dos planos. Em tais condições, quando já concedido o benefício de complementação de aposentadoria por entidade fechada de previdência privada, é inviável a inclusão dos reflexos das verbas remuneratórias (horas extras) reconhecidas pela Justiça do Trabalho nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria; b) os eventuais prejuízos causados ao participante ou ao assistido que não puderam contribuir ao fundo na época apropriada ante o ato ilícito do empregador poderão ser reparados por meio de ação judicial a ser proposta contra a empresa ex-empregadora na Justiça do Trabalho; c) modulação dos efeitos da decisão (art. 927, § 3º, do CPC/2015): nas demandas ajuizadas na Justiça comum até a data do presente julgamento – se ainda for útil ao participante ou assistido, conforme as peculiaridades da causa –, admite-se a inclusão dos reflexos de verbas remuneratórias (horas extras), reconhecidas pela Justiça do Trabalho, nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria, condicionada à previsão regulamentar (expressa ou implícita) e à recomposição prévia e integral das reservas matemáticas com o aporte de valor a ser apurado por estudo técnico atuarial em cada caso; d) nas reclamações trabalhistas em que o ex-empregador tiver sido condenado a recompor a reserva matemática, e sendo inviável a revisão da renda mensal inicial da aposentadoria complementar, os valores correspondentes a tal recomposição devem ser entregues ao participante ou assistido a título de reparação, evitando-se, igualmente, o enriquecimento sem causa da entidade fechada de previdência complementar. A questão controvertida consiste em definir se é possível incluir, nos cálculos dos proventos de complementação de aposentadoria pagos por entidade fechada de previdência privada, as horas extraordinárias habituais incorporadas por decisão da justiça trabalhista à remuneração do participante de plano de previdência complementar. Registre-se, de início, que o contrato de previdência complementar tem suas bases firmadas no convênio de adesão entabulado entre a entidade de previdência privada e o patrocinador, no regulamento do plano de benefícios e no estatuto da entidade que administra o plano. Dessa forma, a relação jurídica estabelecida entre as partes envolvidas é de direito privado. Há de se ressaltar, no entanto, que, nada obstante o caráter privado dessa modalidade contratual, os planos de benefícios instituídos pelas entidades fechadas de previdência privada estão sujeitos a rígido regramento estatal. É o que se infere do disposto no art. 3º da Lei Complementar n. 109/2001. Assim, devem ser respeitadas a exigência legal de se adotar o regime de capitalização e a necessidade de manter o equilíbrio atuarial do plano de benefícios. Qualquer alteração nas relações individuais entre entidade e participante que traga mudança nas regras de custeio e de concessão de benefícios pode ter reflexo nas reservas garantidoras do plano, impondo o equacionamento exigido pelo art. 21 da Lei Complementar n. 109/2001. A tese firmada no julgamento diz respeito às hipóteses em que não houve pagamento das horas extras, enquanto vigente o contrato de trabalho, tendo sido reconhecida a existência de jornada extraordinária em ação autônoma, da qual a entidade de previdência privada não participou, quando o participante já se encontrava em fruição do benefício suplementar. Logo, o valor respectivo não se refletiu nas contribuições vertidas pelo participante, tampouco pela patrocinadora, e não se afigura suficiente para a recomposição que o recurso financeiro ingresse no fundo, com o aporte de valor atualizado das contribuições, que deveriam ter sido feitas, por meio de simples cálculo aritmético. De fato, a recomposição das reservas do plano demanda mais que um mero encontro de contas, exigindo a elaboração de complexos cálculos atuariais baseados em análises probabilísticas que devem retroagir ao momento em que cada aporte deixou de acontecer e na forma em que deveria ter ocorrido, impondo um recálculo individualizado em face de um plano mutualista. Nesse contexto, não havendo nenhum ato ilícito praticado pela entidade de previdência complementar, diante da falta de prévio custeio e da onerosidade excessiva que representa para a coletividade dos participantes a recomposição do fundo, as parcelas ou os valores de natureza remuneratória devidos ao ex-empregado reconhecidos posteriormente à concessão do benefício de complementação de aposentadoria não podem repercutir no benefício concedido, sob pena de ofender o comando normativo do art. 18, §§ 1º, 2º e 3º, da Lei Complementar n. 109/2001 e de acarretar o desequilíbrio financeiro e atuarial do plano, pois não foram consideradas ao se formar a prévia e necessária reserva matemática para o pagamento do benefício. Cumpre ressaltar que a justa reparação pelo eventual prejuízo que o participante do plano de previdência complementar tiver sofrido em decorrência de ato ilícito de responsabilidade da patrocinadora, que implicou em benefício de complementação de aposentadoria menor do que aquele que lhe seria devido, deve ser buscada, se possível, na via processual adequada, em ação movida contra o ex-empregador. Nada obstante, em relação às várias ações da mesma natureza já ajuizadas contra entidades de previdência privada, é de se reconhecer a possível inviabilidade da pretensão de reparação diretamente contra a patrocinadora, diante do tempo decorrido entre a prolação da sentença na Justiça trabalhista e o julgamento do presente recurso repetitivo. Assim, excepcionalmente, propõe-se admitir o recálculo do benefício, nos termos pretendidos, nas ações da espécie propostas na Justiça comum até a data do julgamento do presente recurso repetitivo, condicionando-se tal recálculo ao prévio e integral restabelecimento das reservas matemáticas, por meio de aporte a ser vertido pelo participante, devendo a apuração dos valores correspondentes basear-se em estudo técnico atuarial, conforme disciplinado no regulamento do plano. REsp 1.312.736-RS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 08/08/2018, DJe 16/08/2018.


PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. COMISSÃO DE CORRETAGEM. TRANSFERÊNCIA DE OBRIGAÇÃO AO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. DEVER DE INFORMAÇÃO. NECESSIDADE.

Ressalvada a denominada Faixa 1, em que não há intermediação imobiliária, é válida a cláusula contratual que transfere ao promitente-comprador a obrigação de pagar a comissão de corretagem nos contratos de promessa de compra e venda do Programa Minha Casa, Minha Vida, desde que previamente informado o preço total da aquisição da unidade autônoma, com o destaque do valor da comissão de corretagem. O Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, subdivide-se atuando em 4 (quatro) diferentes faixas de renda familiar mensal: Faixa 1 - até R$ 1.800,00 (ou R$ 3.600,00, excepcionalmente); Faixa 1,5 - até R$ 2.600,00; Faixa 2 - até R$ 4.000,00; Faixa 3 - até R$ 9.000,00. Na Faixa 1 "não há comercialização dos imóveis no mercado, inexistindo envolvimento de imobiliárias, corretores e construtoras/incorporadoras na sua venda" não havendo, pois, nenhuma margem para a cobrança da comissão de corretagem. Já as outras três faixas de renda do PMCMV (Faixa 1,5, Faixa 2 e Faixa 3) não diferem substancialmente das demais modalidades de financiamento imobiliário existentes, a autorizar, em tese, não só a cobrança da comissão de corretagem, mas a transferência desse encargo ao adquirente do imóvel, desde que previamente informado o preço total da aquisição, com o valor da referida comissão devidamente destacado. Essa transferência se harmoniza com os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence (art. 51, § 1º, I, do CDC) na medida das distinções criadas pelo próprio programa, que leva em conta as diferentes condições estabelecidas para cada faixa de renda familiar. No que diz respeito às consequências de se vetar o repasse do custo da comissão de corretagem aos beneficiários do PMCMV, na impossibilidade de transferência da obrigação de pagar a comissão de corretagem ao consumidor, esse custo seria sistematicamente embutido no preço dos imóveis, em prejuízo dos beneficiários situados nas primeiras faixas de renda familiar, tendo em vista a necessária observância dos tetos de aquisição previamente definidos nas regras do programa. Destaca-se, ainda, que a multiplicidade de recursos que justificou a afetação do tema deriva de demandas ajuizadas por beneficiários que, de uma forma ou de outra, conseguiram ter acesso ao PMCMV, arcaram com o pagamento da comissão de corretagem e agora pedem o ressarcimento dessa despesa. Nesse contexto, salienta-se que não há, nas normas do PMCMV, expressa vedação quanto à transferência do custo da corretagem ao consumidor, de modo que a atuação do Poder Judiciário, a quem não compete legislar, ficaria restrita, nesses casos, ao reconhecimento do dever de restituição aos que já tiveram acesso ao programa. REsp 1.601.149-RS, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. Acd. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por maioria, julgado em 13/06/2018, DJe 15/08/2018.


CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA. RETRIBUIÇÃO EM AÇÕES DA TELEBRÁS. AÇÃO DE COMPLEMENTAÇÃO DE AÇÕES. LEGITIMIDADE PASSIVA DAS COMPANHIAS RESULTANTES DA CISÃO.

Legitimidade passiva da Telebrás, bem como das companhias cindendas (ou sucessoras destas), para a ação de complementação de ações, na hipótese em que as ações originárias tenham sido emitidas pela Telebrás. A questão de direito a ser resolvida diz respeito aos efeitos da cisão parcial da Telebrás sobre a obrigação de emitir, subscrever e integralizar ações (complementação de ações) em favor do consumidor de serviço de telefonia, titular de contrato de participação financeira. Nesse passo, relembre-se que a Lei das Sociedades por Ações, no art. 233, põe a salvo os interesses dos credores da sociedade cindida ante os efeitos da cisão, estabelecendo a sucessão das obrigações anteriormente constituídas, conjugada com a solidariedade entre as companhias cindidas e cindenda, solidariedade que incide tão somente na relação jurídica externa com os credores, não na relação interna entre as companhias. Na cisão parcial, a regra da solidariedade pode ser excepcionada em favor das companhias cindendas, ficando estas responsáveis (nas relações externas) tão somente pelas obrigações que lhes forem expressamente transferidas, "sem solidariedade entre si ou com a companhia cindida", desde que assegurado aos credores o direito de oposição. Observe-se que, nas demandas por complementação de ações, o direito à diferença de ações decorre de uma revisão judicial do contrato de participação financeira, em que se substitui o critério do balanço anual pelo do balancete mensal, nos termos da Súmula 371/STJ ("Nos contratos de participação financeira para a aquisição de linha telefônica, o Valor Patrimonial da Ação [VPA] é apurado com base no balancete do mês da integralização"). Tratando-se, portanto, de uma revisão judicial do contrato de participação financeira, o título referente à complementação de ações somente se constitui definitivamente após o trânsito em julgado da demanda. Na hipótese, resta evidente que o título referente à complementação de ações somente se constituiu definitivamente após a cisão da Telebrás. Com relação ao crédito cujo título se constitui após a cisão, a jurisprudência desta Corte Superior é uníssona no sentido de que não se aplica a limitação de responsabilidade prevista no art. 233, § 1º, da Lei n. 6.404/1974. Esse entendimento jurisprudencial tem por escopo proteger os interesses dos credores, que não teriam como se opor à limitação de responsabilidade, uma vez que o título de seu crédito ainda não havia sido constituído definitivamente. Afastada, desse modo, a incidência da norma excepcional do art. 233, § 1º, da Lei n. 6.404/1976, aplica-se a regra geral da solidariedade (nas relações externas), o que torna a companhia cindenda (sucessora da concessionária local de telefonia) e a Telebrás (pós-cisão) partes legítimas para figurarem no polo passivo da demanda por complementação de ações. REsp 1.633.801-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 23/05/2018, DJe 01/08/2018.


03/08/2018

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. COMPRA E VENDA REALIZADA PELA INTERNET. ATRASO NA ENTREGA. DEMORA NA RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO PELO CONSUMIDOR ARREPENDIDO. IMPOSIÇÃO POR SENTENÇA COLETIVA DE CLÁUSULA PENAL. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL OU CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA NO CONTRATO DE MULTA EM PROL DO FORNECEDOR PASSÍVEL DE INVERSÃO.

Em compras realizadas na internet, o fato de o consumidor ser penalizado com a obrigação de arcar com multa moratória, prevista no contrato com a financeira, quando atrasa o pagamento de suas faturas de cartão de crédito não autoriza a imposição, por sentença coletiva, de cláusula penal ao fornecedor de bens móveis, nos casos de atraso na entrega da mercadoria e na demora de restituição do valor pago quando do exercício do direito do arrependimento. O contrato de cartão de crédito não pode ser chamado de acessório ao pacto de compra e venda. Na verdade, se trata de pactos autônomos, com fornecedores de serviços diversos (compra e venda e financeiro) e cláusulas diferentes e incomunicáveis. No pacto entre o consumidor e a operadora de cartão por ele escolhida não se pode cogitar de desequilíbrio contratual, uma vez que a cobrança de encargos moratórios é contrapartida contratual e legalmente prevista diante da mora do consumidor, que obteve o crédito de forma fácil e desembaraçada, sem prestar garantia adicional alguma além da promessa de pagar no prazo acertado. Já no pacto de compra e venda, a empresa fornecedora recebe o preço (da operadora de cartão de crédito), e só depois de confirmado o pagamento, envia o produto ao consumidor. Não há risco de mora do consumidor em relação à fornecedora, e, por isso, logicamente, não há previsão de multa moratória em prol do fornecedor. Por seu turno, não se vislumbra que a imposição, por sentença coletiva, de multa em desfavor da empresa fornecedora seja um corolário do princípio do equilíbrio contratual entre comprador e vendedor erigido no Código de Defesa do Consumidor. O art. 49 do CDC dispõe que o fornecedor, nos casos em que o consumidor exercita o direito de arrependimento, deverá restituir imediatamente o valor pago, com atualização. A previsão da atualização monetária denota que pode haver demora no reembolso ao consumidor – mas essa demora não prejudica o equilíbrio da relação de consumo a ponto de demandar a imposição, genérica e abstrata, por lei, de cláusula penal. Em suma, o legislador não anteviu quebra automática e necessária no equilíbrio contratual nos casos de atraso na entrega de mercadoria ou restituição decorrente de arrependimento, ao menos não a ponto de lançar mão da imposição da multa ao fornecedor, como norma geral e abstrata. Assim, dado que ao Poder Judiciário não é atribuída a tarefa de substituir o legislador, a "inversão" da cláusula deve partir do atendimento a dois pressupostos lógicos: a) que a cláusula penal tenha sido, efetivamente, celebrada no pacto; b) haja quebra do equilíbrio contratual, em afronta ao princípio consagrado no art. 4º, III, do CDC. Nenhum desses requisitos se faz presente no caso sob exame.
REsp 1.412.993-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, por maioria, julgado em 08/05/2018, DJe 07/06/2018.

CONTRATO DE MÚTUO COM PACTO ADJETO DE HIPOTECA. CREDOR HIPOTECÁRIO. INTERESSE DE AGIR. AJUIZAMENTO DE EXECUÇÃO PARA A OBSERVÂNCIA DE PADRÕES CONSTRUTIVOS. POSSIBILIDADE.

O credor hipotecário tem interesse de agir para propor ação em face do mutuário visando ao cumprimento de cláusula contratual que determina a observância dos padrões construtivos do loteamento. A hipoteca é direito real de garantia por meio do qual o devedor permanece com o domínio e posse, mas, em caso de inadimplência ou perecimento da coisa, o credor tem a faculdade de promover a venda judicial do bem, recebendo o produto até o valor total do crédito, com preferência. Além disso, a hipoteca tem característica de indivisibilidade e acessoriedade e a coisa dada em garantia, embora não suscetível ao pacto comissório, fica sujeita, por vínculo real, a cumprimento da obrigação principal. Assim, por um lado, à luz da causa de pedir da execução, não bastasse ressair nítido o interesse do credor hipotecário em não ver, ao arrepio do contrato, depreciado o bem que consubstancia a garantia real de seu crédito, o art. 1.474 do CC estabelece que a hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Por outro lado, o art. 1.425, I, do CC estabelece que a dívida considera-se vencida se, deteriorando-se, ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalcar a garantia, e o devedor, intimado, não a reforçar ou substituir. Com efeito, em sendo imprevisível se a eventual venda do bem imóvel dado em garantia seria suficiente para o pagamento da dívida do executado, é patente o interesse de agir da exequente, visto que, mesmo com a subsistência do terreno, é mesmo possível a depreciação do bem dado em garantia em vista de ter sido erigido construção incompatível com os padrões estabelecidos para o loteamento.

REsp 1.400.607-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 17/05/2018, DJe 26/06/2018.

EMBARGOS DE TERCEIRO. RECONVENÇÃO. NÃO CABIMENTO. CPC/1973. INCOMPATIBILIDADE DE RITOS.

Não é cabível a reconvenção apresentada em embargos de terceiro, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973. Inicialmente cumpre salientar que o rito dos embargos de terceiro após a fase de contestação não é ordinário, mas especial, ou seja, aquele previsto para as medidas de natureza cautelar. Daí se concluir pelo não cabimento de reconvenção nos embargos de terceiro, pois aquela pressupõe a compatibilidade procedimental. Essa exigência decorre do fato de que as ações (principal e reconvencional) terão processamento conjunto, não se admitindo a prática de atos apenas em uma das demandas, sob pena de causar tumulto processual e retardar a prestação jurisdicional. Quando se fala em embargos de terceiro, esse requisito assume superlativa relevância, pois se trata de demanda de rito célere, que busca assegurar um bem da vida em caráter de urgência. Além disso, os embargos de terceiro geralmente estão vinculados a uma ordem judicial emanada de outra demanda, que também sofreria as consequências do retardamento provocado pela apresentação de reconvenção. Nesse contexto, independentemente do preenchimento do requisito disposto no artigo 315 do Código de Processo Civil de 1973 (conexão do objeto da reconvenção com o da ação principal), exige-se, em qualquer caso, a compatibilidade procedimental nos moldes do que ocorre com a cumulação de pedidos prevista no artigo 292, § 1º, inciso III, do Código de Processo Civil de 1973. Deste modo, é incabível a reconvenção apresentada em embargos de terceiro sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.

REsp 1.578.848-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018.
Informativo STJ nº628

*DESATUALIZADO

AÇÃO DE ALIMENTOS. DIFERENÇA DE VALOR OU PERCENTUAL ENTRE FILHOS. POSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE. NECESSIDADES DISTINTAS ENTRE OS ALIMENTANDOS. CAPACIDADES DE CONTRIBUIÇÕES DIFERENCIADAS DOS GENITORES.

Excepcionalmente, é admissível a fixação de alimentos em valores ou em percentuais diferentes entre os filhos. Inicialmente, ressalta-se que do princípio da igualdade entre os filhos, previsto no art. 227, § 6º, da Constituição Federal, deduz-se que não deverá haver, em regra, diferença no valor ou no percentual dos alimentos destinados à prole, pois se presume que, em tese, os filhos – indistintamente – possuem as mesmas demandas vitais, tenham as mesmas condições dignas de sobrevivência e igual acesso às necessidades mais elementares da pessoa humana. A igualdade entre os filhos, todavia, não tem natureza absoluta e inflexível, sendo possível vislumbrar situações em que a fixação de alimentos em valor ou percentual distinto entre a prole é admissível, razoável e até mesmo indispensável, seja a questão examinada sob a ótica da necessidade do alimentado, seja o tema visto sob o enfoque da capacidade contributiva dos alimentantes. Exemplificando, um filho portador de uma doença congênita pode receber um valor ou percentual diferenciado em relação ao filho nascido saudável, pois possui uma necessidade específica que objetivamente justifica a distinção, não havendo ofensa ao princípio constitucional da igualdade. A mesma regra se aplica quando se examina a questão sob a perspectiva da capacidade de contribuição do alimentante, sobretudo quando se constata que a regra do art. 1.703 do CC/2002 estipula que é dever de ambos os cônjuges contribuir para a manutenção dos filhos na proporção de seus recursos. Assim, poderá ser justificável a fixação de alimentos diferenciados entre a prole se, por exemplo, sendo os filhos oriundos de distintos relacionamentos, houver melhor capacidade de contribuição de um genitor ou genitora em relação ao outro.

REsp 1.624.050-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 19/06/2018, DJe 22/06/2018.

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PROVEDOR DE APLICAÇÃO DE PESQUISA NA INTERNET. PROTEÇÃO A DADOS PESSOAIS. DESVINCULAÇÃO ENTRE NOME E RESULTADO DE PESQUISA. DIREITO AO ESQUECIMENTO. POSSIBILIDADE.

É possível determinar o rompimento do vínculo estabelecido por provedores de aplicação de busca na internet entre o nome de prejudicado, utilizado como critério exclusivo de busca, e a notícia apontada nos resultados. No caso, pleiteia-se a desindexação do nome da recorrente, em resultados nas aplicações de busca na internet, de notícia sobre fraude em concurso público, no qual havia sido reprovada. Atualmente, o fato referido já conta com mais de uma década, e ainda hoje os resultados de busca apontam como mais relevantes as notícias a ela relacionadas, como se, ao longo desta década, não houvesse nenhum desdobramento da notícia nem fatos novos relacionados ao nome da autora. Quanto ao assunto, a jurisprudência desta Corte Superior tem entendimento reiterado no sentido de afastar a responsabilidade de buscadores da internet pelos resultados de busca apresentados, reconhecendo a impossibilidade de lhe atribuir a função de censor e impondo ao prejudicado o direcionamento de sua pretensão contra os provedores de conteúdo, responsáveis pela disponibilização do conteúdo indevido na internet. Há, todavia, circunstâncias excepcionalíssimas em que é necessária a intervenção pontual do Poder Judiciário para fazer cessar o vínculo criado, nos bancos de dados dos provedores de busca, entre dados pessoais e resultados da busca, que não guardam relevância para interesse público à informação, seja pelo conteúdo eminentemente privado, seja pelo decurso do tempo. Essa é a essência do direito ao esquecimento: não se trata de efetivamente apagar o passado, mas de permitir que a pessoa envolvida siga sua vida com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca. Por outro vértice, aqueles que quiserem ter acesso a informações relativas a fraudes em concurso público, não terão seu direito de acesso impedido, porquanto as fontes que mencionam inclusive o nome da autora permanecerão acessíveis. Contudo, sua busca deverá conter critérios relativos a esse conteúdo, seja em conjunto com o nome da autora, seja de forma autônoma.
REsp 1.660.168-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Marco Aurélio Bellizze, por maioria, julgado em 08/05/2018, DJe 05/06/2018.

SEGURO DE VIDA. INDENIZAÇÃO. NATUREZA ALIMENTAR. IMPENHORABILIDADE. 40 (QUARENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. LIMITAÇÃO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 649, X, DO CPC/1973.


A impenhorabilidade dos valores recebidos pelo beneficiário do seguro de vida limita-se ao montante de 40 (quarenta) salários mínimos. Discute-se possibilidade de penhora da indenização recebida pelo beneficiário do seguro de vida quando a indenização é incorporada ao seu patrimônio. Cumpre salientar, de início, que há de prevalecer o direito do beneficiário do seguro de vida sobre o direito do credor, de modo a preservar o mínimo necessário à sua sobrevivência. A finalidade do seguro de vida é proporcionar um rendimento a alguém, não o deixando à míngua de recursos. A razão da impenhorabilidade, portanto, está no caráter alimentar do benefício. Registre-se que a natureza alimentar da indenização recebida pelo beneficiário do seguro de vida foi presumida pelo legislador, constituindo-se em projeção futura em prol do sustento e subsistência do beneficiário, razão por que conferiu a impenhorabilidade de tal benefício. A impenhorabilidade estabelecida em favor do beneficiário, portanto, deve corresponder à finalidade do seguro de vida, que é criar um fundo alimentar, prospectivo e resguardado, e não se traduzir em mais um meio para pagamento de dívidas. Nesse sentido, ao invés de imputar ao beneficiário do seguro o ônus de provar sua condição socioeconômica para aferir a natureza alimentar da indenização, deve-se limitar o montante impenhorável em 40 (quarenta) salários mínimos, por aplicação analógica do art. 649, X, do CPC/1973. A quantia que a exceder poderá ser utilizada para saldar os débitos dos credores do beneficiário do seguro. Ressalte-se que a natureza alimentar da indenização recebida com o seguro de vida se assemelha às verbas salariais do art. 649, IV, do CPC/1973, que destaca serem impenhoráveis "as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família".

REsp 1.361.354-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 22/05/2018, DJe 25/06/2018.

RESPONSABILIDADE CIVIL DA TRANSPORTADORA. ATO LIBIDINOSO PRATICADO CONTRA PASSAGEIRA NO INTEIOR DE TREM. DANO MORAL CONFIGURADO. FORTUITO INTERNO. CONEXIDADE COM A ATIVIDADE DE TRANSPORTE DE PESSOAS.

A concessionária de transporte ferroviário pode responder por dano moral sofrido por passageira, vítima de assédio sexual, praticado por outro usuário no interior do trem. De início, registre-se que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento de recurso extraordinário representativo da controvérsia, determinou que a pessoa jurídica de direito privado, prestadora de serviço público, ostenta responsabilidade objetiva em relação a terceiros usuários ou não usuários do serviço público, nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição da República de 1988 (RE 591.874/MS, publicado no DJe de 21/11/2008). Em reforço à responsabilidade objetiva do transportador, não se pode olvidar que a legislação consumerista receitua que o fornecedor de serviços responde pela reparação dos danos causados, independentemente da existência de culpa, decorrente dos defeitos relativos à prestação destes serviços, nos termos do art. 14, §§ 1º e 3º, do CDC. Ademais, a cláusula de incolumidade é ínsita ao contrato de transporte, implicando obrigação de resultado do transportador, consistente em levar o passageiro com conforto e segurança ao seu destino, salvo se demonstrada causa de exclusão do nexo de causalidade, notadamente o caso fortuito, a força maior ou a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro. O fato de terceiro, conforme se apresente, pode ou não romper o nexo de causalidade. Exclui-se a responsabilidade do transportador quando a conduta praticada por terceiro, sendo causa única do evento danoso, não guarda relação com a organização do negócio e os riscos da atividade de transporte, equiparando-se a fortuito externo. De outro turno, a culpa de terceiro não é apta a romper o nexo causal quando se mostra conexa à atividade econômica e aos riscos inerentes à sua exploração, caracterizando fortuito interno. Por envolver, necessariamente, uma grande aglomeração de pessoas em um mesmo espaço físico, aliados à baixa qualidade do serviço prestado, incluído a pouca quantidade de vagões ou ônibus postos à disposição do público, a prestação do serviço de transporte de passageiros vem propiciando a ocorrência de eventos de assédio sexual. Em outros termos, mais que um simples cenário ou ocasião, o transporte público tem concorrido para a causa dos eventos de assédio sexual. Em tal contexto, a ocorrência desses fatos acaba sendo arrastada para o bojo da prestação do serviço de transporte público, tornando-se assim mais um risco da atividade, a qual todos os passageiros, mas especialmente as mulheres, tornam-se vítimas. Conclui-se que, se a ocorrência do assédio sexual guardar conexidade com os serviços prestados pela concessionária e, tratando-se de fortuito interno, a transportadora de passageiros permanece objetivamente responsável pelos danos causados.

REsp 1.662.551-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por maioria, julgado em 15/05/2018, DJe 25/06/2018.
Informativo STJ nº628

*DESATUALIZADO (Ver INF. N. 642 " A concessionária de transporte ferroviário não responde por ato ilícito cometido por terceiro e estranho ao contrato de transporte. ")

CASAMENTO CONTRAÍDO SOB CAUSA SUSPENSIVA. SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA DE BENS (CC/1916, ART. 258, II; CC/2002, ART. 1.641, II). PARTILHA. BENS ADQUIRIDOS ONEROSAMENTE. NECESSIDADE DE PROVA DO ESFORÇO COMUM. PRESSUPOSTO DA PRETENSÃO. MODERNA COMPREENSÃO DA SÚMULA 377/STF.

No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição. A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça uniformizou o entendimento que encontrava dissonância no âmbito da Terceira e da Quarta Turma. De início, cumpre informar que a Súmula 377/STF dispõe que "no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento". Esse enunciado pode ser interpretado de duas formas: 1) no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, sendo presumido o esforço comum na aquisição do acervo; e 2) no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição. No entanto, a adoção da compreensão de que o esforço comum deve ser presumido (por ser a regra) conduz à ineficácia do regime da separação obrigatória (ou legal) de bens, pois, para afastar a presunção, deverá o interessado fazer prova negativa, comprovar que o ex-cônjuge ou ex-companheiro em nada contribuiu para a aquisição onerosa de determinado bem, conquanto tenha sido a coisa adquirida na constância da união. Torna, portanto, praticamente impossível a separação dos aquestos. Por sua vez, o entendimento de que a comunhão dos bens adquiridos pode ocorrer, desde que comprovado o esforço comum, parece mais consentânea com o sistema legal de regime de bens do casamento, recentemente adotado no Código Civil de 2002, pois prestigia a eficácia do regime de separação legal de bens. Caberá ao interessado comprovar que teve efetiva e relevante (ainda que não financeira) participação no esforço para aquisição onerosa de determinado bem a ser partilhado com a dissolução da união (prova positiva).
EREsp 1.623.858-MG, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), por unanimidade, julgado em 23/05/2018, DJe 30/05/2018.

NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. MÚTUO FENERATÍCIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. JUROS REMUNERATÓRIOS. RESTITUIÇÃO PELA MESMA TAXA PACTUADA NO CONTRATO. DESCABIMENTO.

Tese aplicável a todo contrato de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira mutuante: "Descabimento da repetição do indébito com os mesmos encargos do contrato". Inicialmente, considerando a preocupação acerca do enriquecimento ilícito da instituição financeira, a doutrina vem estudando o problema da repetição de indébito decorrente de mútuo feneratício celebrado com instituição financeira sob a ótica do tema do "lucro da intervenção", que é o "lucro obtido por aquele que, sem autorização, interfere nos direitos ou bens jurídicos de outra pessoa e que decorre justamente desta intervenção". Esse lucro também pode ser vislumbrado na hipótese da presente afetação, pois, como os bancos praticam taxas de juros bem mais altas do que a taxa legal, a instituição financeira acaba auferindo vantagem dessa diferença de taxas, mesmo restituindo o indébito à taxa legal. Nesse sentido, a instituição financeira teria que ser condenada não somente a reparar o dano causado ao mutuário, mas também a restituir o lucro que obteve com a cláusula abusiva. Por um lado, o lucro da intervenção é um plus em relação à indenização, no sentido de que esta encontra limite na extensão dos danos experimentados pela vítima (função indenitária do princípio da reparação integral), ao passo que o lucro da intervenção pode extrapolar esse limite. Por outro lado, o referido lucro é um minus em relação ao punitive damage, uma vez que este, tendo simultaneamente funções punitiva e preventiva, não está limitado ao lucro ou ao dano. Propõe-se, no presente repetitivo, uma tese menos abrangente, apenas para eliminar a possibilidade de se determinar a repetição com base nos mesmos encargos praticados pela instituição financeira, pois esses encargos não correspondem ao dano experimentado pela vítima, tampouco ao lucro auferido pelo ofensor.


REsp 1.552.434-GO, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 13/06/2018, DJe 21/06/2018 (Tema 968).

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AÇÃO COLETIVA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO. CPC/2015. MUDANÇA NO ORDENAMENTO JURÍDICO. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO. SÚMULA N. 345/STJ. INCIDÊNCIA.

O art. 85, § 7º, do CPC/2015 não afasta a aplicação do entendimento consolidado na Súmula 345 do STJ, de modo que são devidos honorários advocatícios nos procedimentos individuais de cumprimento de sentença decorrente de ação coletiva, ainda que não impugnados e promovidos em litisconsórcio. A Corte Especial, quando do julgamento do EREsp 653.270/RS, Rel. Min. José Delgado, sessão de 17/05/2006 (DJ 05/02/2007), decidiu que, "nas execuções individuais procedentes de sentença genérica proferida em ação coletiva ou ação civil pública, é cabível a condenação da Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios, ainda que não embargada a execução". Diante de outros arestos que vieram a confirmar essa assertiva, a Corte Especial consolidou o seu entendimento mediante a edição da Súmula 345, que restringe a aplicação do art. 1º-D da Lei n. 9.494/1997, que dispõe que "não serão devidos honorários advocatícios pela Fazenda Pública nas execuções não embargadas", às execuções de título judicial, resistida ou não, procedentes de título judicial proferido em ação coletiva ajuizada por sindicato ou entidade de classe, como substitutivo processual, ou em sede de ação civil pública, ambas promovidas contra a Fazenda Pública. O tema agora se renova em face da edição do novel diploma processual civil. No entanto, não existe razão para se afastar a solução outrora consagrada pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido da aplicação e vigência da Súmula 345 do STJ. Assim, a interpretação que deve ser dada ao art. 85, § 7º, do CPC/2015, que dispõe que "não serão devidos honorários no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública que enseje expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnada", é a de que, caso a relação jurídica existente entre as partes esteja concluída desde a ação ordinária, não caberá a condenação em honorários advocatícios se não houver a apresentação de impugnação. Isso porque o cumprimento de sentença de que trata o referido diploma legal é decorrência lógica do mesmo processo cognitivo. Entretanto, nas decisões coletivas – lato sensu – não se especifica o quantum devido nem a identidade dos titulares do direito subjetivo, sendo elas mais limitadas do que as que decorrem das demais sentenças condenatórias típicas. Assim, transfere-se para a fase de cumprimento a obrigação cognitiva relacionada com o direito individual de receber o que findou reconhecido na ação ordinária. Em face disso, a execução desse título judicial pressupõe cognição exauriente, cuja resolução se deve dar com estrita observância dos postulados da ampla defesa e do contraditório, a despeito do nome dado ao procedimento, que induz a indevida compreensão de se estar diante de mera fase de cumprimento, de cognição limitada. Diante desse quadro, não houve mudança no ordenamento jurídico, uma vez que o citado art. 85, § 7º, do CPC/2015 reproduz basicamente o contido no art. 1º-D da Lei n. 9.494/1997, em relação ao qual o entendimento desta Corte, já consagrado, é no sentido de afastar a aplicação do aludido comando nas execuções individuais, ainda que promovidas por litisconsorte, do julgado proferido em sede de ação coletiva lato sensu, ação civil pública ou ação de classe.
REsp 1.648.238-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 20/06/2018, DJe 27/06/2018 (Tema 973).

TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA. SUBSTITUIÇÃO PELA DOMICILIAR. INADEQUAÇÃO. DELITO PRATICADO NA PRÓPRIA RESIDÊNCIA.

Não é cabível a substituição da prisão preventiva pela domiciliar quando o crime é praticado na própria residência da agente, onde convive com filhos menores de 12 anos. Cinge-se a controvérsia a analisar pedido de conversão de prisão preventiva em domiciliar para que paciente possa cuidar de pessoa absolutamente incapaz. O Tribunal de origem, ao analisar a questão, considerando o recente precedente do STF, no julgamento do HC n. 143.641, apresentou fundamento válido para afastar a substituição da prisão preventiva da paciente por domiciliar, ao destacar laudo pericial do assistente social, no qual consta que a paciente usava de sua própria residência para a prática delituosa. Assim, o local não apenas se mostraria inadequado para os cuidados de um incapaz, como também remeteria à conclusão de possibilidade de reiteração criminosa. Registra-se que a Quinta Turma já entendeu que a substituição do encarceramento preventivo pelo domiciliar não resguarda o interesse dos filhos menores de 12 anos de idade, quando o crime é praticado na própria residência da agente, onde convive com os infantes. HC 441.781-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, por unanimidade, julgado em 12/06/2018, DJe 19/06/2018.
Informativo STJ nº629

LOCAÇÃO. IMÓVEL NÃO RESIDENCIAL. PARCELAMENTO DE DÉBITOS FISCAIS PELO LOCATÁRIO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO RENOVATÓRIA. POSSIBILIDADE.

A certidão de parcelamento fiscal é suficiente para suprir a exigência prevista no inciso III do art. 71 da Lei n. 8.245/1991 (Lei de Locações) para efeito do ajuizamento de ação renovatória de locação empresarial. De início, relembre-se que a principal finalidade da ação renovatória é a proteção do fundo de comércio desenvolvido pelo empresário locatário pelo longo período em que instalado no local, investindo na locação comercial, na constituição de clientela, na publicidade do ponto comercial, além da própria valorização do imóvel locado. Por isso, o Estado reconhece ao locatário de imóvel comercial, buscando a proteção do seu fundo de comércio, o direito à renovação compulsória do seu contrato de locação, uma vez atendidos os requisitos elencados no art. 51 da Lei de Locações (LL). Além disso, estabeleceu o legislador procedimentos especiais para veiculação das ações locatícias em geral. Especificamente quanto ao direito de renovação, o procedimento está previsto no artigo 71 da LL, contendo a exigência legal de instrução da petição inicial com a juntada de diversos documentos, inclusive a prova de quitação dos tributos e taxas incidentes sobre o imóvel locado (inciso III do artigo 71). Partindo-se de uma interpretação sistemática e teleológica desse dispositivo, aceita-se a comprovação do parcelamento fiscal no momento do ajuizamento da demanda, com a demonstração de sua quitação durante o processo. Em primeiro lugar, ocorreu efetivamente a quitação dos tributos, encaminhado mediante o parcelamento fiscal, ainda que durante o processo. Em segundo lugar, ficam descaracterizados os efeitos da inadimplência durante o parcelamento fiscal autorizada pelo ente público. Em terceiro lugar, por fim, essa medida não causa qualquer prejuízo ao locador, não podendo o parcelamento do débito fiscal ser considerado como falta grave ao disposto no contrato de locação, prestigiando-se a manutenção do pacto e a proteção do fundo de comércio. 


REsp 1.698.814-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 26/06/2018, DJe 29/06/2018.

02/08/2018

BUSCA E APREENSÃO. CAMINHÃO. GARANTIA FIDUCIÁRIA. INADIMPLEMENTO DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. EQUIPAMENTO DE MONITORAMENTO. PERTENÇA. RESTITUIÇÃO AO DEVEDOR. NECESSIDADE.

O equipamento de monitoramento acoplado em caminhão é qualificado como pertença e pode ser retirado pelo devedor fiduciante que o colocou. Inicialmente, cumpre salientar que pertenças são bens que — a despeito da específica destinação acessória, na medida em que atendem a finalidade econômico-social da coisa principal — são facilmente destacáveis do bem principal, sem prejuízo de sua essência, de sua finalidade ou de seu valor econômico (substancialmente considerado). A partir de tais características, devidamente delineadas, é de se concluir que o equipamento de monitoramento acoplado ao caminhão consubstancia uma pertença, a qual atende, de modo duradouro, à finalidade econômico-social do referido veículo, destinando-se a promover a sua localização e, assim, reduzir os riscos de perecimento produzidos por eventuais furtos e roubos, a que, comumente, estão sujeitos os veículos utilizados para o transporte de mercadorias. Trata-se, indiscutivelmente, de "coisa ajudante" que atende ao uso do bem principal. Desse modo, sua retirada do caminhão, tal como postulado pelo devedor fiduciante, não altera a natureza do bem principal, em nada prejudica sua função finalística, tampouco reflete uma depreciação econômica de tal monta que torne inviável, sob tal aspecto, a separação. Efetivamente, o inadimplemento do contrato de empréstimo para aquisição de caminhão dado em garantia, a despeito de importar na consolidação da propriedade do mencionado veículo nas mãos do credor fiduciante, não conduz ao perdimento da pertença em favor deste. O equipamento de monitoramento, independentemente do destino do caminhão, permanece com a propriedade de seu titular, o devedor fiduciário, ou em sua posse, a depender do título que ostente, salvo se houver expressa manifestação de vontade nesse sentido, se a lei assim dispuser ou se, a partir das circunstâncias do caso, tal solução for a indicada. 


REsp 1.667.227-RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 26/06/2018, DJe 29/06/2018.

CONDOMÍNIO HORIZONTAL. SHOPPING CENTER. CLÁUSULA DE CONVENÇÃO DE CONDOMÍNIO. USO EXCLUSIVO DE PARTES DE ÁREA COMUM. POSSIBILIDADE.

A cláusula prevista em convenção de condomínio de shopping center, permitindo a alguns condôminos - lojistas - o uso, gozo e fruição de áreas comuns, não é, em regra, nula. Cinge-se a controvérsia a definir se a convenção de condomínio pode atribuir direito de uso exclusivo de áreas comuns a um ou mais condôminos. Inicialmente, destaca-se que no que tange ao condomínio voluntário, cada condômino adquire uma fração ou percentual do todo, assumindo direitos e vantagens proporcionalmente à sua quota-parte. Porém, as circunstâncias peculiares e a natureza jurídica dos shopping centers, tanto com relação à forma de constituição, quanto aos objetivos econômicos traçados pelos empreendedores, os distinguem do condomínio edilício comum. Nada impede que, quando da constituição do empreendimento, em decisão assemblear ou por meio de cláusulas de convenção de condomínio e demais normais gerais complementares, seja limitada à propriedade adquirida pelos lojistas ao espaço interno, ou parte da edificação, sem contribuição ou participação nas coisas de uso comum, desde que respeitado o respectivo quorum de votação, em razão do princípio da autonomia da vontade. Assim, a cláusula prevista em convenção de condomínio de shopping center, que permite a alguns condôminos (lojistas) o uso, gozo e fruição de áreas comuns, não é, em regra, absolutamente nula, pois aqueles exercem, apenas relativamente, os direitos assegurados em geral pelo art. 1.335 do Código Civil. REsp 1.677.737-RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018

RESCISÃO CONTRATUAL. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. INADIMPLEMENTO DO VENDEDOR. PAGAMENTO DE ALUGUÉIS PELO TEMPO DE PERMANÊNCIA. CABIMENTO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA.

É devida a condenação ao pagamento de taxa de ocupação (aluguéis) pelo período em que o comprador permanece na posse do bem imóvel, no caso de rescisão do contrato de promessa de compra e venda, independentemente de ter sido o vendedor quem deu causa ao desfazimento do negócio. Inicialmente, registre-se que o desfazimento do negócio jurídico de compra e venda do imóvel motiva o retorno das partes ao estado anterior com, de um lado, a devolução do preço pago e a indenização pelas benfeitorias e, de outro, a restituição do imóvel e o pagamento de aluguéis pelo período de ocupação do bem objeto do contrato rescindido. Em outras palavras, o descumprimento contratual por parte da vendedora provoca determinadas consequências que, todavia, não isentam o comprador de remunerar o proprietário pelo período de ocupação do bem. Dessa forma, o pagamento de aluguéis não envolve discussão acerca da licitude ou ilicitude da conduta do ocupante. O ressarcimento é devido por força da determinação legal segundo a qual a ninguém é dado enriquecer sem causa à custa de outrem, usufruindo de bem alheio sem nenhuma contraprestação. Assim, segundo a jurisprudência desta Corte, a utilização do imóvel objeto do contrato de promessa de compra e venda enseja o pagamento de aluguéis pelo tempo de permanência, mesmo que o contrato tenha sido rescindido por inadimplemento da vendedora, ou seja, independentemente de quem tenha sido o causador do desfazimento do negócio, sob pena de enriquecimento sem causa. REsp 1.613.613-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 12/06/2018, DJe 18/06/2018.

PARCELAMENTO. LIMITE FINANCEIRO MÁXIMO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LEI N. 10.522/2002. REGULAMENTAÇÃO POR MEIO DA PORTARIA CONJUNTA PGFN/RFB N. 15/2009. ILEGALIDADE.

As condições para a concessão de parcelamento tributário devem estrita observância ao princípio da legalidade e não há autorização para que atos infralegais tratem de condições não previstas na lei de regência do benefício. Inicialmente, é preciso destacar que o art. 155-A do CTN dispõe que o parcelamento será concedido na forma e na condição estabelecidas em lei específica, enquanto o art. 153 do CTN, aplicado subsidiariamente ao parcelamento, estabelece que "a lei" especificará I) o prazo do benefício, II) as condições da concessão do favor em caráter individual e III) sendo o caso: a) os tributos a que se aplica; b) o número de prestações e seus vencimentos, dentro do prazo a que se refere o inciso I, podendo atribuir a fixação de uns e de outros à autoridade administrativa, para cada caso de concessão em caráter individual; e c) as garantias que devem ser fornecidas pelo beneficiado no caso de concessão em caráter individual. As condições para a concessão do parcelamento devem estrita observância ao princípio da legalidade, não havendo, pois, autorização para que atos infralegais, como portarias, tratem de condições não previstas na lei de regência do benefício. No caso analisado, nos termos dos arts. 11 e 13 da Lei n. 10.522/2002, observa-se que a delegação de atribuição ao Ministro da Fazenda é para estabelecer limites e condições para o parcelamento exclusivamente quanto ao valor da parcela mínima e à apresentação de garantias, não havendo autorização para a regulamentação de limite financeiro máximo do crédito tributário para sua inclusão no parcelamento, concluindo-se pela ilegalidade da Portaria Conjunta PGFN/RFB n. 15/2009. 


REsp 1.739.641-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, por unanimidade, julgado em 21/06/2018, DJe 29/06/2018.

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. SERVIDOR DO PODER EXECUTIVO FEDERAL. CESSÃO PARA O PODER LEGISLATIVO. PENA DE DEMISSÃO. COMPETÊNCIA CORREICIONAL DA CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO.

Compete ao Ministro de Estado Chefe da Controladoria-Geral da União a aplicação da penalidade de demissão a servidor do Poder Executivo Federal, independentemente de se encontrar cedido à época dos fatos para o Poder Legislativo Federal. A controvérsia do mandamus visa, entre outras questões, a definir a competência legal da Controladoria-Geral da União (CGU) para instauração e julgamento do processo disciplinar em que foi aplicada a pena de demissão, uma vez que à época dos fatos o impetrante encontrava-se cedido para a Câmara dos Deputados. A legislação pertinente é regulada sobretudo pelo art. 4º, VIII, "b", "c" e "d", do Decreto n. 5.480/2005, que dispõe que: "Compete ao órgão Central do Sistema: VIII instaurar sindicâncias, procedimentos e processos administrativos disciplinares, em razão b) da complexidade e relevância da matéria; c) da autoridade envolvida; d) do envolvimento de servidores de mais de um órgão ou entidade". Assim, incumbe à Controladoria-Geral da União, como órgão central do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, instaurar sindicâncias, procedimentos e processos administrativos disciplinares, em razão: a) da inexistência de condições objetivas para sua realização no órgão ou entidade de origem; b) da complexidade e relevância da matéria; c) da autoridade envolvida; ou d) do envolvimento de servidores de mais de um órgão ou entidade (arts. 2º, caput e 4º, inciso VIII, do Decreto n. 5.480/2005, c/c os arts. 18, § 1º e § 4º, e 20, parágrafo único, ambos da Lei n. 10.683/2003). Com efeito, quando se fala em correição, a então Controladoria-Geral da União ficou autorizada a assegurar a aplicação da lei em qualquer órgão ou entidade da Administração Pública Federal, de modo a garantir a correta apuração das eventuais faltas funcionais cometidas por agente público federal e a aplicação, quando for o caso, da penalidade devida. Além do mais, o fato de o impetrante encontrar-se cedido à época dos fatos para a Câmara dos Deputados não afasta o poder disciplinar do órgão de origem do servidor, até mesmo porque o insurgente não perdeu seu vínculo com o Poder Executivo Federal. 


MS 19.994-DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, por maioria, julgado em 23/05/2018, DJe 29/06/2018.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO TRANSINDIVIDUAL DO CONSUMIDOR. ABUSIVIDADE DE CLÁUSULA CONTIDA EM CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Ministério Público possui legitimidade ativa para postular em juízo a defesa de direitos transindividuais de consumidores que celebram contratos de compra e venda de imóveis com cláusulas pretensamente abusivas. De início, cumpre salientar que o acórdão embargado, da Quarta Turma, entendeu que falta ao Ministério Públicolegitimidade ativa para o ajuizamento de demanda coletiva (em sentido lato) com a finalidade de se declarar por sentença a pretensa nulidade e ineficácia de cláusula contratual constante de contratos de compra e venda de imóveis celebrados entre as empresas embargadas e seus consumidores. Já o acórdão paradigma, da Corte Especial, entendeu ter o Ministério Público legitimidade para reclamar a defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos em ação civil pública, ainda que se estivesse diante de interesses disponíveis. Tal orientação, ademais, é a que veio a prevalecer neste Tribunal Superior, que aprovou o verbete sumular n. 601, de seguinte teor: "o Ministério Público tem legitimidade ativa para atuar na defesa de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores, ainda que decorrentes da prestação de serviço público." Além disso, tanto a Lei da Ação Civil Pública (arts. 1º e 5º) como o Código de Defesa do Consumidor (arts. 81 e 82) são expressos em definir o Ministério Público como um dos legitimados a postular em juízo em defesa de direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos do consumidor. Incumbe verificar, então, se tal legitimidade ampla definida expressamente em lei (Lei n. 7.347/1985 e Lei n. 8.078/1990) é compatível com a finalidade do Ministério Público, como exige o inc. IX do art. 129 da Constituição da República. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a finalidade do Ministério Público é lida à luz do preceito constante do caput do art. 127 da Constituição, segundo o qual incumbe ao Ministério Público "a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis". Daí porque se firmou a compreensão de que, para haver legitimidade ativa do Ministério Público para a defesa de direitos transindividuais não é preciso que se trate de direitos indisponíveis, havendo de se verificar, isso sim, se há "interesse social" (expressão contida no art. 127 da Constituição) capaz de autorizar a legitimidade do Ministério Público. 


EREsp 1.378.938-SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, por unanimidade, julgado em 20/06/2018, DJe 27/06/2018.

TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA. SUBSTITUIÇÃO PELA DOMICILIAR. INADEQUAÇÃO. DELITO PRATICADO NA PRÓPRIA RESIDÊNCIA.

Não é cabível a substituição da prisão preventiva pela domiciliar quando o crime é praticado na própria residência da agente, onde convive com filhos menores de 12 anos. Cinge-se a controvérsia a analisar pedido de conversão de prisão preventiva em domiciliar para que paciente possa cuidar de pessoa absolutamente incapaz. O Tribunal de origem, ao analisar a questão, considerando o recente precedente do STF, no julgamento do HC n. 143.641, apresentou fundamento válido para afastar a substituição da prisão preventiva da paciente por domiciliar, ao destacar laudo pericial do assistente social, no qual consta que a paciente usava de sua própria residência para a prática delituosa. Assim, o local não apenas se mostraria inadequado para os cuidados de um incapaz, como também remeteria à conclusão de possibilidade de reiteração criminosa. Registra-se que a Quinta Turma já entendeu que a substituição do encarceramento preventivo pelo domiciliar não resguarda o interesse dos filhos menores de 12 anos de idade, quando o crime é praticado na própria residência da agente, onde convive com os infantes. 



HC 441.781-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, por unanimidade, julgado em 12/06/2018, DJe 19/06/2018.