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30/04/2016

DIREITO PENAL. INAPLICABILIDADE DA MINORANTE PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI DE DROGAS.



Ainda que a dedicação a atividades criminosas ocorra concomitantemente com o exercício de atividade profissional lícita, é inaplicável a causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006 (Lei de Drogas). De início, destaca-se que, para viabilizar a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, são exigidos, além da primariedade e dos bons antecedentes do acusado, que este não integre organização criminosa e que não se dedique a atividades delituosas. De fato, a razão de ser da mencionada minorante é justamente punir com menor rigor o pequeno traficante, ou seja, aquele indivíduo que não faz do tráfico de drogas o seu meio de vida. Nesse contexto, o aludido § 4º do art. 33, ao prever que o acusado não deve se dedicar a atividades criminosas, não exige, em nenhum momento, que essa dedicação seja exercida com exclusividade. Portanto, a aplicação da minorante é obstada ainda que o agente exerça, concomitantemente, atividade profissional lícita. REsp 1.380.741-MG, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/4/2016, DJe 25/4/2016.

29/04/2016

DIREITO PENAL. CLASSIFICAÇÃO DE SUBSTÂNCIA COMO DROGA PARA FINS DA LEI N. 11.343/2006.



Classifica-se como "droga", para fins da Lei n. 11.343/2006 (Lei de Drogas), a substância apreendida que possua canabinoides - característica da espécie vegetal Cannabis sativa -, ainda que naquela não haja tetrahidrocanabinol (THC). Inicialmente, emerge a necessidade de se analisar o preceito contido no parágrafo único do art. 1º da Lei de Drogas, segundo o qual "consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União". Em acréscimo, estabelece o art. 66 da Lei de Drogas que, "Para fins do disposto no parágrafo único do art. 1º desta Lei, até que seja atualizada a terminologia da lista mencionada no preceito, denominam-se drogas substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e outras sob controle especial, da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998". Verifica-se, assim, que, sistematicamente, por uma opção legislativa, o art. 66 ampliou o universo de incidência dos comandos proibitivos penais. Portanto, a definição do que sejam "drogas", capazes de caracterizar os delitos previstos na Lei n. 11.343/2006, advém da Portaria n. 344/1998 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde. Nesse contexto, por ser constituída de um conceito técnico-jurídico, só será considerada droga o que a lei (em sentido amplo) assim o reconhecer. Desse modo, mesmo que determinada substância cause dependência física ou psíquica, se ela não estiver prevista no rol das substâncias legalmente proibidas, ela não será tratada como droga para fins de incidência da Lei n. 11.343/2006. Salientado isso, nota-se que a Cannabis sativa integra a Lista E da Portaria n. 344/1998 da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, que, em última análise, a define como planta que pode originar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas. Essa mesma lista traz um adendo de que "ficam também sob controle todos os sais e isômeros das substâncias obtidas a partir das plantas elencadas acima". Portanto, irrelevante, para a comprovação da materialidade de delito, o fato de laudo pericial não haver revelado a presença de tetrahidrocanabinol (THC) - um dos componentes ativos da Cannabis sativa - na substância se constatada a presença de canabinoides, característicos da espécie vegetal Cannabis sativa, que integram a Lista E da Portaria n. 344/1998 e causam dependência. Ressalte-se que essa também tem sido a compreensão adotada pelo STF, o qual, no julgamento do HC 122.247-DF (Segunda Turma, DJe 2/6/2014), firmou entendimento no sentido de que "a ausência de indicação, no laudo toxicológico, de um dos princípios ativos do entorpecente vulgarmente conhecido como 'maconha' não impede a caracterização da materialidade delitiva". Por fim, saliente-se que a própria Portaria n. 344/1998 determina, em seu art. 95, que plantas, substâncias e/ou medicamentos de uso proscrito no Brasil (Lista E e Lista F) serão incinerados. Ou seja, se a própria portaria integradora dos tipos penais relacionados na Lei de Drogas determinou, expressamente, que as plantas integrantes da Lista E serão incineradas, seria ilógico instituir sua apreensão e incineração, se proscritas não fossem. Precedente citado do STF: HC 116.312-RS, Primeira Turma, DJe 3/10/2013. REsp 1.444.537-RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 12/4/2016, DJe 25/4/2016.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DESCABIMENTO DE INTERVENÇÃO DE TERCEIROS EM PROCEDIMENTO DE DÚVIDA REGISTRÁRIA.



Não é cabível a intervenção de terceiros em procedimento de dúvida registral suscitada por Oficial de Registro de Imóveis (arts. 198 a 207 da Lei n. 6.015/1973). Isso porque inexiste previsão normativa nos aludidos dispositivos legais, que regulam o procedimento, sendo inviável a aplicação subsidiária dos arts. 56 a 80 do CPC/1973. A propósito, veja-se que, em regra, a dúvida registral detém natureza de procedimento administrativo, não jurisdicional, agindo o juiz singular ou o colegiado em atividade de controle da Administração Pública. Esse, inclusive, é o fundamento pelo qual o STJ entende não ser cabível recurso especial nesses casos (AgRg no AREsp 247.565-AM, Terceira Turma, DJe 29/04/2013; e AgRg no AREsp 124.673-SP, Quarta Turma, DJe 20/9/2013). Poder-se-ia argumentar, entretanto, que casos existem em que a dúvida registral se reveste de caráter contencioso, em razão do nascimento de uma pretensão resistida e, portanto, de uma lide, o que conferiria, em tese, a possibilidade de intervenção de terceiros. Contudo, referida possibilidade só poderá ocorrer entre sujeitos que defendam interesses próprios, nunca podendo ser reconhecida entre o registrador e o apresentante do título a registro, pois o oficial não é titular de interesse próprio, não sustentando pretensão alguma. RMS 39.236-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 26/4/2016, DJe 3/5/2016.

DIREITO CIVIL. HIPÓTESE DE AUSÊNCIA DE COBERTURA DO DPVAT.



O Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre (DPVAT) não cobre os danos de acidente ocasionado por trem. A Lei n. 6.194/1974 instituiu o "Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não", conhecido como seguro DPVAT. Por sua vez, o Anexo I do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) - que trata de definições utilizadas no próprio CTB - define "veículo automotor" como "todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas. O termo compreende os veículos conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)". Nessa ordem de ideias, por meio da análise do referido Anexo, bem como das Resoluções ns. 555/2015 e 573/2015 do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), depreende-se que o veículo automotor se distingue das demais espécies, por contar com um movimento intrínseco em sua estrutura, locomovendo-se, de forma autônoma, por meio de motor. Salientado isso, é preciso definir a condição do trem e seus assemelhados (metrô e bonde), uma vez que se locomovem por meio de motor e utilizam trilhos. De antemão, deve-se ter em mente que a espécie de motor, seja por combustão de produtos inflamáveis ou por força elétrica, não é suficiente para se definir a questão. Em verdade, o marco divisor está sobre o modo (via) pelo qual os trens e seus assemelhados circulam. Isso porque, como dito, o próprio CTB estabelece que a expressão "veículo automotor" também compreende aqueles "conectados a uma linha elétrica e que não circulam sobre trilhos (ônibus elétrico)". Dessa forma, o trem, apesar de se autolocomover por motor, necessita da utilização de "trilhos", o que obsta a incidência do seguro previsto na Lei n. 6.194/1974. Com efeito, para fins de recebimento do seguro obrigatório DPVAT, o veículo deve apresentar um motor em sua estrutura, que o permita se autolocomover e circular por terra ou por asfalto (via terrestre). Nesse sentido, a Resolução n. 273/2012 da Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), ao não incluir os veículos que trafegam sobre trilhos em nenhuma das categorias nela indicadas, também os afasta do pagamento de seguro DPVAT. REsp 1.285.647-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 12/4/2016, DJe 2/5/2016.

DIREITO CIVIL. ABRANGÊNCIA DE CLÁUSULA SECURITÁRIA DE INVALIDEZ TOTAL PERMANENTE.



O fato de o beneficiário de seguro de vida em grupo ter sido reformado pelo Exército em razão de incapacidade total para sua atividade habitual (serviço militar) não implica, por si só, o direito à percepção de indenização securitária em seu grau máximo quando a apólice de seguro estipula que esse grau máximo é devido no caso de invalidez total permanente para qualquer atividade laboral. Isso porque, tal como ocorre com a aposentadoria por invalidez reconhecida pelo INSS, o laudo que atesta a incapacidade total do trabalhador não exonera o segurado de realizar nova perícia para demonstrar sua invalidez total e permanente para o trabalho para fins de percepção da indenização securitária (AgRg no Ag 1.158.070-BA, Quarta Turma, DJe 13/8/2015; e AgRg no Ag 1.086.577-MG, Terceira Turma, DJe 11/5/2009). Somente se admitiria entendimento contrário ao ora adotado se houvesse cláusula que estabelecesse que a declaração de invalidez total para a atividade habitual do segurado implicaria o reconhecimento da incapacidade para qualquer atividade laboral para fins de percepção do quantum indenizatório devido por invalidez total permanente. REsp 1.318.639-MS, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 26/4/2016, DJe 6/5/2016.

DIREITO CIVIL. ACORDO DE ALIMENTOS SEM A PARTICIPAÇÃO DO ADVOGADO DO ALIMENTANTE.


É válido o acordo de alimentos celebrado pelos interessados na presença do magistrado e do Ministério Público, mas sem a participação do advogado do alimentante capaz. O art. 6º da Lei de Alimentos (Lei n. 5.478/1968) dispõe que "Na audiência de conciliação e julgamento deverão estar presentes autor e réu, independentemente de intimação e de comparecimento de seus representantes". De acordo com o § 1º do art. 9º do mesmo dispositivo legal: "Art. 9º Aberta a audiência, lida a petição ou o termo, e a resposta, se houver, ou dispensada a leitura, o juiz ouvirá as partes litigantes e o representante do Ministério Público, propondo conciliação. § 1º Se houver acordo, lavrar-se-á o respectivo termo, que será assinado pelo juiz, escrivão, partes e representantes do Ministério Público." À luz da legislação pátria, é indubitável que o alimentante possui capacidade e legitimidade para transacionar, independentemente da presença de seu patrono no momento da realização do ato. Anote-se que a Lei de Alimentos aceita a postulação verbal pela própria parte, por termo ou advogado constituído nos autos (art. 3º, § 1º), o que demonstra a preocupação do legislador em garantir aos necessitados a via judiciária (REsp 1.113.590-MG, Terceira Turma, DJe 10/9/2010). Como consabido, a jurisprudência desta Corte, ao interpretar o art. 36 do CPC/1973, já se manifestou no sentido de que "A assistência de advogado não constitui requisito formal de validade de transação celebrada extrajudicialmente mesmo versando sobre direitos litigiosos" (RESP 666.328-PR, Primeira Turma, DJ 21/3/2005). Mutatis mutandis, se há dispensa da participação do advogado em sede extrajudicial, o mesmo entendimento é possível concluir quando o acordo é firmado perante a via judicial, especialmente porque, neste caso, há maior proteção das partes, tendo em vista a participação do Ministério Público, como custos legis, bem como por meio da atuação do próprio Estado-Juiz. Incide, desse modo, a premissa de que quem pode o mais pode o menos, como já assentado em precedente desta Corte (REsp 1.135.955-SP, Primeira Turma, DJe 19/4/2011). Neste sentido, a fim de respaldar a falta de exigência de participação de advogado em transação firmada em juízo, precedentes também dispensam a intervenção de advogado para a validade de transação realizada com a intenção de pôr fim a processo. Logo, ausentes os vícios de consentimento, quais sejam, dolo, coação, erro substancial quanto à pessoa ou coisa controversa e lesão (art. 849 do CC), não há motivo para a anulação da transação judicial de alimentos celebrada na presença do magistrado e do Ministério Público. REsp 1.584.503-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 19/4/2016, DJe 26/4/2016.

DIREITO CIVIL. VALIDADE DA CLÁUSULA DE 13º ALUGUEL EM CONTRATO DE LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER.



Não é abusiva a mera previsão contratual que estabelece a duplicação do valor do aluguel no mês de dezembro em contrato de locação de espaço em shopping center. De início, cabe ressaltar que o contrato de locação deve ser analisado com base no disposto no art. 54 da Lei de Locações (Lei n. 8.245/1991), que admite a livre pactuação das cláusulas no contrato de locação de espaço em shopping center firmado entre lojistas e empreendedores, observadas as disposições da referida lei. O controle judicial das cláusulas contratuais constantes de contrato de locação de espaço em shopping center deve ser estabelecido a partir dos princípios reitores do sistema de Direito Empresarial, partindo-se, naturalmente, do disposto no art. 54 da Lei de Locações. Com efeito, a locação de espaço em shopping center é uma modalidade de contrato empresarial, contendo fundamentalmente os seguintes elementos: o consentimento dos contratantes, a cessão do espaço e o aluguel. O aluguel em si é composto de uma parte fixa e de uma parte variável. A parcela fixa é estabelecida em um valor preciso no contrato com possibilidade de reajuste pela variação da inflação, correspondendo a um aluguel mínimo mensal. A parcela variável consiste em um percentual sobre o montante de vendas (faturamento do estabelecimento comercial), variando em torno de 7% a 8% sobre o volume de vendas. Se o montante em dinheiro do percentual sobre as vendas for inferior ao valor do aluguel fixo, apenas este deve ser pago; se for superior, paga-se somente o aluguel percentual. No mês de dezembro, é previsto o pagamento em dobro do aluguel para que o empreendedor ou o administrador indicado faça também frente ao aumento de suas despesas nessa época do ano, sendo também chamado de aluguel dúplice ou 13º aluguel. A cobrança do 13º aluguel é prevista em cláusula contratual própria desse tipo peculiar de contrato de locação, incluindo-se entre as chamadas cláusulas excêntricas. A discussão acerca da validade dessa cláusula centra-se na tensão entre os princípios da autonomia privada e da função social do contrato. De acordo com doutrina especializada, o princípio da autonomia privada corresponde ao poder reconhecido pela ordem jurídica aos particulares para dispor acerca dos seus interesses, notadamente os econômicos (autonomia negocial), realizando livremente negócios jurídicos e determinando os respectivos efeitos. A autonomia privada, embora modernamente tenha cedido espaço para outros princípios (como a boa-fé e a função social do contrato), apresenta-se, ainda, como a pedra angular do sistema de direito privado, especialmente no plano do Direito Empresarial. O pressuposto imediato da autonomia privada é a liberdade como valor jurídico. Mediatamente, o personalismo ético aparece também como fundamento, com a concepção de que o indivíduo é o centro do ordenamento jurídico e de que sua vontade, livremente manifestada, deve ser resguardada como instrumento de realização de justiça. O princípio da autonomia privada concretiza-se, fundamentalmente, no direito contratual, por meio de uma tríplice dimensão: a liberdade contratual, a força obrigatória dos pactos e a relatividade dos contratos. A liberdade contratual representa o poder conferido às partes de escolher o negócio a ser celebrado, com quem contratar e o conteúdo das cláusulas contratuais. É a ampla faixa de autonomia conferida pelo ordenamento jurídico à manifestação de vontade dos contratantes. Assevera doutrina que o princípio da relatividade dos contratos expressa, em síntese, que a força obrigatória desse negócio jurídico é restrita às partes contratantes (res inter alios acta). Os direitos e as obrigações nascidos de um contrato não atingem terceiros, cuja manifestação de vontade não teve participação na formação desse negócio jurídico. De outro lado, nenhum terceiro pode intervir no contrato regularmente celebrado. Limita-se, assim, até mesmo, a atuação legislativa do próprio Estado, em virtude da impossibilidade de uma lei nova incidir retroativamente sobre contrato regularmente celebrado por constituir ato jurídico perfeito. Entretanto, admite-se a revisão administrativa e judicial dos contratos nos casos expressamente autorizados pelo ordenamento jurídico. Já a força obrigatória dos contratos é o contraponto da liberdade contratual. Se o agente é livre para realizar qualquer negócio jurídico dentro da vida civil, deve ser responsável pelos atos praticados, pois os contratos são celebrados para serem cumpridos (pacta sunt servanda). A necessidade de efetiva segurança jurídica na circulação de bens impele a ideia de responsabilidade contratual, mas de forma restrita aos limites do contrato. O exercício da liberdade contratual exige responsabilidade quanto aos efeitos dos pactos celebrados. Assim, o controle judicial sobre eventuais cláusulas abusivas em contratos empresariais é mais restrito do que em outros setores do Direito Privado, pois as negociações são entabuladas entre profissionais da área empresarial, observando regras costumeiramente seguidas pelos integrantes desse setor da economia. Ressalte-se que a autonomia privada, como bem delineado no Código Civil de 2002 (arts. 421 e 422) e já reconhecido na vigência do Código Civil de 1916, não constitui um princípio absoluto em nosso ordenamento jurídico, sendo relativizada, entre outros, pelos princípios da função social, da boa-fé objetiva e da prevalência do interesse público. Essa relativização resulta, conforme entendimento doutrinário, o reconhecimento de que os contratos, além do interesse das partes contratantes, devem atender também aos "fins últimos da ordem econômica". Nesse contexto, visando à promoção desses fins, admite o Direito brasileiro, expressamente, a revisão contratual, diante da alteração superveniente das circunstâncias que deram origem ao negócio jurídico (teoria da imprevisão, teoria da base objetiva etc.). REsp 1.409.849-PR, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 26/4/2016, DJe 5/5/2016.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE PENA.



Pendente o trânsito em julgado do acórdão condenatório apenas pela interposição de recurso de natureza extraordinária, é possível a execução de pena. Numa mudança vertiginosa de paradigma, o STF, no julgamento do HC 126.292-SP (Tribunal Pleno, DJe 17/5/2016), mudou sua orientação para permitir, sob o status de cumprimento provisório da pena, a expedição de mandado de prisão depois de exaurido o duplo grau de jurisdição. Em verdade, pelas razões colhidas do voto condutor, o exaurimento da cognição de matéria fática é o balizador determinante a autorizar a execução provisória da pena. Não se cogita, portanto, de prisão preventiva. Em outros termos, pendente o trânsito em julgado apenas pela interposição de recurso de natureza extraordinária, é possível iniciar-se o cumprimento da pena, sem ofensa ao direito fundamental inserto no art. 5º, LVII, da CF. Nesses moldes, é possível iniciar-se o cumprimento da pena, pendente o trânsito em julgado, porque eventual recurso de natureza extraordinária não é, em regra, dotado de efeito suspensivo. QO na APn 675-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 6/4/2016, DJe 26/4/2016.

DIREITO TRIBUTÁRIO. NÃO INCIDÊNCIA DA CONTRIBUIÇÃO AO PIS E DA COFINS SOBRE OS ATOS COOPERATIVOS TÍPICOS. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC/1973 E RES. STJ N. 8/2008).



Não incide a Contribuição destinada ao PIS e a COFINS sobre os atos cooperativos típicos realizados pelas cooperativas. O art. 79 da Lei n. 5.764/1971 preceitua que os atos cooperativos são "os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associados, para a consecução dos objetivos sociais". E ainda, em seu parágrafo único, alerta que "O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria". Anotado isso, entende-se que a norma declarou a hipótese de não incidência tributária, tendo em vista a mensagem que veicula, mesmo sem empregar termos diretos ou específicos, por isso que se obtém esse resultado interpretativo a partir da análise de seu conteúdo. Nesse contexto, atos cooperativos próprios ou internos são aqueles realizados pela cooperativa com os seus associados (cooperados), ou pela cooperativa com outras cooperativas, ou pelos associados com a cooperativa, na busca dos seus objetivos institucionais. O que se deve ter em mente é que os atos cooperativos típicos não são intuitu personae. Não é porque a cooperativa está no polo da relação que os torna atos típicos, mas sim porque o ato que realiza está relacionado com a consecução dos seus objetivos sociais institucionais. REsp 1.141.667-RS e REsp 1.164.716-MG, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, julgado em 27/4/2016, DJe 4/5/2016.

15/04/2016

DIREITO PROCESSUAL PENAL. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE PENA EM AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA.

É possível a execução provisória de pena imposta em acordão condenatório proferido em ação penal de competência originária de tribunal. Inicialmente, ao que tudo está a indicar, a decisão proferida pela composição plena do STF no HC 126.292-SP (julgado em 17/2/2016, ainda não publicado) sufragou pensamento de que o direito é disciplina prática, necessariamente ancorada na realidade. Deveras, em diversos pontos dos votos dos eminentes Ministros que participaram da sessão, assinalou-se, como móvel para a referida guinada jurisprudencial, a gravidade do quadro de "desarrumação" do sistema punitivo brasileiro, máxime por permitir a postergação da definição do juízo de condenação, mercê dos inúmeros recursos previstos na legislação processual penal. Diante dessa pletora de meios impugnativos, que engendra, a cada instância inaugurada no curso processual, uma infindável reapreciação dos mesmos temas já anteriormente debatidos, a Suprema Corte acabou assumindo, na dicção de Ministro daquela Corte, "papel decisivo nessa rearrumação". Em verdade, a possibilidade de prisão após a condenação em segunda instância, quando se esgota a análise dos fatos e das provas, é coerente com praticamente todos os tratados e convenções internacionais que versam direitos humanos. Atenta-se, ainda, à previsão contida no art. 283 do CPP ("Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva"), cuja redação dada pela Lei n. 12.403/2011 veio encampar a jurisprudência até então consolidada do STF, no sentido de que toda prisão, antes do trânsito em julgado, teria natureza cautelar. Ora, é fato que a redação desse artigo encontra sua essência no princípio constitucional da presunção de não culpabilidade. Logo, se o próprio Pretório Excelso, ao interpretar esse princípio constitucional, entendeu pela possibilidade de execução provisória da pena após a prolação de acórdão condenatório, não se verifica como uma interpretação a regra infraconstitucional possa contraditar o alcance de sentido que foi emprestado ao princípio que dá sustentação a essa própria regra infraconstitucional, porquanto, sob a perspectiva kelseniana, as normas inscritas na Carta Maior se encontram no topo da pirâmide normativa, à qual todo o sistema jurídico deve se conformar. Diante disso, não há como pretender que sejam sobrepostas a interpretação e o alcance do art. 283 do CPP à espécie, de modo a afastar o entendimento manifestado pelo STF, porquanto, ao fim e ao cabo, as normas infraconstitucionais é que devem se harmonizar com a Constituição, e não o contrário. A compreensão externada pelo Supremo, por ocasião do julgamento do HC 126.292-SP, poderia ser resumida na conclusão de que o recurso especial, tal como o recurso extraordinário, por ser desprovido de efeito suspensivo, não obsta o início da execução provisória da pena, sem que isso importe em inobservância ao princípio da não culpabilidade, porquanto "o acusado foi tratado como inocente no curso de todo o processo ordinário criminal, observados os direitos e as garantias a ele inerentes, bem como respeitadas as regras probatórias e o modelo acusatório atual. Não é incompatível com a garantia constitucional autorizar, a partir daí, ainda que cabíveis ou pendentes de julgamento de recursos extraordinários, a produção dos efeitos próprios da responsabilização criminal reconhecida pelas instâncias ordinárias" (excerto de voto de Ministro daquela Corte). Como o mencionado acórdão ainda não foi publicado, é possível que ele venha a ser integrado e modelado, de modo a fornecer elementos mais precisos e objetivos para se saber, efetivamente, a partir de qual momento poderá ser autorizado o início da execução da pena, confirmada (ou imposta) em acórdão condenatório. Contudo, isso não implica afastar a possibilidade de o julgador, dentro de seu inerente poder geral de cautela, atribuir, no exercício da jurisdição extraordinária, efeito suspensivo ao REsp ou RE e, com isso, obstar a execução provisória da pena. Isso seria possível, por exemplo, em situações excepcionais, nas quais estivesse caracterizada a verossimilhança das alegações deduzidas na impugnação extrema, de modo que se pudesse constatar, à vol d'oiseau, a manifesta contrariedade do acórdão com a jurisprudência consolidada da Corte a quem se destina a impugnação. Por fim, é necessário se ressaltar que nenhum acréscimo às instituições e ao funcionamento do sistema de justiça criminal resulta da não vinculação de magistrados à clara divisão de competências entre os diversos órgãos judiciários, com base na qual cabe ao STJ a interpretação do direito federal e ao STF a interpretação da CF, motivo pelo qual se deve dar efetivo e imediato cumprimento à nova interpretação dada, pelo STF, aos limites e ao alcance da presunção de não culpabilidade (art. 5º, inc. LVII). EDcl no REsp 1.484.415-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/3/2016, DJe 14/4/2016.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. COMPETÊNCIA PARA EXPEDIÇÃO DE GUIA DE RECOLHIMENTO DE RÉU EM EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE PENA.

Em execução provisória de pena fixada em ação penal originária, a expedição de guia de recolhimento de réu cabe ao tribunal competente para processá-la e julgá-la. De fato, o art. 105 da Lei n. 7.210/1984 (que deve ser conjugado com o art. 2º da mesma lei, respeitante à execução provisória da pena) dispõe que: "Transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução". Sobre o tema, há doutrina no sentido de que "regra geral é a de que cabe ao juiz da ação a competência para a execução da sentença, nela proferida, afinal". De acordo com essa vertente doutrinária, o início da execução da reprimenda compete ao juiz "perante o qual correu a ação penal, pouco importando tenha a executar a sentença por ele próprio proferida, ou a substituída a essa, em virtude do provimento dado, no todo ou em parte, a recurso, ordinário, extraordinário ou misto (revisão), interposto contra aquela sentença". Por fim, na mesma linha, existe entendimento doutrinário no viés de que "compete aos tribunais superiores a execução quando se trata de competência originária da respectiva Corte, ainda que o acórdão por esta proferido tenha sido reformado pelo Supremo Tribunal Federal". EDcl no REsp 1.484.415-DF, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 3/3/2016, DJe 14/4/2016.

DIREITO PENAL. INAPLICABILIDADE DA CAUSA DE AUMENTO DESCRITA NO ART. 302, § 1º, I, DO CTB EM VIRTUDE DE CNH VENCIDA.

O fato de o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor estar com a CNH vencida não justifica a aplicação da causa especial de aumento de pena descrita no § 1º, I, do art. 302 do CTB. No art. 162 do CTB, o legislador, ao definir diferentes infrações administrativas, distinguiu duas situações: dirigir veículo "sem possuir Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão para Dirigir" (inciso I); e dirigir "com validade da Carteira Nacional de Habilitação vencida há mais de trinta dias" (inciso V). Essas situações, embora igualmente configurem infração de trânsito, foram tratadas separadamente, de forma diversa. Em relação ao crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, o § 1º, I, do art. 302 do CTB determina que a pena será aumentada de 1/3 (um terço) à metade se o agente "não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação". Ora, se o legislador quisesse punir de forma mais gravosa o autor de homicídio culposo na direção de veículo automotor cuja CNH estivesse vencida, teria feito expressa alusão a esta hipótese (assim como fez, no § 1º, I, do art. 302, quanto à situação de "não possuir Permissão para Dirigir ou Carteira de Habilitação"). Além disso, no Direito Penal, não se admite a analogia in malam partem, de modo que não se pode inserir no rol das circunstâncias que agravam a pena (art. 302, § 1º) também o fato de o agente cometer homicídio culposo na direção de veículo automotor com carteira de habilitação vencida. HC 226.128-TO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 7/4/2016, DJe 20/4/2016.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. ENTREGA ESPONTÂNEA DE DOCUMENTOS E SIGILO BANCÁRIO.

Não configura quebra de sigilo bancário e fiscal o acesso do MP a recibos e comprovantes de depósitos bancários entregues espontaneamente pela ex-companheira do investigado os quais foram voluntariamente deixados sob a responsabilidade dela pelo próprio investigado. De fato, o STJ, em observância aos arts. 5º, XII, e 93, IX, da CF, é categórico em afirmar que "a quebra do sigilo bancário para investigação criminal deve ser necessariamente submetida à avaliação do magistrado competente" (HC 258.460-SP, Sexta Turma, DJe 18/8/2014). O sigilo bancário é um dever jurídico imposto às instituições financeiras para que estas não divulguem informações acerca das movimentações financeiras de seus clientes, tais como aplicações, depósitos, saques etc. Tal imposição legal deriva do próprio art. 1º da LC n. 105/2001, que assim dispõe: "As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados." Semelhante ao dever jurídico imposto às instituições financeiras, o art. 198 do CTN proibiu a Fazenda Pública e seus servidores púº blicos a divulgação de qualquer informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira dos sujeitos passivos ou de terceiros e sobre a natureza e o estado dos seus negócios ou atividades. Assim, tanto as instituições financeiras quanto a Administração Pública Direta ou Indireta não estão autorizadas a fornecer dados financeiros e/ou fiscais que detenham em razão do exercício de suas atividades e funções, salvo, conforme autorização do art. 5º, XII, da CF, mediante autorização judicial devidamente motivada. O caso, contudo, não se refere a sigilo bancário e/ou fiscal, não estando, pois, abrangido pelo direito fundamental consagrado no art. 5º, XII, da CF. Isso porque não houve, em momento algum, quebra ilegal de sigilo bancário e/ou fiscal pelo Parquet, pois os dados fornecidos não se encontravam mais sob a tutela de instituições financeiras e/ou da Administração Pública - às quais são impostas a obrigatoriedade de proteção do sigilo bancário e fiscal - mas, sim, tratava-se de recibos que foram voluntariamente deixados pelo próprio investigado sob a responsabilidade de sua companheira, tendo esta, espontaneamente, entregue tais documentos ao MP. Ademais, o STJ já se pronunciou, em situação que guarda correlação jurídica com a tese exposta, que, inexistindo hipótese de quebra efetiva de sigilo bancário, desnecessária se faz a respectiva autorização judicial (REsp 1.497.041-PR, Sexta Turma, DJe 9/12/2015). RHC 34.799-PA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 17/3/2016, DJe 20/4/2016.

DIREITO PENAL. PORTE DE ARMA DE FOGO POR VIGIA APÓS O HORÁRIO DE EXPEDIENTE.

O fato de o empregador obrigar seu empregado a portar arma de fogo durante o exercício das atribuições de vigia não caracteriza coação moral irresistível (art. 22 do CP) capaz de excluir a culpabilidade do crime de "porte ilegal de arma de fogo de uso permitido" (art. 14 da Lei n. 10.826/2003) atribuído ao empregado que tenha sido flagrado portando, em via pública, arma de fogo, após o término do expediente laboral, no percurso entre o trabalho e a sua residência. De fato, não parece aceitável admitir a tese de que o vigia estava sob influência de coação moral irresistível, porquanto, quando praticou a conduta proibida, ele estava fora do horário e do ambiente de trabalho, livre, portanto, da relação de subordinação que o obrigava a portar arma de fogo de modo ilegal. Sob esse prisma, não há porque supor a indução do comportamento delitivo por força externa determinante, infligida pelo empregador. A verdade é que não há espaço para aplicação da regra disposta no art. 22 do CP ("Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem"). Assim, a inexigibilidade de conduta diversa somente funciona como causa de exclusão da culpabilidade quando proceder de forma contrária à lei se mostrar como única alternativa possível diante de determinada situação. Se há outros meios de solução do impasse, a exculpante não se caracteriza. Ademais, "importa não confundir, aqui, a atividade exercida pelo réu (vigia) com a de um vigilante (profissional contratado por estabelecimentos financeiros ou por empresa especializada em prestação de serviços de vigilância e transporte de valores), cuja categoria é regulamentada pela Lei nº 7.102/83, ao qual é assegurado o direito de portar armas de fogo, quando em efetivo exercício da profissão" (REsp 1.221.960-SP, Sexta Turma, DJe 9/3/2011). REsp 1.456.633-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 5/4/2016, DJe 13/4/2016.

DIREITO DO CONSUMIDOR E PREVIDENCIÁRIO. NECESSIDADE DE FILIAÇÃO Á ENTIDADE ABERTA DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR PARA CONTRATAR EMPRÉSTIMO.

É possível impor ao consumidor sua prévia filiação à entidade aberta de previdência complementar como condição para contratar com ela empréstimo financeiro. O auxílio financeiro aos associados das entidades de previdência privada fechada é expressamente vedado pelo § 1º do art. 76 da LC n. 109/2001. Para as abertas, todavia, a realização de operações financeiras é admitida com seus patrocinadores, participantes e assistidos, por força de previsão expressa do parágrafo único do art. 71 da referida lei. O STJ, ao interpretar os referidos artigos, pacificou a orientação de que apenas as entidades abertas de previdência privada poderiam realizar operações financeiras com seus filiados e assistidos, hipótese em que ficariam submetidas ao regime próprio das instituições financeiras (REsp 679.865-RS, Segunda Seção, DJ 4/12/2006). Ressalte-se, contudo, que as entidades abertas de previdência complementar não têm como finalidade institucional a operação como instituição bancária. Elas são estritamente disciplinadas e fiscalizadas, conforme legislação específica - a fim de atender, com segurança, à finalidade a que se destinam - a previdência complementar. Quanto à incidência do CDC, a Segunda Seção, no julgamento do REsp 1.536.786-MG (DJe 20/10/2015), definiu que o referido código, embora não seja aplicável às entidades fechadas, aplica-se às entidades abertas de previdência complementar. Após o julgamento desse recurso especial, foi cancelada a Súmula n. 321 do STJ e editada a de n. 563, ficando consolidado o entendimento de que o CDC se aplica às entidades abertas de previdência complementar, não incidindo nos contratos previdenciários celebrados com entidades fechadas. Nesse contexto, considerando que as entidades abertas de previdência privada podem conceder empréstimos apenas aos seus patrocinadores, filiados e assistidos, o plano de pecúlio antecedente ao empréstimo tem por finalidade concretizar a filiação do beneficiário aos quadros da entidade, sem a qual estaria impedida de conceder empréstimos, procedimento que, portanto, não tem relação alguma com a vedação à "venda casada" de que trata o art. 39, I, da Lei n. 8.078/1990. REsp 861.830-RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 5/4/2016, DJe 13/4/2016.
Informativo STJ nº581

DIREITO CIVIL. TERMO INICIAL DO PRAZO PARA HERDEIRO PLEITEAR ANULAÇÃO DE FIANÇA.

O prazo decadencial para herdeiro do cônjuge prejudicado pleitear a anulação da fiança firmada sem a devida outorga conjugal é de dois anos, contado a partir do falecimento do consorte que não concordou com a referida garantia. Dispõe o art. 1.647 do CC que, "Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: [...] III - prestar fiança ou aval". Por sua vez, o art. 1.649 do CC estabelece que "A falta de autorização, não suprimida pelo juiz, quando necessário (art. 1.647), tornará anulável o ato praticado, podendo o outro cônjuge pleitear-lhe a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal". Nota-se, por meio da comunhão dos artigos acima citados, que o CC dispõe, de forma categórica, os atos que não podem ser realizados sem que haja a observância do consentimento do outro consorte - uxória ou marital -, já que essa anuência se consubstancia como elemento essencial para a validade da relação jurídica firmada com terceiro. Logo, não se pode perenizar uma relação jurídica se ao constituí-la houver a inobservância de elemento essencial para sua validade, tal como a outorga conjugal. Por isso, o CC institui meios de o cônjuge prejudicado anular essa garantia, como forma de impedir a manutenção de uma situação inválida. Com efeito, no contexto que a codificação faz para questionar a garantia dada sem a anuência do outro consorte, há a expressa previsão de que tal contenda só será deflagrada apenas, e tão somente, pelo outro cônjuge, ou, com o seu falecimento, pelos herdeiros - como legitimado sucessivo. Aliás, ressalte-se, que tanto a doutrina civilista quanto a jurisprudência pátria possuem reiterados entendimentos no sentido de que não há substrato jurídico para o cônjuge que praticou ato sem a devida outorga instaurar ação para anular o que ele mesmo realizou, devido à ocorrência dovenire contra factum proprium (AgRg no REsp 1.232.895-SP, Quarta Turma, DJe 13/8/2015)Assim, a legitimidade para ingressar com ação de anulabilidade contra fiança firmada sem a necessária outorga conjugal está adstrita ao cônjuge prejudicado, podendo se estender apenas aos herdeiros, no caso de falecimento daquele. É essa a redação do art. 1.650 do CC, o qual dispõe que "A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros". Com isso, o olhar lançado nessa temática deve ser abrangente, já que o comando do art. 1.650 se mostra como complemento daquele delineado no art. 1.649. Isso aponta para o fato de que, por meio do princípio geral da operabilidade, o legislador conjugou os dois artigos por meio de uma interpretação lógico-sistemática. Ou seja, fica evidente que os legitimados apontados no artigo subsequente (1.650) deverão observar as exigências do artigo antecedente (1.649). Por isso, havendo uma complementariedade dos dispositivos, parece melhor a interpretação no sentido de que os herdeiros também observem o prazo delimitado para o próprio consorte quando em vida - 02 anos, caso queiram ingressar em juízo. REsp 1.273.639-SP, Rel. Luis Felipe Salomão, julgado em 10/3/2016, DJe 18/4/2016.

DIREITO CIVIL. POSSIBILIDADE DE ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA AUMENTAR EM ATÉ 12% OS JUROS NO MÚTUO FENERATÍCIO.

A entidade fechada de previdência complementar contratada em mútuo feneratício pode, obedecido o limite de 12% ao ano, cobrar o aumento de taxa de juros pactuado do tomador do crédito (empregado do patrocinador e vinculado ao plano de benefícios oferecido pela mutuante) desde o desligamento deste da relação empregatícia, antes da extinção da obrigação decorrente desse contrato de crédito. Isso porque, como é cediço, os mútuos são oferecidos mediante modelos científicos que, efetivamente, tomam em consideração, na formação das taxas de juros, o risco de inadimplemento. Por isso mesmo, é notório que os empréstimos que envolvam desconto em folha costumam ter taxas mais favoráveis ao tomador, se comparados aos demais mútuos oferecidos pelos bancos. E tanto isso é verdade que um dos objetivos da Lei n. 10.820/2003, ao prescrever a consignação em folha dos pagamentos referentes a empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil contraídos por empregados celetistas, aposentados e pensionistas, foi facilitar o acesso a crédito, inclusive com taxas de juros menores, em razão dos menores riscos de inadimplência envolvendo os contratos de crédito consignado. Com efeito, é razoável que, enquanto houver a permanência do vínculo do participante com o patrocinador, é possível a concessão equânime de juros mais favorecidos, em vista da possibilidade de se efetuar o desconto das prestações do mútuo em folha de pagamento da patrocinadora, tal como é efetuado o desconto das contribuições para os planos de benefícios de previdência privada daqueles participantes que mantêm vínculo de emprego com o patrocinador. REsp 1.304.529-SC, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 15/3/2016, DJe 22/4/2016.

DIREITO EMPRESARIAL. EMISSÃO DE DUPLICATA COM BASE EM MAIS DE UMA NOTA FISCAL.

Uma só duplicata pode corresponder à soma de diversas notas fiscais parciais. A nota fiscal é o documento comprobatório da realização de um negócio jurídico sujeito à fiscalização tributária relativo a bens móveis ou semoventes. Assim, faz prova da entrada e saída de mercadorias de estabelecimentos empresariais, acompanhando a sua entrega aos destinatários. A fatura, por outro lado, consiste em nota representativa de contratos de compra e venda mercantis ou de prestação de serviços, devendo haver, entre outras identificações, a discriminação das mercadorias vendidas e dos preços negociados e a menção à natureza dos serviços prestados. Pode, ainda, conter somente a indicação dos números e valores das notas parciais expedidas por ocasião das vendas, despachos ou entregas das mercadorias (arts. 1º, caput e § 1º, e 20 da Lei n. 5.474/1968). Nas vendas a prazo, ou seja, naquelas cujo pagamento é feito após 30 (trinta) dias, a extração da fatura é obrigatória, sendo o termo inicial do prazo a data da entrega ou do despacho das mercadorias. Já a duplicata é de extração facultativa, podendo ser materializada no ato da emissão da fatura, constituindo o título de crédito genuíno para documentar o saque do vendedor pela importância faturada ao comprador (art. 2º da Lei n. 5.474/1968). Ademais, nos termos do art. 2º, § 2º, da Lei n. 5.474/1968, uma só duplicata não pode corresponder a mais de uma fatura. Nesse sentido, o seguinte precedente que reconheceu a inidoneidade de duplicata vinculada a mais de uma fatura (REsp 577.785-SC, Terceira Turma, DJ 17/12/2004). Todavia, apesar de a duplicata só poder espelhar uma fatura, esta pode corresponder à soma de diversas notas parciais. A nota parcial é o documento representativo de uma venda parcial ou de venda realizada dentro do lapso de um mês, que poderá ser agrupada a outras vendas efetivadas nesse período pelo mesmo comprador. REsp 1.356.541-MG, Rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 5/4/2016, DJe 13/4/2016.

DIREITO CIVIL. RECONHECIMENTO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA POST MORTEM.

Será possível o reconhecimento da paternidade socioafetiva após a morte de quem se pretende reconhecer como pai. De fato, a adoção póstuma é prevista no ordenamento pátrio no art. 42, § 6º, do ECA, nos seguintes termos: "A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença." O STJ já emprestou exegese ao citado dispositivo para permitir como meio de comprovação da inequívoca vontade do de cujus em adotar as mesmas regras que comprovam a filiação socioafetiva, quais sejam: o tratamento do adotando como se filho fosse e o conhecimento público daquela condição. Portanto, em situações excepcionais em que fica amplamente demonstrada a inequívoca vontade de adotar, diante da sólida relação de afetividade, é possível o deferimento da adoção póstuma, mesmo que o adotante não tenha dado início ao processo formal para tanto (REsp 1.326.728-RS, Terceira Turma, DJe 27/2/2014). Tal entendimento consagra a ideia de que o parentesco civil não advém exclusivamente da origem consanguínea, podendo florescer da socioafetividade, o que não é vedado pela legislação pátria, e, portanto, plenamente possível no ordenamento (REsp 1.217.415-RS, Terceira Turma, DJe 28/6/2012; e REsp 457.635-PB, Quarta Turma, DJ 17/3/2003). Aliás, a socioafetividade é contemplada pelo art. 1.593 do CC, no sentido de que "O parentesco é natural ou civil, conforme resulte da consanguinidade ou outra origem". Válido mencionar ainda o teor do Enunciado n. 256 da III Jornada de Direito Civil do CJF, que prevê: "A posse do estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil." Ademais, a posse de estado de filho, segundo doutrina especializada, "liga-se à finalidade de trazer para o mundo jurídico uma verdade social. Aproxima-se, assim, a regra jurídica da realidade. Em regra, as qualidades que se exigem estejam presentes na posse de estado são: publicidade, continuidade e ausência de equívoco". E salienta que "a notoriedade se mostra na objetiva visibilidade da posse de estado no ambiente social; esse fato deve ser contínuo, e essa continuidade, que nem sempre exige atualidade, [...] deve apresentar uma certa duração que revele estabilidade". Por fim, registre-se que a paternidade socioafetiva realiza a própria dignidade da pessoa humana, por permitir que um indivíduo tenha reconhecido seu histórico de vida e a condição social ostentada, valorizando, além dos aspectos formais, como a regular adoção, a verdade real dos fatos. REsp 1.500.999-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 12/4/2016, DJe 19/4/2016.

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE DE O DEPENDENTE ASSUMIR A TITULARIDADE DE PLANO DE SAÚDE APÓS O PERÍODO DE REMISSÃO.

Após o transcurso do período previsto em cláusula de remissão por morte de titular de plano de saúde, o dependente já inscrito pode assumir, nos mesmos moldes e custos avençados, a titularidade do plano. De início, impende asseverar que a cláusula de remissão, pactuada em alguns planos de saúde, consiste em uma garantia de continuidade da prestação dos serviços de saúde suplementar aos dependentes inscritos após a morte do titular, por lapso que varia de 1 a 5 anos, sem a cobrança de mensalidades. Objetiva, portanto, a proteção do núcleo familiar do titular falecido, que dele dependia economicamente, ao ser assegurada, por certo período, a assistência médica e hospitalar, a evitar o desamparo abrupto. Nesse contexto, no tocante à transferência de titularidade do plano de saúde após o término do período de remissão, cumpre ressaltar que a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS editou a Súmula Normativa n. 13/2010, pontificando que "o término da remissão não extingue o contrato de plano familiar, sendo assegurado aos dependentes já inscritos o direito à manutenção das mesmas condições contratuais, com a assunção das obrigações decorrentes, para os contratos firmados a qualquer tempo". Essa orientação foi fundada especialmente nos princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana, da liberdade, da proteção da segurança jurídica e da proteção à entidade familiar, conjugados com o previsto no art. 3º, § 1º, da Resolução Normativa n. 195/2009 da ANS, com o fim de evitar o desamparo dos dependentes inscritos do titular falecido quanto à assistência médica e hospitalar. Assim, deve ser assegurado a dependente o direito de assumir a posição de titular de plano de saúde - saindo da condição de dependente inscrito - desde que arque com as obrigações decorrentes e sejam mantidas as mesmas condições contratuais, em virtude da ausência de extinção da avença, não sendo empecilho, para tanto, o gozo do período de remissão. REsp 1.457.254-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016, DJe 18/4/2016.

DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. EQUIPARAÇÃO DE COMPANHEIRO A CÔNJUGE PARA FINS DE COBERTURA DE CLÁUSULA DE REMISSÃO DE PLANO DE SAÚDE.

O companheiro faz jus à cobertura de cláusula de remissão por morte de titular de plano de saúde na hipótese em que a referida disposição contratual faça referência a cônjuge, sendo omissa quanto a companheiro. De início, impende asseverar que a cláusula de remissão, pactuada em alguns planos de saúde, consiste em uma garantia de continuidade da prestação dos serviços de saúde suplementar aos dependentes inscritos após a morte do titular, por lapso que varia de 1 a 5 anos, sem a cobrança de mensalidades. Objetiva, portanto, a proteção do núcleo familiar do titular falecido, que dele dependia economicamente, ao ser assegurada, por certo período, a assistência médica e hospitalar, a evitar o desamparo abrupto. Diante disso, embora a cláusula de remissão de plano de saúde se refira a cônjuge como dependente, sendo omissa quanto à figura do companheiro, não deve haver distinção sobre esse direito, diante da semelhança de papéis e do reconhecimento da união estável como entidade familiar, promovido pela própria CF (art. 226, § 3º). Nesse sentido, o STJ já reconheceu a possibilidade de inclusão de companheiro como dependente em plano de assistência médica, mesmo em hipóteses mais singulares, como a união entre dois homens ou duas mulheres (AgRg no Ag 971.466-SP, Terceira Turma, DJe 5/11/2008). Desse modo, havendo a equiparação de companheiro e de cônjuge para fins de qualificação como dependente em plano de saúde, deve ser estendido ao companheiro o direito à cobertura adicional de remissão por morte. REsp 1.457.254-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016, DJe 18/4/2016.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PRAZO DECADENCIAL PARA PARTICULAR ANULAR ACORDO FIRMADO COM A FAZENDA PÚBLICA.

No caso em que particular e Fazenda Pública firmaram, sem a participação judicial, acordo que tenha sido meramente homologado por decisão judicial - a qual, por sua vez, apenas extinguiu a relação jurídica processual existente entre as partes, sem produzir efeitos sobre a relação de direito material existente entre elas -, o prazo decadencial para anular o ajuste por meio de ação ajuizada pelo particular é de 5 anos, contados da data da celebração da transação, e não da decisão homologatória. Inicialmente, a presente hipótese não se confunde com a prevista no art. 485, VIII, do CPC/1973, na qual "A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: [...] houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença". Neste caso, a transação constitui apenas um elemento fático-probatório no qual se baseia a sentença de mérito. Conforme entendimento doutrinário, "se a transação foi apenas atendida como ato extrajudicial, trata-se de fato ou de documento que foi posto nos autos", ou seja, "a transação foi base da sentença, elemento probatório". Esta sentença submete-se à ação rescisória, cujo direito de propositura "se extingue em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da decisão" (art. 495 do CPC/1973). O caso em foco, entretanto, trata de situação diferente. Nele, o que se pretende é anular o acordo, realizado sem a participação judicial, no caso em que a decisão jurídica existente se limitou a homologar a avença, conforme o art. 269, III, do CPC/1973 ("Extingue-se o processo com julgamento de mérito: [...] quando as partes transigirem"), mostrando-se esta manifestação judicial necessária tão somente para extinguir a relação jurídica processual existente entre as partes, sem produzir efeitos sobre a relação de direito material existente entre elas. Neste caso, a anulação da transação deve ocorrer por meio da ação prevista no art. 486 do CPC/1973. Esse, aliás, é o entendimento exarado pela Quarta Turma do STJ no julgamento do REsp 38.434-SP (DJ 18/4/1994): "A sentença meramente homologatória de acordo entre as partes é rescindível como os atos jurídicos em geral, nos termos do art. 486 do CPC [...] A ação rescisória a que alude o art. 485, inc. VIII, do CPC somente é cabível na hipótese em que a sentença, apreciando exceção oposta pelo réu, decide matéria já transigida, quando tem natureza nitidamente jurisdicional, ou na hipótese em que, antes de homologada a transação, ressurgir conflito entre as partes [...] O art. 269, III, do CPC apenas equipara a sentença homologatória em seus efeitos, à sentença de mérito, não lhe conferindo, porém, a autoridade de coisa julgada material". Ademais, essas considerações prevaleceram em julgados posteriores do STJ (REsp 450.431-PR, Primeira Turma, DJ 20/10/2003; AgRg no REsp 596.271-RS, Quarta Turma, DJ 17/5/2004; REsp 763.762-GO, Segunda Turma, DJ 10/10/2005; e REsp 1.127.425-MT, Segunda Turma, DJe 2/12/2009). Assim, no que diz respeito ao caso em foco, firmada a premissa de que a anulação do acordo meramente homologado por decisão judicial nos termos do art. 269, III, do CPC/1973 deve ocorrer por meio da ação prevista no art. 486 do CPC/1973, cumpre verificar que, nos termos deste dispositivo, "Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil". Nesse contexto, é esclarecedor o entendimento doutrinário no sentido de que, embora o legislador tenha denominado atos judiciais, trata-se de atos das partes, pois apenas estes independem de sentença ou podem ser sujeitos à processualização com homologação. Do exame do dispositivo, verifica-se, ainda, que a anulação dos atos processuais deve ocorrer "como os atos jurídicos em geral, nos termos da lei civil". Na linha de lição doutrinária, "a referência à 'lei civil' foi feita brevitatis causa: entenda-se 'lei material', porque o ato jurídico inserto no processo, ou tomado por termo, pode ser regido pelo direito público, ou pelo direito comercial, ou, até, por direito estrangeiro". Nessa conjuntura, em se tratando de ação anulatória proposta contra a Fazenda Pública, o prazo decadencial é regido pelo art. 1º do Decreto 20.910/1932, de acordo com o qual "As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem". Isso porque este preceito legal é aplicável em relação a todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública (federal, estadual ou municipal), seja qual for a sua natureza. Quanto ao termo inicial, por força do aludido art. 1º do Decreto 20.910/1932, o prazo quinquenal é contado "da data do ato ou fato" do qual se originar o direito (e não da data da decisão judicial homologatória). Além disso, não se mostra lógico, ao admitir que o meio adequado para o desfazimento do acordo é a ação anulatória (e não a ação rescisória), tomar como termo inicial para o prazo decadencial a data em que foi proferida a decisão homologatória. Ora, no mesmo sentido de precedente antigo do STF (RE 100.466-SP, Segunda Turma, DJ 28/2/1986), a ação que objetiva a anulação de transação "não é contra a sentença, que se restringe a homologar ato de vontade das partes, em que não há um conteúdo decisório do Juiz", a ação é "contra o que foi objeto da manifestação de vontade das partes, a própria transação [...] o que se objetiva rescindir, ou melhor, anular, não é a sentença homologatória, que não faz coisa julgada material, mas a transação celebrada pelos litigantes, a relação jurídico-material efetuada pelas partes", sendo que "apenas para efeito processual é que a homologação judicial se torna indispensável". Conforme entendimento doutrinário, o objeto da ação anulatória, nessa hipótese, não é o ato praticado pelo juízo (homologação), mas o próprio negócio firmado pelas partes. Esse mesmo critério, ademais, foi adotado pelo legislador do CC/2002 (e também do CC/1916) no que se refere à anulação do negócio jurídico em virtude da existência de defeito (erro, dolo, fraude contra credores, estado de perigo ou lesão), hipótese na qual o prazo decadencial é contado do dia em que se realizou o negócio jurídico (art. 178, II, do CC/2002; e art. 178, § 9º, V, b, do CC/1916). REsp 866.197-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 18/2/2016, DJe 13/4/2016.

DIREITO ADMINISTRATIVO. REDUÇÃO DA DURAÇÃO MÁXIMA DE JORNADA DE TRABALHO DE SERVIDORES DA UNIÃO QUE OPERAM DIRETAMENTE COM RAIOS X.

Independentemente da categoria profissional, todos os servidores da União, civis e militares, e os empregados de entidades paraestatais de natureza autárquica que operam, de forma habitual, diretamente com raios X e substâncias radioativas, próximo às fontes de irradiação, têm o direito à redução da duração máxima da jornada de trabalho de 40 para 24 horas semanais prevista no art. 1º da Lei n. 1.234/1950. Nos termos do art. 19,caput, da Lei n. 8.112/1990, os servidores públicos cumprirão jornada de trabalho de duração máxima de 40 horas semanais. Contudo, o seu § 2º excepciona a adoção de jornada laboral diferenciada para os servidores públicos submetidos à legislação especial. Nesse passo, o art. 1º da Lei n. 1.234/1950 estabelece que os servidores da União, civis e militares, e os empregados de entidades paraestatais de natureza autárquica que operam diretamente com raios X e substâncias radioativas, próximo às fontes de irradiação, terão direito a regime máximo de vinte e quatro horas semanais de trabalho. Amens legis é no sentido da proteção da saúde desses servidores, independentemente da qualificação profissional. AgInt no REsp 1.569.119-SP, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 7/4/2016, DJe 15/4/2016.

DIREITO ADMINISTRATIVO. INAPLICABILIDADE DAS SANÇÕES POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA ABAIXO DO MÍNIMO LEGAL.

No caso de condenação pela prática de ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública, as penalidades de suspensão dos direitos políticos e de proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios não podem ser fixadas aquém do mínimo previsto no art. 12, III, da Lei n. 8.429/1992. Isso porque é manifesta a ausência de previsão legal. REsp 1.582.014-CE, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 7/4/2016, DJe 15/4/2016.

DIREITO ADMINISTRATIVO. PRAZO PARA O TCU EXIGIR COMPROVAÇÃO DE REGULAR APLICAÇÃO DE VERBAS FEDERAIS POR MEIO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL.

É de cinco anos o prazo para o TCU, por meio de tomada de contas especial (Lei n. 8.443/1992), exigir do ex-gestor público municipal a comprovação da regular aplicação de verbas federais repassadas ao respectivo Município. De fato, não se olvida que as "ações de ressarcimento" são imprescritíveis, conforme dispõe § 5º do art. 37 da CF, o que tem sido observado e reiterado nos julgamentos do STJ, seja em sede de ação de improbidade com pedido de ressarcimento, seja em ação com o fim exclusivo de ressarcir o erário. No entanto, a hipótese em análise não versa sobre o exercício do direito de ação, ou seja, de pedir ressarcimento perante o Poder Judiciário. Diversamente, trata da imputação de débito e aplicação de multa promovida pelo TCU, no exercício do seu poder/dever de velar pelas contas públicas, mediante atuação administrativa, oportunidade em que não há falar em exercício do direito de ação. Trata-se de procedimento de controle das finanças públicas, de grande valia, a fim de constituir crédito não tributário, no caso de contas julgadas irregulares, com reconhecido status de título executivo extrajudicial, nos termos dos arts. 19, caput, e 24 da Lei n. 8.443/1992. Sob esse prisma, o ônus da prova do adequado e regular emprego das verbas públicas é imputado, como não poderia ser diferente, ao responsável pela utilização dos valores repassados pela União. Assim, a não comprovação da adequada aplicação dos recursos públicos traduz, apenas por presunção, a ocorrência de prejuízo ao erário e, consequentemente, a imputação do débito e multa ao gestor falho ou faltoso. E nesse ponto reside o principal fundamento para entender que a atuação administrativa está sujeita a prazo para a constituição do crédito não tributário. Isso porque, enquanto que na tomada de contas especial o ônus da prova incumbe ao responsável pela aplicação dos recursos repassados, característica intrínseca do processo de prestação ou tomada de contas; na ação de ressarcimento, imprescritível, o ônus da prova do efetivo prejuízo ao erário incumbe a quem pleiteia o ressarcimento, perante o Poder Judiciário. Dessa forma, não é razoável cogitar, mediante singelo raciocínio lógico, que ex-gestor público permaneça obrigado a provar que aplicou adequadamente verbas públicas após 30, 40 ou 50 anos dos fatos a serem provados, em flagrante vulneração dos princípios da segurança jurídica e da ampla defesa, bases do ordenamento jurídico, afinal é notória a instabilidade jurídica e a dificuldade, ou mesmo impossibilidade, de produção de provas após o decurso de muito tempo. Lado outro, a imprescritibilidade das ações de ressarcimento visa, à evidência, o resguardo do patrimônio público a qualquer tempo. Nessa hipótese, conforme a dicção constitucional "ação de ressarcimento", o ônus da prova incumbe a quem alega a ocorrência do prejuízo ao erário e atribui responsabilidade ao seu causador, perante o Poder Judiciário. Assim, a exceção constitucional à regra da prescritibilidade pressupõe o exercício da jurisdição e a efetiva prova do prejuízo ao erário e da responsabilidade do seu causador, ônus de quem pleiteia. Caso contrário, admitir-se-ia Estado de Exceção, em que qualquer ex-gestor público demandado pelo TCU, em tomada de contas especial, estaria obrigado a provar, a qualquer tempo, mesmo que decorridas décadas, a adequada aplicação de verbas federais repassadas, independentemente da comprovação de efetivo prejuízo ao erário. Dessa forma, a atuação do TCU, mediante tomada de contas especial, atribuindo o ônus da prova a quem recebeu repasse de verbas públicas federais é legítimo e possível, nos termos da legislação, em especial a Lei n. 8.443/1992. Entretanto, a não sujeição dessa atuação a limite temporal conduziria a situações de profunda e grave perplexidade, contrárias ao Estado de Direito. Quanto ao prazo para a atuação do TCU, o art. 8º da Lei n. 8.443/1992, ao tratar do aspecto temporal na tomada de contas especial, apenas prevê que "a autoridade administrativa competente, sob pena de responsabilidade solidária, deverá imediatamente adotar providências com vistas à instauração da tomada de contas especial para apuração de fatos, identificação dos responsáveis e quantificação do dano" no caso de "não comprovação da aplicação dos recursos repassados pela União". Dessa forma, resulta imperativo o uso da analogia, como recurso de integração legislativa, conforme permissivo do art. 4º da LINDB, para o fim de aferir o prazo para o agir da Administração. Nesse passo, descarta-se, de pronto, a aplicação das regras gerais de prescrição previstas no Código Civil em virtude da especificidade do Direito Administrativo em face do Direito Privado. Isso posto, verifica-se que, no âmbito do Direito Administrativo, o Decreto n. 20.910/1932, estabeleceu, como regra geral, o prazo prescricional quinquenal, quando o sujeito passivo da relação jurídica for a Fazenda Pública (art. 1º). E, na hipótese inversa, ou seja, quando o sujeito ativo for a Administração, o ordenamento jurídico somente previu regras específicas para determinadas ações administrativas, que se assemelham ao direito não regulado em questão, como se extrai da análise dos arts. 173 e 174 do CTN, art. 142 da Lei n. 8.112/1990, art. 54 da Lei n. 9.784/1999, art. 23 da Lei n. 8.429/1992, art. 13, § 1º, da Lei n. 9.847/1999, art. 1º da Lei n. 6.838/1980, e, em especial, do art. 1º da Lei n. 9.873/1999. Percebe-se, da análise desses dispositivos, que o prazo máximo de cinco anos é uma constante para as hipóteses de decadência ou prescrição nas relações com o Poder Público, seja por meio de regra geral quando está no polo passivo da relação, seja por meio de inúmeras regras específicas quando está no polo ativo da relação jurídica. Dessa forma, não há motivo bastante para distinguir a hipótese dos autos ao das regras específicas similares, em que a Administração possui o prazo de 5 anos para apurar infrações, ou mesmo da regra geral que impõe o prazo de 5 anos para as ações dos administrados contra a Administração. Aliás, em hipótese similar à presente, porquanto ausente prazo decadencial específico no que concerne ao exercício do poder de polícia pela Administração, antes do advento da Lei n. 9.873/1999, a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.105.442-RJ (DJe 22/2/2011), sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, assentou ser ele de 5 anos, valendo-se da aplicação analógica do art. 1º do Decreto n. 20.910/1932. Isso posto, a tomada de contas especial está sujeita ao prazo decadencial de 5 anos desde quando exigível, limite temporal para que irregularidade nas contas gere presunção de prejuízo ao erário e importe na imputação do débito e multa ao responsável. Expirado esse prazo, ressalva-se a via judicial para eventual ação de ressarcimento, esta imprescritível, oportunidade em que deverá ser provado o efetivo prejuízo ao erário e a responsabilidade do acionado. REsp 1.480.350-RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 5/4/2016, DJe 12/4/2016.