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27/04/2019

ART. 218-B DO CÓDIGO PENAL. FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇA, ADOLESCENTE OU VULNERÁVEL. TIPICIDADE. ENQUADRAMENTO DOS ADOLESCENTES NO CONCEITO DE RELATIVAMENTE VULNERÁVEIS.

No artigo 218-B do Código Penal não basta aferir a idade da vítima, devendo-se averiguar se o menor de 18 (dezoito) anos ou a pessoa enferma ou doente mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou por outra causa não pode oferecer resistência. Diferentemente do que ocorre nos arts. 217-A, 218 e 218-A do Código Penal, nos quais o legislador presumiu de forma absoluta a vulnerabilidade dos menores de 14 (catorze) anos, no art. 218-B não basta aferir a idade da vítima, devendo-se averiguar se o menor de 18 (dezoito) anos não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou por outra causa não pode oferecer resistência, o que usualmente ocorre mediante a comprovação de que se entrega à prostituição devido às suas más condições financeiras. A doutrina assevera que "a justificativa para se ampliar o conceito, é o fato de que embora o maior de 14 já esteja apto a manifestar sua vontade sexual, normalmente ele se entrega à prostituição face à péssima situação econômica", motivo pelo qual "a sua imaturidade em função da idade associada a sua má situação financeira o torna vulnerável". Assim, não há falar em atipicidade da conduta sob o argumento de que o adolescente teria consentido com a prática dos atos libidinosos, quando o agente se aproveita da situação de miserabilidade do ofendido, atraindo-o a se prostituir. HC 371.633-SP, Rel. Min. Jorge Mussi, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 26/03/2019.
Informativo STJ nº645

ART. 218-B, § 2º, I, DO CÓDIGO PENAL. FAVORECIMENTO DA PROSTITUIÇÃO OU DE OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇA OU ADOLESCENTE OU DE VULNERÁVEL. AGENTE QUE PRATICA CONJUNÇÃO CARNAL OU OUTRO ATO LIBIDINOSO. HABITUALIDADE. DESNECESSÁRIA.

O crime previsto no inciso I do § 2º do artigo 218-B do Código Penal se consuma independentemente da manutenção de relacionamento sexual habitual entre o ofendido e o agente. Da leitura do Art. 218-B, § 2º, I, do Código Penal, verifica-se que são punidos tanto aquele que capta a vítima, inserindo-a na prostituição ou outra forma de exploração sexual (caput), como também o cliente do menor prostituído ou sexualmente explorado (§ 1º). Sobre o tipo, diferentemente do caput do artigo 218-B da Lei Penal que reclama a habitualidade para a sua configuração, a figura do inciso I do § 2º da aludida norma incriminadora, cuja caracterização independe da manutenção de relacionamento sexual habitual entre o ofendido e o agente. Sobre o assunto, Cleber Masson a doutrina leciona que "nos núcleos 'submeter', 'induzir', 'atrair' e 'facilitar', a consumação se dá no momento em que a vítima passa a se dedicar com habitualidade ao exercício da prostituição ou de outra forma de exploração sexual, ainda que não venha a atender pessoa interessada em seus serviços", ao passo que o tipo do inciso I do § 1º do artigo 218-B do Código Penal "não reclama a habitualidade no relacionamento sexual entre o agente e a pessoa menor de 18 e maior de 14 anos". HC 371.633/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 26/03/2019.
Informativo STJ nº645

PREVIDÊNCIA PRIVADA. INSCRIÇÃO DE BENEFICIÁRIO. PAGAMENTO DE JOIA. PREVISÃO NO REGULAMENTO DO PLANO DE BENEFÍCIOS. POSSIBILIDADE.

É válida a exigência de pagamento de joia para inscrição de beneficiário no plano de previdência complementar para fazer jus à pensão por morte. Inicialmente cumpre salientar que o art. 202 da Constituição Federal consagra o regime de financiamento por capitalização ao estabelecer que a previdência privada tem caráter complementar (rectius, suplementar) - baseado na prévia constituição de reservas que garantam o benefício contratado -, adesão facultativa e organização autônoma em relação ao regime geral de previdência social. O art. 40 da Lei n. 6.435/1977 estabelecia que, "para garantia de todas as suas obrigações, as entidades fechadas constituirão reservas técnicas, fundos especiais e provisões em conformidade com os critérios fixados pelo órgão normativo do Ministério da Previdência e Assistência Social, além das reservas e fundos determinados em leis especiais". Já o artigo 1º da Lei Complementar n. 109/2001 estabelece que o regime de previdência privada é baseado na prévia constituição de reservas que garantam o benefício. A constituição de reservas no regime de previdência privada complementar deve ser feita por meio de cálculos embasados em estudos de natureza atuarial que prevejam as despesas e garantam, em longo prazo, o respectivo custeio. Nesse diapasão, a previsão de pagamento de joia para inscrição de beneficiário é coerente com o regime financeiro de capitalização, por implicar elevação de projeção de despesas, sem que tenham sido previamente custeadas, mediante a formação da reserva matemática necessária para o pagamento do novo benefício. REsp 1.605.346-BA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 12/02/2019, DJe 28/03/2019.
Informativo STJ nº645

SOCIEDADE EMPRESÁRIA. INTEGRALIZAÇÃO DE CAPITAL SOCIAL POR MEIO DE IMÓVEIS. CONTRATO SOCIAL. REGISTRO PÚBLICO DE EMPRESAS MERCANTIS. TÍTULO TRANSLATIVO. TRANSFERÊNCIA DE TITULARIDADE. REGISTRO NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. NECESSIDADE.

O registro do título translativo no Cartório Registro de Imóveis, como condição imprescindível à transferência de propriedade de bem imóvel entre vivos, propugnada pela lei civil, não se confunde, tampouco pode ser substituído para esse efeito, pelo registro do contrato social na Junta Comercial. A questão controvertida está em saber se a constituição de sociedade empresarial, registrada em Junta Comercial, com a estipulação de integralização do capital social por meio de imóveis, indicados pelo sócio, é suficiente para operar a transferência da propriedade. Assinala-se, inicialmente, que o estabelecimento do capital social — assim compreendido como os recursos a serem expendidos pelos sócios para a formação do primeiro patrimônio social, necessários para a constituição da sociedade —, e o modo pelo qual se dará a sua integralização, consubstanciam elementos essenciais à confecção do contrato social (art. 997, III e IV, do Código Civil). A integralização do capital social da empresa, ademais, pode se dar por meio da realização de dinheiro ou bens — móveis ou imóveis —, havendo de se observar, necessariamente, o modo pelo qual se dá a transferência de titularidade de cada qual. Em se tratando de imóvel, a incorporação do bem à sociedade empresarial haverá de observar, detidamente, os ditames do art. 1.245 do Código Civil, que dispõe: transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. Nesse sentido, já se pode antever que o registro do título translativo no Registro de Imóveis, como condição imprescindível à transferência de propriedade de bem imóvel entre vivos, propugnada pela lei civil, não se confunde, tampouco pode ser substituído para esse efeito, pelo registro do contrato social na Junta Comercial. De fato, a inscrição do contrato social no Registro Público de Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comercias, destina-se, primordialmente, à constituição formal da sociedade empresarial, conferindo-se-lhe personalidade jurídica própria, absolutamente distinta dos sócios dela integrantes. Explicitado, nesses termos, as finalidades dos registros em comento, pode-se concluir que o contrato social, que estabelece a integralização do capital social por meio de imóvel indicado pelo sócio, devidamente inscrito no Registro Público de Empresas Mercantis, não promove a incorporação do bem à sociedade; constitui, sim, título translativo hábil para proceder à transferência da propriedade, mediante registro, perante o Cartório de Registro de Imóveis em que se encontra registrada a matrícula do imóvel. Portanto, enquanto não operado o registro do título translativo — no caso, o contrato social registrado perante a Junta Comercial — no Cartório de Registro de Imóveis, o bem, objeto de integralização, não compõe o patrimônio da sociedade empresarial. REsp 1.743.088-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 12/03/2019, DJe 22/03/2019.
Informativo STJ nº645

TEMPESTIVIDADE. SUSPENSÃO DO PRAZO RECURSAL. NASCIMENTO DO FILHO DO ÚNICO PATRONO DA CAUSA. COMUNICAÇÃO IMEDIATA AO JUÍZO. DESNECESSIDADE.

A suspensão do processo em razão da paternidade do único patrono da causa se opera tão logo ocorra o fato gerador (nascimento ou adoção), independentemente da comunicação imediata ao juízo. O propósito recursal é dizer sobre a tempestividade da apelação, considerando o nascimento do filho do único patrono da causa no curso do prazo recursal. A disposição legal do art. 313, X e § 7º, do CPC/2015, ao lado do previsto no inciso IX do mesmo artigo, visa dar concretude aos princípios constitucionais da proteção especial à família e da prioridade absoluta assegurada à criança, na medida em que permite aos genitores prestar toda a assistência necessária – material e imaterial – ao seu filho recém-nascido ou adotado, além de possibilitar o apoio recíproco em prol do estabelecimento da nova rotina familiar que se inaugura com a chegada do descendente. Assim, se a lei concede ao pai a faculdade de se afastar do trabalho para acompanhar o filho nos seus primeiros dias de vida ou de convívio familiar, não é razoável lhe impor o ônus de atuar no processo, durante o gozo desse nobre benefício, apenas para comunicar e justificar aquele afastamento. Logo, a legislação não impõe ao advogado o ônus de comunicar ao Juízo o nascimento de seu filho para só a partir de então se beneficiar da suspensão. Por força da lei, a suspensão do processo pela paternidade tem início imediatamente à data do nascimento ou adoção, ainda que outra seja a data da comprovação nos autos, que pode ser feita no momento da interposição do recurso ou da prática do primeiro ato processual do advogado, desde que aquelase dê antes de operada a preclusão, já considerado no cômputo do respectivo prazo o período suspenso de 8 (oito) dias. REsp 1.799.166-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 02/04/2019, DJe 04/04/2019.
Informativo STJ nº645

FIXAÇÃO DA DATA DA SEPARAÇÃO DE FATO DO CASAL PARA FINS DE PARTILHA. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. MÉRITO DA CONTROVÉRSIA. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. POSSIBILIDADE. ART. 1.015, II, DO CPC/2015.

Cabe agravo de instrumento, nos termos do art. 1.015, II, do CPC/2015, contra decisão interlocutória que fixa data da separação de fato do casal para efeitos da partilha dos bens. O CPC/2015, nos termos do art. 356, caput e incisos, passou a admitir, expressamente, a existência de decisões parciais de mérito, reconhecendo a possibilidade de pedidos cumulados ou de parcelas de pedidos suscetíveis de fracionamento estarem aptos para julgamento em momentos processuais distintos, seja porque sobre eles não existe controvérsia, seja porque sobre eles não há necessidade de mais aprofundada dilação probatória, com aptidão, em ambas as hipóteses, para a formação de coisa julgada material. Na hipótese, a decisão que fixou a data da separação de fato do casal para fins de partilha de bens versa sobre o mérito do processo, na medida em que se refere a um diferente fragmento de um mesmo pedido e de um mesmo objeto litigioso – a partilha de bens das partes –, especialmente porque a pretensão de partilha de bens deduzida em juízo pressupõe a exata definição "do quê" se partilha, o que somente se pode delimitar a partir do exame dos bens suscetíveis de divisão em um determinado lapso temporal. Se entendeu o juízo de 1º grau de jurisdição que seria mais apropriado fracionar o pedido de partilha, resolvendo-o em sucessivas decisões na medida da evolução da tramitação processual e ao exato tempo em que as questões apresentadas eram suficientemente esclarecidas, não há error in procedendo, sobretudo porque a forma de condução do processo está no âmbito dos poderes diretivo e de gestão processual do magistrado.Finalmente, anote-se que eventual afirmativa de que a fixação da data da separação de fato para fins de partilha não compõe o mérito da pretensão de partilha de bens e resulta, em última análise, no reconhecimento de que a decisão que a fixou não é recorrível de imediato pelo agravo de instrumento, o que acarretaria na possibilidade de haver o trânsito em julgado daquela decisão parcial de mérito antes de se definir os termos inicial e final da relação conjugal das partes para fins de partilha, cenário hipotético em que a eventual modificação da data da separação de fato encontraria intransponível óbice na coisa julgada material formada sobre a partilha parcial dos bens. REsp 1.798.975-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 02/04/2019, DJe 04/04/2019.
Informativo STJ nº645

AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 966, INCISO VII, DO CPC/2015. PROVA NOVA. CONCEITO. INCLUSÃO DA PROVA TESTEMUNHAL.

No novo ordenamento jurídico processual, qualquer modalidade de prova, inclusive a testemunhal, é apta a amparar o pedido de desconstituição do julgado rescindendo na ação rescisória. Cinge-se a controvérsia a definir se a prova testemunhal obtida em momento posterior ao trânsito em julgado da decisão rescindenda está incluída no conceito de "prova nova" a que se refere o artigo 966, inciso VII, do Código de Processo Civil de 2015, de modo a ser considerado, para fins de contagem do prazo decadencial, o termo inicial especial previsto no artigo 975, § 2º, do CPC/2015 (data da descoberta da prova nova). O novo CPC, com o nítido propósito de alargar o espectro de abrangência do cabimento da ação rescisória, passou a prever, no inciso VII do artigo 966, a possibilidade de desconstituição do julgado pela obtenção de "prova nova" em substituição à expressão "documento novo" disposta no mesmo inciso do artigo 485 do código revogado. Assim, nas ações rescisórias fundadas na obtenção de prova nova, o termo inicial do prazo decadencial é diferenciado, qual seja, a data da descoberta da prova nova, observado o prazo máximo de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no processo. REsp 1.770.123-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 26/03/2019, DJe 02/04/2019.
Informativo STJ nº645

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 1.015, XI C/C ART. 373, § 1º, DO CPC/2015. ÔNUS DA PROVA. DISTRIBUIÇÃO DINÂMICA. ATRIBUIÇÕES DISTINTAS DA REGRA GERAL. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. CABIMENTO.

É cabível agravo de instrumento contra decisão interlocutória que defere ou indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova ou quaisquer outras atribuições do ônus da prova distinta da regra geral, desde que se operem ope judicis e mediante autorização legal. Inicialmente, cumpre salientar que no direito brasileiro, o ônus da prova é disciplinado a partir de uma regra geral prevista no art. 373, I e II, do CPC/2015, denominada de distribuição estática do ônus da prova, segundo a qual cabe ao autor provar o fato constitutivo do direito e cabe ao réu provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, admitindo-se, ainda, a existência de distribuição estática do ônus da prova de forma distinta da regra geral, caracterizada pelo fato de o próprio legislador estabelecer, previamente, a quem caberá o ônus de provar fatos específicos, como prevê, por exemplo, o art. 38 do CDC. Para as situações faticamente complexas insuscetíveis de prévia catalogação pelo direito positivo, a lei, a doutrina e a jurisprudência passaram a excepcionar a distribuição estática do ônus da prova, criando e aplicando regras de distribuição diferentes daquelas estabelecidas em lei, contexto em que surge a regra de inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, e a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, reiteradamente aplicada por esta Corte mesmo antes de ser integrada ao direito positivo, tendo ambas – inversão e distribuição dinâmica – a característica de permitir a modificação judicial do ônus da prova (modificação ope judicis). As diferentes formas de se atribuir o ônus da prova às partes se reveste de acentuada relevância prática, na medida em que a interpretação conjunta dos arts. 1.015, XI, e 373, §1º, do CPC/2015, demonstra que nem todas as decisões interlocutórias que versem sobre o ônus da prova são recorríveis de imediato, mas, sim, apenas aquelas proferidas nos exatos moldes delineados pelo art. 373, §1º, do CPC/2015, que contempla duas regras jurídicas distintas, ambas criadas para excepcionar à regra geral, sendo que a primeira diz respeito à atribuição do ônus da prova, pelo juiz, em hipóteses previstas em lei, de que é exemplo a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, e a segunda diz respeito à teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, incidente a partir de peculiaridades da causa que se relacionem com a impossibilidade ou com a excessiva dificuldade de se desvencilhar do ônus estaticamente distribuído ou, ainda, com a maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário. Embora ontologicamente distintas, a distribuição dinâmica e a inversão do ônus têm em comum o fato de excepcionarem a regra geral do art. 373, I e II, do CPC/2015, de terem sido criadas para superar dificuldades de natureza econômica ou técnica e para buscar a maior justiça possível na decisão de mérito e de se tratarem de regras de instrução que devem ser implementadas antes da sentença, a fim de que não haja surpresa à parte que recebe o ônus no curso do processo e também para que possa a parte se desincumbir do ônus recebido. Nesse cenário, é cabível a impugnação imediata da decisão interlocutória que verse sobre quaisquer das exceções mencionadas no art. 373, §1º, do CPC/2015, pois somente assim haverá a oportunidade de a parte que recebe o ônus da prova no curso do processo dele se desvencilhar, seja pela possibilidade de provar, seja ainda para demonstrar que não pode ou que não deve provar, como, por exemplo, nas hipóteses de prova diabólica reversa ou de prova duplamente diabólica. Em síntese, o agravo de instrumento deve ser admitido não apenas na hipótese de decisão interlocutória que defere ou que indefere a distribuição dinâmica do ônus da prova, mas, igualmente, na hipótese de decisão interlocutória que defere ou que indefere quaisquer outras atribuições do ônus da prova distintas da regra geral, desde que se operem ope judicis e mediante autorização legal. REsp 1.729.110-CE, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 02/04/2019, DJe 04/04/2019.
Informativo STJ nº645

RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CLASSIFICAÇÃO DE CRÉDITOS. PENSIONAMENTO DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRÂNSITO. INCAPACIDADE DEFINITIVA PARA O TRABALHO. NATUREZA ALIMENTAR. EQUIPARAÇÃO A CRÉDITO DERIVADO DA LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.

O pensionamento fixado em sentença judicial, decorrente de ação de indenização por acidente de trânsito, pode ser equiparado ao crédito derivado da legislação trabalhista para fins de inclusão no quadro geral de credores de sociedade em recuperação judicial. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que créditos de natureza alimentar, ainda que não decorram especificamente de relação jurídica submetida aos ditames da legislação trabalhista, devem receber tratamento análogo para fins de classificação em processos de execução concursal. Essa posição da jurisprudência decorre do reconhecimento de que as diversas espécies de verbas que ostentam natureza alimentar, dada a afinidade ontológica que lhes é inerente, devem receber tratamento isonômico para os fins da Lei de Falência e Recuperação de Empresas, ainda que ausente disposição legal específica versando sobre cada uma elas. Essa foi a orientação da Corte Especial por ocasião do julgamento o REsp 1.152.218/RS (DJe 9/10/2014), submetido à sistemática dos recursos repetitivos, que acabou fixando a tese de que os valores devidos a título de honorários advocatícios devem, de fato, ser classificados no mesmo patamar destinado aos créditos trabalhistas. Da mesma forma, versando a hipótese sobre valores que ostentam indubitável natureza alimentar, pois se referem à pensão fixada em decorrência de perda definitiva da capacidade laboral deve ser observado, quanto a esses, o tratamento conferido aos créditos derivados da legislação do trabalho. REsp 1.799.041-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 02/04/2019, DJe 04/04/2019.
Informativo STJ nº645

DIREITO AO CADÁVER. DESTINAÇÃO DO CORPO HUMANO APÓS A MORTE. MANIFESTAÇÃO DE ÚLTIMA VONTADE DO INDIVÍDUO. INEXISTÊNCIA DE FORMALIDADE ESPECÍFICA. CRIOGENIA. POSSIBILIDADE.

Não há exigência de formalidade específica acerca da manifestação de última vontade do indivíduo sobre a destinação de seu corpo após a morte, sendo possível a submissão do cadáver ao procedimento de criogenia em atenção à vontade manifestada em vida. Preliminarmente, é conveniente frisar que os direitos de personalidade, e entre eles o direito ao cadáver, se orientam pela lógica do Direito Privado, primando pela autonomia dos indivíduos, sempre que esta não violar o ordenamento jurídico. Nesse contexto, a escolha feita pelo particular de submeter seu cadáver ao procedimento da criogenia encontra proteção jurídica, na medida em que sua autonomia é protegida pela lei e não há vedação à escolha por esse procedimento. Ademais, verifica-se que as razões de decidir do tribunal de origem estão embasadas na ausência de manifestação expressa de vontade do genitor das litigantes acerca da submissão de seu corpo ao procedimento de criogenia após a morte. Ocorre que, analisando as regras correlatas dispostas no ordenamento jurídico - que disciplinam diferentes formas de disposição do corpo humano após a morte -, em razão da necessidade de extração da norma jurídica a ser aplicada ao caso concreto, considerando a existência de lacuna normativa, verifica-se que não há exigência de formalidade específica acerca da manifestação de última vontade do indivíduo. Da análise do § 2º do art. 77 da Lei n. 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), extrai-se que, com exceção da hipótese de "morte violenta" - que necessita também de autorização judicial -, os requisitos para a realização da cremação do cadáver são: i) a existência de atestado de óbito assinado por 2 (dois) médicos ou por 1 (um) médico legista; e ii) a anterior manifestação de vontade do indivíduo de ser incinerado após a morte. Dessa maneira, não exigindo a Lei de Registros Públicos forma especial para a manifestação em vida em relação à cremação, será possível aferir a vontade do indivíduo, após o seu falecimento, por outros meios de prova legalmente admitidos. É de se ressaltar que, em casos envolvendo a tutela de direitos da personalidade do indivíduo post mortem (direito ao cadáver), o ordenamento jurídico legitima os familiares mais próximos a atuarem em favor dos interesses deixados pelo de cujus. Logo, na falta de manifestação expressa deixada pelo indivíduo em vida acerca da destinação de seu corpo após a morte, presume-se que sua vontade seja aquela apresentada por seus familiares mais próximos. REsp 1.693.718-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 26/03/2019, DJe 04/04/2019.
Informativo STJ nº645

ICMS. REGIME ESPECIAL DE FISCALIZAÇÃO. CONTRIBUINTE DEVEDOR CONTUMAZ. CREDITAMENTO CONDICIONADO À COMPROVAÇÃO DA ARRECADAÇÃO DO IMPOSTO. POSSIBILIDADE.

O creditamento pelo adquirente em relação ao ICMS destacado nas notas fiscais de compra de mercadorias de contribuinte devedor contumaz, incluído no regime especial de fiscalização, pode ser condicionado à comprovação da arrecadação do imposto. Saliente-se, de início, que o ato do governo local regula um procedimento especial, aplicável não a qualquer contribuinte, mas sim ao contribuinte devedor contumaz, o que é especialmente relevante porque pretende conferir tratamento tributário distinto ao contribuinte devedor reincidente em detrimento daquele que é adimplente. A exigência de que a nota fiscal – emitida pelas empresas submetidas ao regime especial de fiscalização – seja acompanhada pelo comprovante de arrecadação, referente ao crédito de ICMS, significa garantir que o tributo destacado seja pago à vista. Com isso, implementa-se uma vigilância diferenciada a quem reiteradamente cobra o ICMS do consumidor e não repassa o valor cobrado. Não se trata de uma punição a quem é considerado devedor contumaz, mas sim de não lhe conferir um prêmio (pagamento diferido do ICMS e compensação de um crédito ficto, recolhido ou não). Assim, não há que se falar em violação do princípio da não cumulatividade, muito menos aos princípios da proporcionalidade ou razoabilidade. Caso fosse afastada a aplicação do Decreto, o contribuinte submetido ao regime especial de fiscalização, além de não recolher o tributo, geraria um crédito para o comprador da mercadoria. Daí a finalidade desse procedimento especial de evitar que sejam assegurados créditos de ICMS a empresas identificadas como devedoras reincidentes, alertando ao adquirente de mercadorias, fornecidas por esses devedores, que tenha cautela em relação ao creditamento de ICMS que seja ou venha a ser recolhido. Igualmente, por meio desse procedimento, os devedores contumazes autorizam que o Fisco se acautele contra uma prática que transformava a nota fiscal em um artifício de captação de dinheiro nas operações com débito de ICMS a ser gerado, lesando interesses da coletividade. Portanto, não obstante a jurisprudência do STF (em especial, com suporte nas Súmulas n. 70, 323 e 547) tenha rechaçado a aplicação de sanções como interdição de estabelecimento e apreensão de mercadorias como meios indiretos de cobrança de tributos, tal hipótese não é a presente, porque se trata apenas de afastar um prêmio ao devedor contumaz, não havendo que se falar em inconstitucionalidade ou ilegalidade. AREsp 1.241.527-RS, Rel. Min. Francisco Falcão, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 26/03/2019.
Informativo STJ nº645

EXECUÇÃO FISCAL. BUSCA POR BENS PENHORÁVEIS. ACESSO A CADASTRO DE CLIENTES DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (CCS). POSSIBILIDADE.

É legítimo o requerimento do Fisco ao juízo da execução fiscal para acesso ao Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS) como forma de encontrar bens que sejam capazes de satisfazer a execução de crédito público. O Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS) é um sistema de informações de natureza cadastral que tem por objeto os relacionamentos mantidos pelas instituições participantes com os seus correntistas ou clientes com previsão na Circular nº 3.347, de 11 de abril de 2007, do Banco Central do Brasil. O cadastro contém a identificação do cliente e de seus representantes legais e procuradores; as instituições financeiras nas quais o cliente mantém seus ativos ou investimentos; as datas de início e, se houver, de fim de relacionamento. O cadastro, no entanto, não contém dados de valor, de movimentação financeira ou de saldos de contas ou aplicações. Assim, o acesso ao CCS representa uma providência que não se confunde com a penhora de dinheiro mediante BACENJUD, mas que pode servir como subsídio. Nesse sentido, não se mostra razoável a permissão para se deferir medida constritiva por meio de BACENJUD e negar pesquisa exploratória em cadastro meramente informativo – como é o caso do CCS. Se a Lei Processual assegura o fim (determinação de indisponibilidade), dentro da sistemática da busca por bens que sirvam à satisfação do crédito público, também assegura os meios: o credor poderá requerer ao juízo que diligencie, junto ao BACEN, acerca da existência de ativos constantes no referido CCS. REsp 1.464.714-PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. Acd. Min. Benedito Gonçalves, por maioria, julgado em 12/03/2019, DJe 01/04/2019.
Informativo STJ nº645

CONCURSO PÚBLICO. AGENTE PENITENCIÁRIO FEMININO. CURSO DE FORMAÇÃO. CANDIDATA LACTANTE. PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL. REMARCAÇÃO. POSSIBILIDADE.

É constitucional a remarcação de curso de formação para o cargo de agente penitenciário feminino de candidata que esteja lactante à época de sua realização, independentemente da previsão expressa em edital do concurso público. O Supremo Tribunal Federal, sob a sistemática da repercussão geral, nos autos do RE 630.733/DF (DJe 20/11/2013), pacificou o entendimento de que não há direito à remarcação de provas de concurso público em razão de circunstâncias pessoais dos candidatos, exceto se previsto em edital. Ambas as Turmas de Direito Público desta Corte Superior têm acompanhado a orientação firmada na Excelsa Corte. Não obstante, em julgamento realizado em 21/11/2018, também sob a sistemática da repercussão geral, RE 1.058.333/PR, o Supremo Tribunal Federal, entendendo que o RE 630.733/DF não seria aplicável às candidatas gestantes, estabeleceu a seguinte tese: "É constitucional a remarcação do teste de aptidão física de candidata que esteja grávida à época de sua realização, independentemente da previsão expressa em edital do concurso público"Em seu voto, o min. rel. Luiz Fux destacou que "por ter o constituinte estabelecido expressamente a proteção à maternidade, à família e ao planejamento familiar, a condição de gestante goza de proteção constitucional reforçada. Em razão deste amparo constitucional específico, a gravidez não pode causar prejuízo às candidatas, sob pena de malferir os princípios da isonomia e da razoabilidade". Apesar da presente hipótese dos autos analisada não ser exatamente igual à analisada pelo Supremo Tribunal Federal, as premissas estabelecidas no novel julgado são plenamente aplicáveis in casu. Com efeito, a candidata, ao ser convocada para o Curso de Formação para o cargo de Agente penitenciário feminino, encontrava-se em licença maternidade, com apenas um mês de nascimento da sua filha, período em que sabidamente todas as mulheres estão impossibilitadas de praticar atividades físicas, estando totalmente voltadas para amamentação e cuidados com o recém-nascido. Nessa hipótese devem ser observados os direitos destacados em sede de julgamento do RE 1.058.333/PR, constitucionalmente protegidos (saúde, maternidade, família e planejamento familiar), merecendo a candidata lactante o mesmo amparo estabelecido pelo STF para as gestantes. RMS 52.622-MG, Rel. Min. Gurgel de Faria, por unanimidade, julgado em 26/03/2019, DJe 29/03/2019.
Informativo STJ nº645

FURTO DE ENERGIA ELÉTRICA MEDIANTE FRAUDE. PAGAMENTO DO DÉBITO ANTES DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. IMPOSSIBILIDADE. NÃO APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 34 DA LEI N. 9.249/1995.

No caso de furto de energia elétrica mediante fraude, o adimplemento do débito antes do recebimento da denúncia não extingue a punibilidade. Saliente-se que são três os fundamentos para a não aplicação do instituto de extinção de punibilidade ao crime de furto de energia elétrica em razão do adimplemento do débito antes do recebimento da denúncia. Em primeiro lugar, seria diversa a política criminal aplicada aos crimes contra o patrimônio e contra a ordem tributária. O furto de energia elétrica, além de atingir a esfera individual, tem reflexos coletivos e, não obstante seja tratado na prática como conduta sem tanta repercussão, se for analisado sob o aspecto social, ganha conotação mais significativa, ainda mais quando considerada a crise hidroelétrica recentemente vivida em nosso país. A intenção punitiva do Estado nesse contexto deve estar associada à repreensão da conduta que afeta bem tão precioso da humanidade. Desse modo, o papel do Estado , nos casos de furto de energia elétrica, não deve estar adstrito à intenção arrecadatória da tarifa, deve coibir ou prevenir eventual prejuízo ao próprio abastecimento elétrico do país, que ora se reflete na ausência ou queda do serviço público, ora no repasse, ainda que parcial, do prejuízo financeiro ao restante dos cidadãos brasileiros. Em segundo lugar, há impossibilidade de aplicação analógica do art. 34 da Lei n. 9.249/1995 aos crimes contra o patrimônio, porquanto existe previsão legal específica de causa de diminuição da pena para os casos de pagamento da "dívida" antes do recebimento da denúncia (art. 16 do Código Penal). Destarte, ainda que se pudesse observar a existência de lacuna legal, não nos poderíamos valer desse método integrativo, uma vez que é nítida a discrepância da ratio legis entre as situações jurídicas apresentadas, em que uma a satisfação estatal está no pagamento da dívida e a outra no papel preventivo do Estado, que se vê imbuído da proteção a bem jurídico de maior relevância. Por fim, diferentemente do imposto, a tarifa ou preço público tem tratamento legislativo diverso. A jurisprudência se consolidou no sentido de que a natureza jurídica da remuneração pela prestação de serviço público, no caso de fornecimento de energia elétrica, prestado por concessionária, é de tarifa ou preço público, não possuindo caráter tributário. RHC 101.299-RS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Rel. Acd. Min. Joel Ilan Paciornik, por unanimidade, julgado em 13/03/2019, DJe 04/04/2019.
Informativo STJ nº645

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUÍZO DE EQUIDADE. REGRA SUBSIDIÁRIA (ART. 85, § 8º, DO CPC/2015). ESGOTAMENTO DA REGRA GERAL (ART. 85, § 2º, DO CPC/2015). OBRIGATORIEDADE.

O juízo de equidade na fixação dos honorários advocatícios somente pode ser utilizado de forma subsidiária, quando não presente qualquer hipótese prevista no § 2º do art. 85 do CPC. O art. 85 do Código de Processo Civil/2015 estabeleceu no tocante aos honorários advocatícios três importantes vetores interpretativos que buscam conferir à aplicação do novo código maior segurança jurídica e objetividade. Em primeiro lugar, estatuiu que os honorários serão pagos ao advogado do vencedor, ainda que este também litigue em causa própria, pois constituem direito autônomo do profissional, de natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial. Em segundo lugar, reduziu as hipóteses nas quais cabe a fixação dos honorários de sucumbência por equidade para quando for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo (art. 85, § 8º). Percebe-se que o Código de Processo Civil/2015 sinaliza ao intérprete o desejo de objetivar o processo de fixação do quantum da verba honorária. Em terceiro lugar, introduziu autêntica e objetiva "ordem de vocação" para fixação da base de cálculo da verba honorária, na qual a subsunção do caso concreto a uma das hipóteses legais prévias impede o avanço para outra categoria. De fato, a seguinte ordem de preferência, na fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais, é obtida pela conjugação dos §§ 2º e 8º do art. 85 do CPC: (a) primeiro, quando houver condenação, devem ser fixados entre 10% e 20% sobre o montante desta (art. 85, § 2º); (b) segundo, não havendo condenação, serão também fixados entre 10% e 20%, das seguintes bases de cálculo: (b.1) sobre o proveito econômico obtido pelo vencedor (art. 85, § 2º); ou (b.2) não sendo possível mensurar o proveito econômico obtido, sobre o valor atualizado da causa (art. 85, § 2º); (c) havendo ou não condenação, nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou em que o valor da causa for muito baixo, deverão, só então, ser fixados por apreciação equitativa (art; 85, § 8º). A conclusão lógica é a de que o § 2º do art. 85 do CPC/2015 veicula a regra geral e obrigatória, relegado ao § 8º do art. 85 a instituição de regra excepcional, de aplicação subsidiária. Assim, a incidência, pela ordem, de uma das hipóteses do art. 85, § 2º, impede que o julgador prossiga com sua análise a fim de investigar eventual enquadramento no § 8º do mesmo dispositivo, porque a subsunção da norma ao fato já se terá esgotado. REsp 1.746.072-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, Rel. Acd. Min. Raul Araújo, por unanimidade, julgado em 13/02/2019, DJe 29/03/2019.
Informativo STJ nº645

26/04/2019

REVISÃO DE ENTENDIMENTO CONSOLIDADO EM TEMA REPETITIVO. TEMA 291/STJ. PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE A DATA DA REALIZAÇÃO DOS CÁLCULOS E A DA REQUISIÇÃO OU DO PRECATÓRIO. JUROS DE MORA. CABIMENTO. ENTENDIMENTO FIXADO PELO STF, EM REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 96/STF.

Incidem os juros da mora no período compreendido entre a data da realização dos cálculos e a da requisição ou do precatório. Inicialmente cumpre salientar que do julgamento do REsp 1.143.677/RS (rel. min. Luiz Fux, DJe 04/02/2010), este Superior Tribunal de Justiça fixou a tese (Tema Repetitivo 291/STJ) no sentido de que não incidem juros moratórios entre a elaboração dos cálculos e o efetivo pagamento da Requisição de Pequeno Valor - RPV. No entanto, sobreveio o julgamento do Recurso Extraordinário 579.431/RS, sob a relatoria do ministro Marco Aurélio (DJe 30/06/2017), com repercussão geral reconhecida e julgada, tendo sido fixada a tese de que incidem os juros da mora no período compreendido entre a data da realização dos cálculos e a da requisição ou do precatório (Tema 96/STF). De acordo com a orientação fixada pelo STF, o termo inicial dos juros moratórios é a citação, que deverão incidir até a data da requisição ou do precatório. Assim, considerando os princípios da segurança jurídica, da proteção da confiança e da isonomia, nos termos do art. 927, § 4º do CPC/2015, é patente e evidente a necessidade de revisão do entendimento consolidado no enunciado de Tema Repetitivo 291/STJ, a fim de adequá-lo à nova orientação fixada pelo egrégio Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do RE 579.431/RS (Repercussão Geral - Tema 96/STF). QO no REsp 1.665.599-RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, por unanimidade, julgado em 20/03/2019, DJe 02/04/2019.
Informativo STJ nº645

12/04/2019

RECONVENÇÃO. PEDIDO DE NULIDADE DE REGISTROS DE MARCA SOB O MESMO FUNDAMENTO DA DEFESA. POSIÇÃO PROCESSUAL DO INPI. LITISCONSÓRCIO SUI GENERIS. LEGITIMIDADE RECURSAL. AFERIÇÃO PARA CADA ATO.

O INPI possui legitimidade para recorrer de decisão que extinguiu, sem resolução de mérito, reconvenção apresentada por litisconsorte passivo, na qual se veiculou pedido de nulidade de registro de marca. Nos termos do art. 175, caput, da Lei n. 9.279/1996, o INPI deve intervir nas ações anulatórias de registro. A participação do INPI, entretanto, não lhe impõe a defesa do ato concessivo do registro por ele praticado. Ao contrário, o interesse jurídico do INPI se distingue do interesse individual de ambas as partes, tendo por objetivo último a proteção da concorrência e do consumidor, direitos essencialmente transindividuais, o que atrai certo temperamento das regras processuais tradicionais da defesa de direitos individuais. Por essa razão, a legitimidade ad causam do INPI, bem como todas as demais situações processuais, dependerá de exame casuístico e particularizado, não se resolvendo por meio da simples aplicação de conceitos consolidados. Nesse sentido, a doutrina moderna vem ressaltando que a apreciação da legitimidade, embora não se tenha libertado da avaliação inicial in status assertionis, deve também levar em consideração as "zonas de interesse" dos sujeitos litigantes, que ora se contrapõem, ora se coincidem e ora se complementam pela atuação baseada sobretudo num interesse social ou público. Desse modo, para além de uma legitimidade ad causam, verificável ab initio, há que se reconhecer uma legitimidade móvel refletida na prática dos atos processuais adequados e necessários à defesa de sua "zona de interesse". A Terceira Turma do STJ já se posicionou no sentido de que o INPI desempenha função própria, mediante intervenção sui generis, nos processos de anulação de registro de marca. Em face disso, nem sempre se comportará como litisconsorte passivo, devendo a sua legitimidade e os consectários da sua atuação processual tomarem em consideração a função efetivamente exercida no caso concreto. Daí se extrai que, sobrevindo ação anulatória de registro, mesmo que o ente estatal não fosse parte na demanda originária, seria impositiva sua participação, podendo, após sua integração no polo passivo da demanda, reposicionar-se em qualquer um dos polos da reconvenção. Essa imposição de intervenção, além de não inviabilizar, por si só, a utilização do instituto da reconvenção, legitima o INPI a impugnar a sentença que a extingue, com ou sem resolução de mérito, e qualquer que tenha sido o resultado do julgamento, devendo o interesse recursal ser avaliado sob a perspectiva da atuação concreta do INPI ao longo da tramitação da reconvenção. REsp 1.775.812-RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019.
Informativo STJ nº644

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 1.015, I, DO CPC/2015. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE VERSA SOBRE TUTELA PROVISÓRIA PARA FINS DE RECORRIBILIDADE IMEDIATA. ABRANGÊNCIA.

O conceito de "decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória" previsto no art. 1.015, I, do CPC/2015, abrange as decisões que examinam a presença ou não dos pressupostos que justificam o deferimento, indeferimento, revogação ou alteração da tutela provisória e, também, as decisões que dizem respeito ao prazo e ao modo de cumprimento da tutela, a adequação, suficiência, proporcionalidade ou razoabilidade da técnica de efetivação da tutela provisória e, ainda, a necessidade ou dispensa de garantias para a concessão, revogação ou alteração da tutela provisória. O art. 1.015, I, do CPC/2015 ("decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória") deve ser lido e interpretado como uma cláusula de cabimento de amplo espectro, de modo a permitir a recorribilidade imediata das decisões interlocutórias que digam respeito não apenas ao núcleo essencial da tutela provisória, mas também que se refiram aos aspectos acessórios que estão umbilicalmente vinculados a ela, porque, em todas essas situações, há urgência que justifique o imediato reexame da questão em 2º grau de jurisdição. Isso não significa dizer, todavia, que absolutamente toda e qualquer questão relacionada ao cumprimento, operacionalização ou implementação fática da tutela provisória se enquadre no conceito de decisão interlocutória que versa sobre tutela provisória e, consequentemente, possa ser impugnada de imediato pelo agravo de instrumento. Como exemplo: a necessidade de recolhimento de taxas, despesas ou custas para a implementação da medida deferida. Tais providências, não se relacionam, direta e nem mesmo indiretamente, com a tutela provisória objeto da decisão interlocutória impugnável, mas sim, com a execução, operacionalização e implementação fática da providência que já foi requerida e obtida, descabendo discutir, em âmbito de tutela provisória, a questão relacionada ao fato de a parte beneficiária da tutela arcar com as despesas e, ao final, ser ressarcida pelo vencido, inclusive como decorrência lógica da necessidade de plena reintegração que permeia a tutela jurisdicional efetiva. REsp 1.752.049-PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019.
Informativo STJ nº644

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 1.015, VII, DO CPC/2015. PEDIDO DE EXCLUSÃO DE LITISCONSORTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA DE INDEFERIMENTO. IRRECORRIBILIDADE IMEDIATA.

Não cabe agravo de instrumento contra decisão de indeferimento do pedido de exclusão de litisconsorte. O propósito recursal é definir se o conceito de "decisões interlocutórias que versarem sobre exclusão de litisconsorte", previsto no art. 1.015, VII, do CPC/2015, abrange somente a decisão que determina a exclusão do litisconsorte ou se abrange também a decisão que indefere o pedido de exclusão. Inicialmente, destaque-se que o CPC/2015 disciplinou, de modo específico, sobre os vícios de que padecerão as sentenças proferidas sem a integração de um litisconsorte: (i) na hipótese de litisconsórcio necessário e unitário, a sentença é nula (art. 115, I); (ii) na hipótese de litisconsórcio necessário e simples, a sentença será ineficaz em relação aos que não foram citados (art. 115, II); (iii) e, em ambas as situações, o não atendimento da ordem judicial que determina a integração do polo passivo para a inclusão dos litisconsortes necessários faltantes acarretará a extinção do processo (art. 115, parágrafo único). Justamente porque a errônea exclusão de um litisconsorte é capaz de invalidar a sentença de mérito, inclusive porque à parte excluída deveria ser facultada a ampla participação na atividade instrutória, é que se admite que a decisão interlocutória com esse conteúdo seja, desde logo, reexaminada pelo tribunal, antes da sentença. Essa é a razão de existir do art. 1.015, VII, do CPC/2015. Todavia, não se verifica a mesma consequência jurídica quando se examina a decisão interlocutória que rejeita excluir o litisconsorte. A manutenção, no processo, de uma parte alegadamente ilegítima não fulmina a sentença de mérito nele proferida, podendo o tribunal, por ocasião do julgamento do recurso de apelação, reconhecer a ilegitimidade da parte e, então, exclui-la do processo. Por mais que o texto legal seja amplo e genérico – realmente, o conceito de "versar sobre" previsto no art. 1.015, caput, do CPC/2015, é bastante elástico e comporta debate sobre a sua real abrangência – a boa hermenêutica não autoriza que se coloque, na mesma hipótese, questões assentadas em premissas teóricas distintas ou que sejam ontologicamente diferentes. Nesse aspecto, sublinhe-se que ambas as decisões interlocutórias poderão ser reexaminadas pelo tribunal, diferenciando-se o momento em que a parte poderá exercer o direito de recorrer (na exclusão, imediatamente por agravo; na manutenção, posteriormente por apelação), o que é lícito, legítimo e justificável. O regime recursal diferenciado criado pelo legislador na hipótese se assentou em razão de um aspecto objetivo da controvérsia (maior gravidade do ato que exclui o litisconsorte em relação ao ato que o mantém). Ademais, quando quis, o CPC/2015 expressamente estabeleceu o cabimento recursal para a hipótese de acolhimento e de rejeição do requerimento da parte, como se verifica, por exemplo, no art. 1.015, IX, que expressamente prevê a recorribilidade imediata da decisão interlocutória que versar sobre a admissão e também sobre a inadmissão de intervenção de terceiros. REsp 1.724.453-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019.
Informativo STJ nº644

EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRÁFOS - ECT. PRERROGATIVA DE INTIMAÇÃO PESSOAL. INAPLICABILIDADE. SISTEMA PJE. CADASTRO DO ADVOGADO FEITO EM NOME PRÓPRIO. INTIMAÇÃO. VALIDADE.

É valida a intimação da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT realizada na pessoa do advogado cadastrado no sistema PJe. Inicialmente, convém salientar que o art. 12 do Decreto-Lei n. 509/1969 atribui à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) os privilégios concedidos à Fazenda Pública no concernente, dentre outros, a foro, prazos e custas processuais. Nessa linha, o STF firmou o entendimento, a partir do julgamento do RE 220.907/RO (Segunda Turma, julgado em 12/06/2001, DJ de 31/08/2001), no sentido de que a ECT é empresa pública, prestadora de serviço público, que integra o conceito de Fazenda Pública. No entanto, o art. 12 do Decreto-Lei n. 509/69 não faz qualquer referência à prerrogativa de intimação pessoal quando trata dos "privilégios" concedidos à Fazenda Pública estendidos à ECT. Nessa toada, há de ser salientado que a ECT não é representada judicialmente por órgão da Advocacia Pública, a quem a lei determina seja a intimação realizada pessoalmente, por carga, remessa ou meio eletrônico. Ademais, em se tratando de processo eletrônico, prevê o § 6º do art. 5º da Lei n. 11.419/2006 que as intimações feitas na forma do referido artigo, inclusive da Fazenda Pública, serão consideradas pessoais para todos os efeitos legais. É dizer, a intimação por meio eletrônico aos devida e previamente cadastrados – nos termos do art. 2º da mesma lei – é tida como pessoal e se considera realizada no dia em que efetivada a consulta eletrônica ao seu teor ou no dia em que escoado o prazo de 10 dias corridos para fazê-lo. Logo, se o advogado, no momento em que ajuizou a ação, fez o cadastro em nome próprio, não pode, posteriormente, alegar a nulidade da intimação realizada na sua pessoa, e não na da entidade que representa, para se eximir da responsabilidade de acompanhar o andamento do processo, a partir da consulta assídua ao sistema PJe. REsp 1.574.008-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019.
Informativo STJ nº644

PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CRIAÇÃO DE SUBCLASSES. POSSIBILIDADE. PARÂMETROS OBJETIVOS. CREDORES COM INTERESSES HOMOGÊNEOS.

É possível a criação de subclasses entre os credores da recuperação judicial, desde que estabelecido um critério objetivo, justificado no plano de recuperação judicial, abrangendo credores com interesses homogêneos, ficando vedada a anulação de direitos de eventuais credores isolados. A Lei n. 11.101/2005, consagra o princípio da paridade entre credores. Apesar de se tratar de um princípio norteador da falência, momento em que o patrimônio do falido será vendido e o produto utilizado para o pagamento dos credores na ordem estabelecida na lei (realização do ativo para o pagamento do passivo), seus reflexos se irradiam na recuperação judicial, permitindo o controle de legalidade do plano de recuperação sob essa perspectiva. Na recuperação judicial, não há realização do ativo para o pagamento dos credores. Em regra, todos os credores serão pagos. Diante disso, o princípio da paridade se aplica "no que couber", como declara o Enunciado nº 81 da II Jornada de Direito Comercial. Significa dizer que deve haver tratamento igualitário entre os credores, mas que pode ocorrer o estabelecimento de distinções entre integrantes de uma mesma classe com interesses semelhantes. Tal fato se justifica pela constatação de que as classes de credores, especialmente a de quirografários, reúnem credores com interesses bastante heterogêneos: credores financeiros, fornecedores em geral, fornecedores dos quais depende a continuidade da atividade econômica, credores eventuais, créditos com privilégio geral, entre outros. Nesse contexto, a divisão em subclasses deve se pautar pelo estabelecimento de um critério objetivo, abrangendo credores com interesses homogêneos, com a clara justificativa de sua adoção no plano de recuperação. Essa providência busca garantir a lisura na votação do plano, afastando a possibilidade de que a recuperanda direcione a votação com a estipulação de privilégios em favor de credores suficientes para a aprovação do plano, dissociados da finalidade da recuperação judicial. Vale lembrar, no ponto, que a recuperação judicial busca a negociação coletiva e não individual, reunindo os credores para tentar a superação das dificuldades econômicas da empresa. Outro ponto que deve ser objeto de atenção é evitar que credores isolados, com realidades específicas, tenham seu direito de crédito anulado com a criação de subclasses. REsp 1.634.844-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019.
Informativo STJ nº644

ESPETÁCULOS CULTURAIS. AQUISIÇÃO DE INGRESSOS NA INTERNET. COBRANÇA DE TAXA DE CONVENIÊNCIA. VENDA CASADA INDIRETA. PRÁTICA ABUSIVA. CONFIGURAÇÃO.

É abusiva a venda de ingressos em meio virtual (internet) vinculada a uma única intermediadora e mediante o pagamento de taxa de conveniência. Salienta-se preliminarmente que a venda casada "às avessas", indireta ou dissimulada consiste em se admitir uma conduta de consumo intimamente relacionada a um produto ou serviço, mas cujo exercício, é restringido à única opção oferecida pelo próprio fornecedor, limitando, assim, a liberdade de escolha do consumidor. A venda pela internet, que alcança interessados em número infinitamente superior do que a venda por meio presencial, privilegia os interesses dos produtores e promotores do espetáculo cultural de terem, no menor prazo possível, vendidos os espaços destinados ao público e realizado o retorno dos investimentos até então empregados. Ademais, a fim de preservar a boa-fé e a liberdade contratual dos consumidores, os produtores e promotores do espetáculo cultural, ao optarem por submeter os ingressos à venda terceirizada em meio virtual (da internet), devem oferecer ao consumidor diversas opções de compra em diversos sítios eletrônicos, caso contrário, a liberdade dos consumidores de escolha da intermediadora da compra é cerceada, de modo a ficar configurada a venda casada, ainda que em sua modalidade indireta ou "às avessas", nos termos do art. 39, I e IX, do CDC. Além disso, é fictícia a liberdade do consumidor em optar pela aquisição virtual ou pela presencial, ante a uma acentuada diferença de benefícios entre essas duas opções: ou o consumidor adquire seu ingresso por meio virtual e se submete à cobrança da taxa, tendo ainda que pagar uma nova taxa para receber o ingresso em seu domicílio; ou, a despeito de residir ou não na cidade em que será realizado o espetáculo cultural, adquire o ingresso de forma presencial, correndo o risco de que todos os ingressos já tenham sido vendidos em meio virtual, enfrentando filas e deslocamentos. Assim, não fosse a restrição da liberdade contratual bastante para macular a validade da cobrança da taxa de conveniência, por violação da boa-fé objetiva, esses fatores adicionais agora enumerados também têm o condão de modificar substancialmente o cálculo da proporcionalidade das prestações envolvidas no contrato, não sendo mais possível vislumbrar o equilíbrio pretendido pelas partes no momento da contratação ou eventual vantagem ao consumidor com o oferecimento conjunto dos serviços. Por fim, o serviço de intermediação apresenta mais uma peculiaridade: a de que não há declaração clara e destacada de que o consumidor está assumindo um débito que é de responsabilidade do incumbente – produtor ou promotor do espetáculo cultural – não se podendo, nesses termos, reconhecer a validade da transferência do encargo (assunção de dívida pelo consumidor). Verifica-se, portanto, da soma desses fatores, o desequilíbrio do "contrato, tornando-o desvantajoso ao consumidor enquanto confere vantagem sem correspectivo (sem "sinalagma", do grego, câmbio) ao fornecedor", o que também acaba por vulnerar o princípio da vedação à lesão enorme, previsto nos arts. 39, V, e 51, IV, do CDC. Desse modo, deve ser reconhecida a abusividade da prática da venda casada imposta ao consumidor em prestação manifestamente desproporcional, devendo ser admitido que a remuneração da intermediadora da venda, mediante a taxa de conveniência, deveria ser de responsabilidade das promotores e produtores de espetáculos culturais, verdadeiros beneficiários do modelo de negócio escolhido. REsp 1.737.428-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, por maioria, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019.
Informativo STJ nº644

PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE HOTELARIA. PERÍODO DA DIÁRIA (24 HORAS). LEI N. 11.771/2008 E DECRETO N. 3.781/2010. HORÁRIOS DIVERSOS DE CHECK-IN E CHECK-OUT. LEGALIDADE.

Não é abusiva a cobrança de uma diária completa de 24 horas em hotéis que adotam a prática de check-in às 15:00h e de check-out às 12:00h do dia de término da hospedagem. Inicialmente cumpre salientar que a interpretação literal do enunciado normativo do § 4º do art. 23 da Lei n. 11.771/2008 (Lei Nacional de Turismo), ou mesmo do art. 25 do Decreto n. 7.380/2010, conduziria à conclusão de que a diária de um hotel ou qualquer outro estabelecimento congênere de hospedagem em unidades mobiliadas consubstancia período de 24 horas entre a entrada e saída do hóspede. Contudo, uma interpretação razoável tem em conta, notadamente, a boa-fé do fornecedor, a razoabilidade no estabelecimento de um período de tolerância para a entrada do novo hóspede no apartamento por ele reservado e os usos e costumes do serviço prestado ao mercado consumidor. Natural a previsão pelo estabelecimento hoteleiro, para permitir a organização de sua atividade e prestação de serviços com a qualidade esperada pelo mercado consumidor, de um período entre o check-out do anterior ocupante da unidade habitacional e o check-in do próximo hóspede, inexistindo ilegalidade ou abusividade a ser objeto de controle pelo Poder Judiciário. Ademais, a prática comercial do horário de check-in não constitui propriamente um termo inicial do contrato de hospedagem, mas uma prévia advertência de que o quarto poderá não estar disponível ao hóspede antes de determinado horário. Assim, a fixação de horários diversos de check-in (15:00hs) e check-out (12:00hs) atende a interesses legítimos do consumidor e do prestador dos serviços de hospedagem, espelhando antiga prática amplamente aceita dentro e fora do Brasil. REsp 1.717.111-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, julgado em 12/03/2019, DJe 15/03/2019.
Informativo STJ nº644

CONTRATO DE CONSÓRCIO. SEGURO PRESTAMISTA CONTRATADO. FALECIMENTO DE CONSORCIADO. LIBERAÇÃO IMEDIATA DA CARTA DE CRÉDITO À BENEFICIÁRIA.

A beneficiária do consorciado falecido tem direito à liberação imediata da carta de crédito, em razão da quitação do saldo devedor pelo seguro prestamista contratado, independentemente da efetiva contemplação ou do encerramento do grupo. O contrato de consórcio é instrumento que, firmado pelo consorciado e pela administradora, cria vínculo jurídico obrigacional entre as partes e pelo qual o consorciado formaliza o seu ingresso em grupo de consórcio, estando nele expressas as condições da operação. Em certas hipóteses, há a previsão adicional de contratação de seguro com cobertura para o evento morte, denominado seguro prestamista, como garantia à própria família do consorciado segurado. É certo que a Lei n. 11.795/2008, embora disponha sobre o sistema de consórcio, não trouxe previsão específica acerca da situação de falecimento do consorciado que aderiu ao pacto prestamista, tampouco da possibilidade de o(s) beneficiário(s) fazer(em) jus ao recebimento da carta de crédito quando da ocorrência de fatídico evento. Vale frisar que a referida lei delegou ao Banco Central do Brasil – órgão regulador e fiscalizador das operações do segmento – a competência para disciplinar normas suplementares. Ocorre que, quanto a tal situação específica, tampouco houve qualquer normatização por parte do BACEN. Para solucionar a celeuma, indispensável, portanto, que se averigue a dimensão social do consórcio à luz da cláusula geral da função social do contrato, conciliando-se o bem comum pretendido – qual seja, a aquisição de bens ou serviços por todos os consorciados – e a dignidade de cada integrante do núcleo de obrigações financeiras (perante o grupo consorcial) absorvidas pela própria seguradora, quando do adimplemento do saldo devedor remanescente. Com efeito, e amparando-se na própria função social do contrato, se existe previsão contratual de seguro prestamista vinculado ao contrato de consórcio, não há lógica em se exigir que o beneficiário aguarde a contemplação do consorciado falecido ou o encerramento do grupo para o recebimento da carta de crédito, uma vez que houve a liquidação antecipada da dívida (saldo devedor) pela seguradora, não importando em qualquer desequilíbrio econômico-financeiro ao grupo consorcial. Ressalte-se que estaria configurado o próprio enriquecimento sem causa a disponibilização de todo o valor da cota do falecido ao grupo consorcial, sem a devida contraprestação por parte deste. REsp 1.770.358-SE, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019.
Informativo STJ nº644

ACIDENTE DE TRÂNSITO. CONDUÇÃO DE MOTOCICLETA SOB ESTADO DE EMBRIAGUEZ. PRESUNÇÃO DE CULPABILIDADE DO INFRATOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONFIGURAÇÃO. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. CABIMENTO.

Em ação destinada a apurar a responsabilidade civil decorrente de acidente de trânsito, presume-se culpado o condutor de veículo automotor que se encontra em estado de embriaguez, cabendo-lhe o ônus de comprovar a ocorrência de alguma excludente do nexo de causalidade. Inicialmente, consigna-se que as responsabilidades administrativa e criminal, autônomas entre si, não se confundem com a responsabilidade civil advinda de acidente de trânsito. Porém, é inegável que a inobservância de regra administrativa de trânsito ou a prática de crime de trânsito pode repercutir na responsabilização civil, na medida em que a correlata conduta evidencia um comportamento absolutamente vedado pelo ordenamento jurídico, contrário às regras impostas. Efetivamente, a inobservância das normas de trânsito pode repercutir na responsabilização civil do infrator, a caracterizar a sua culpa presumida se tal comportamento representar, objetivamente, o comprometimento da segurança do trânsito na produção do evento danoso em exame. É preciso ressalvar que não é todo e qualquer comportamento contrário às normas de trânsito que repercute na apuração da responsabilidade civil. A caracterização da culpa presumida se dá quando o comportamento se revela idôneo a causar o acidente no caso concreto, hipótese em que, diante da inversão do ônus probatório operado, caberá ao transgressor comprovar a ocorrência de alguma excludente do nexo de causalidade, tal como a culpa ou fato exclusivo da vítima, a culpa ou fato exclusivo de terceiro, o caso fortuito ou a força maior. Assim, é indiscutível que a condução de veículo em estado de embriaguez, por si, representa gravíssimo descumprimento do dever de cuidado e de segurança no trânsito, na medida em que o consumo de álcool compromete as faculdades psicomotoras, com significativa diminuição dos reflexos; enseja a perda de autocrítica, o que faz com que o condutor subestime os riscos ou os ignore completamente; promove alterações na percepção da realidade; enseja déficit de atenção; afeta os processos sensoriais; prejudica o julgamento e o tempo das tomadas de decisão; entre outros efeitos que inviabilizam a condução de veículo automotor de forma segura, trazendo riscos, não apenas a si, mas, também aos demais agentes que atuam no trânsito, notadamente aos pedestres, que, por determinação legal (§ 2º do art. 29 do CTB), merecem maior proteção e cuidado dos demais. REsp 1.749.954-RO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 26/02/2019, DJe 15/03/2019.
Informativo STJ nº644

RESPONSABILIDADE CIVIL DE ADVOGADO. ATO PRATICADO EXCLUSIVAMENTE PELO SUBSTABELECIDO. RESPONSABILIDADE DO SUBSTABELECENTE. CULPA IN ELIGENDO. INEXISTÊNCIA. NECESSIDADE DE CIRCUNSTÂNCIA CONTEMPORÂNEA À ESCOLHA E DE CONHECIMENTO DO SUBSTABELECENTE.

O advogado substabelecente somente irá responder por ato ilícito cometido pelo advogado substabelecido se ficar evidenciado que, no momento da escolha, a despeito de possuir inequívoca ciência acerca da inidoneidade do aludido causídico, ainda assim o elegeu para o desempenho do mandato. Cinge-se a controvérsia a definir se o advogado substabelecente (mantidos os seus poderes) responsabiliza-se solidariamente pelos prejuízos causados a cliente por ato ilícito praticado unicamente pela causídica substabelecida, que deixou de lhe repassar os valores recebidos em razão de acordo, por ela subscrito, realizado entre as partes, o qual pôs fim à demanda. Dos termos do § 2º do art. 667 do Código Civil, ressai que, em regra, na hipótese de haver autorização para substabelecer, o mandatário não responde pelos atos praticados pelo substabelecido que venham causar danos ao mandante, salvo se for comprovada a sua culpa in eligendo, que se dá no caso de o mandatário proceder a uma má escolha do substabelecido, recaindo sobre pessoa que não possui capacidade legal (geral ou específica), condição técnica ou idoneidade para desempenhar os poderes a ela transferidos. A culpa in eligendo resta configurada, ainda, se o substabelecente negligenciar orientações ou conferir instruções deficientes ao substabelecido, subtraindo-lhe as condições necessárias para o bom desempenho do mandato. De suma relevância anotar que, para o reconhecimento da culpa in eligendo do substabelecente, é indispensável que este, no momento da escolha, tenha inequívoca ciência a respeito da ausência de capacidade legal, de condição técnica ou de idoneidade do substabelecido para o exercício do mandato. Ademais, não se olvida que o substabelecimento, em especial o com reserva de poderes, evidencia, naturalmente, a existência, entre as partes envolvidas (substabelecente e substabelecido), de uma relação calcada, minimamente, na confiança. Todavia, essa relação prévia, por si, não é suficiente para vincular o substabelecente, a ponto de responsabilizá-lo por atos praticados pelo substabelecido que venham a desbordar dos poderes transferidos, a revelar sua inaptidão para o exercício do mandato. Entendimento contrário redundaria, por óbvio, em todos os casos, na responsabilidade solidária entre mandatário e substabelecido pelos atos perpetrados por esse último, imputação objetiva que não encontra nenhum amparo legal. REsp 1.742.246-ES, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 19/03/2019, DJe 22/03/2019.
Informativo STJ nº644