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23/11/2018

TRÁFICO DE ENTORPECENTES. CONDENAÇÃO ANTERIOR PELO DELITO DO ARTIGO 28 DA LEI DE DROGAS. CARACTERIZAÇÃO DA REINCIDÊNCIA. DESPROPORCIONALIDADE.

Condenações anteriores pelo delito do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 não são aptas a gerar reincidência. Inicialmente cumpre salientar que consoante o posicionamento firmado pela Suprema Corte, na questão de ordem no RE 430.105/RJ, sabe-se que a conduta de porte de substância entorpecente para consumo próprio, prevista no art. 28 da Lei n. 11.343/2006, foi apenas despenalizada mas não descriminalizada, em outras palavras, não houve abolitio criminis. Contudo, ainda que a conduta tipificada no art. 28 da Lei n. 11.343/2006 tenha sido despenalizada e não descriminalizada, essa conduta é punida apenas com "advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo". Além disso, não existe a possibilidade de converter essas penas em privativas de liberdade em caso de descumprimento. Cabe ressaltar que as condenações anteriores por contravenções penais não são aptas a gerar reincidência, tendo em vista o que dispõe o art. 63 do Código Penal, que apenas se refere a crimes anteriores. E, se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, mostra-se desproporcional o delito do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade. Ademais, a Sexta Turma deste Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n. 1.672.654/SP, da relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 21/8/2018, proferiu julgado nesse mesmo sentido.
HC 453.437-SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, por unanimidade, julgado em 04/10/2018, DJe 15/10/2018.

CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE EXAMINA COMPETÊNCIA. DÚVIDA RAZOÁVEL SOBRE O CABIMENTO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. CABIMENTO.

Na vigência do novo Código de Processo Civil, é possível a impetração de mandado de segurança, em caso de dúvida razoável sobre o cabimento de agravo de instrumento, contra decisão interlocutória que examina competência. No caso em apreço, o mandado de segurança foi impetrado contra ato judicial que afastou a competência das Varas de Fazenda Pública para processar e julgar a ação de usucapião, por entender não ter sido comprovado que o imóvel situa-se em área de terras públicas a ensejar interesse do Estado. Cumpre salientar que o mandado de segurança é ação constitucional voltada para a proteção de direito líquido e certo contra ato abusivo ou ilegal de autoridade pública ou de agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público (CF, art. 5º, LXIX), não podendo, em regra, ser utilizado como sucedâneo recursal. É certo que a doutrina e a jurisprudência majoritárias admitem o manejo do mandado de segurança contra ato judicial, pelo menos em relação às seguintes hipóteses excepcionais: a) decisão judicial teratológica; b) decisão judicial contra a qual não caiba recurso; c) para imprimir efeito suspensivo a recurso desprovido de tal efeito; e d) quando impetrado por terceiro prejudicado por decisão judicial. Importa salientar, todavia, que há dúvida razoável acerca da existência de recurso cabível, considerando que até mesmo no âmbito desta Corte de Justiça há entendimentos divergentes quanto ao cabimento de agravo de instrumento, na vigência do Código de Processo Civil de 2015, contra decisão interlocutória que examina competência. Além disso, o referido tema está afetado para julgamento pela Corte Especial como recurso especial representativo de controvérsia. Assim, entende-se adequada a impetração do mandamus contra o ato judicial que afastou a competência das Varas de Fazenda Pública para processar e julgar a ação de usucapião.

RMS 58.578-SP, Rel. Min. Raul Araújo, por unanimidade, julgado em 18/10/2018, DJe 25/10/2018.

AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. BANCO. LEGITIMIDADE. PREVENÇÃO DE DANOS INDEVIDOS AO CONSUMIDOR. QUITAÇÃO DE DÉBITO PARA CANCELAMENTO DE PROTESTO DE CLIENTE ENSEJADO POR FORTUITO INTERNO. VIABILIDADE.

A instituição financeira possui legitimidade para ajuizar ação de consignação em pagamento visando quitar débito de cliente decorrente de título de crédito protestado por falha no serviço bancário. A questão controvertida consiste em definir se o banco, com o intuito de prevenir ou reparar dano a seu cliente, ante a possibilidade de ter sido adulterado cheque em razão de falha no serviço bancário, tem legitimidade para propor ação de consignação em pagamento visando quitar o débito referente a título apontado a protesto e evitar que venha a responder futura demanda indenizatória. Inicialmente, o procedimento da consignação em pagamento existe para atender as peculiaridades do direito material, cabendo às regras processuais regulamentar tão somente o iter para o reconhecimento judicial da eficácia liberatória do pagamento especial, constituindo o depósito em consignação modo de extinção da obrigação, com força de pagamento. Ressalvadas as obrigações infungíveis ou personalíssimas, que somente o devedor pode cumprir, como há interesse social no adimplemento das obrigações, o direito admite que um terceiro venha a pagar a dívida, não se vislumbrando prejuízo algum para o credor que recebe o pagamento de pessoa diversa do devedor, contanto que seu interesse seja atendido. O Código Civil, porém, distingue a disciplina aplicável conforme o terceiro possua ou não interesse jurídico no pagamento (arts. 304 a 306 do CC). Conforme leciona a abalizada doutrina, o credor só poderia recusar o pagamento de terceiro não interessado em três hipóteses: (a) caso exista no contrato expressa declaração proibitiva ao cumprimento da obrigação por terceiro; (b) na hipótese de tal cumprimento poder lhe causar prejuízo; e (c) na situação em que a obrigação, por sua natureza, somente possa ser cumprida pelo devedor. Na hipótese, é nítido que o banco autor da ação tem interesse jurídico, já que tem o dever de não causar danos à consumidora, reconhecendo haver verossimilhança na afirmação de sua cliente acerca de extravio do talonário e de sua falha na devolução do cheque por inexistência de fundos, o que propiciou o protesto. Assim, é patente a idoneidade do instrumento processual utilizado.
REsp 1.318.747-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 04/10/2018, DJe 31/10/2018.

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ART. 523 DO CPC/2015. OBRIGAÇÃO DE PAGAR QUANTIA CERTA. INADIMPLEMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. VALOR DA DÍVIDA. NÃO INCLUSÃO DA MULTA DE DEZ POR CENTO.

A multa de 10% (dez por cento) prevista pelo art. 523, § 1º, do CPC/2015 não integra a base de cálculo dos honorários advocatícios. Inicialmente, salienta-se que de acordo com o § 1º do art. 85 do CPC/2015, são devidos honorários advocatícios no cumprimento provisório ou definitivo de sentença, caso não haja o adimplemento do valor estabelecido no referido título executivo judicial dentro do prazo previsto em lei. Eis, aqui, a aplicação do princípio da causalidade, o qual impõe ao devedor o pagamento da verba honorária em virtude da resistência à satisfação do crédito, acarretando, por conseguinte, a necessidade de postular a execução forçada. Para deflagrar o cumprimento de sentença, exige-se o requerimento expresso formulado pelo credor. Ocorrendo a intimação do executado, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para a satisfação do comando sentencial, após o qual o débito será acrescido de multa e de honorários advocatícios no importe de 10% (dez por cento), totalizando, portanto, o aumento de 20% (vinte por cento). Nesse contexto, a base de cálculo da multa e da verba honorária é o valor do crédito perseguido na execução da sentença. Ou seja, calcula-se a multa sobre o montante executado e, em seguida, procede-se da mesma forma com os honorários devidos ao advogado. Portanto, a base de cálculo da multa e dos honorários advocatícios é a mesma, ou seja, ambos incidem sobre o débito. Por sua vez, a expressão "débito", presente no caput do art. 523 do CPC/2015, compreende o valor que o credor busca no cumprimento da sentença, acrescido, se houver, das custas processuais referentes à instauração da fase executiva, sem incluir a multa de 10% (dez por cento) pelo descumprimento da obrigação no prazo legal (art. 523, § 1º, do CPC/2015).
REsp 1.757.033-DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 09/10/2018, DJe 15/10/2018.

CPC/2015. AUTOS FÍSICOS. LITISCONSÓRCIO. PROCURADORES DISTINTOS. SUCUMBÊNCIA DE APENAS UM DOS LITISCONSORTES. PRAZO EM DOBRO. INAPLICABILIDADE. SÚMULA N. 641/STF. PRESERVAÇÃO.

É inaplicável a contagem do prazo recursal em dobro quando apenas um dos litisconsortes com procuradores distintos sucumbe em processo com autos físicos na vigência do CPC/2015. Regitre-se, inicialmente, que a razão da norma que amplia o prazo comum diz respeito à paridade de armas no processo, considerando a inevitável dificuldade de acesso aos autos físicos para o pleno exercício do direito de defesa, ante o interesse comum de litisconsortes com diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, recorrerem da decisão que, em alguma medida, lhes é desfavorável. O fundamento para a excepcional contagem diferenciada do prazo no novo código segue a inteligência da Súmula n. 641/STF e a jurisprudência sedimentada sobre a matéria no código revogado. Nessa linha, a doutrina assinala que "para que exista direito ao prazo em dobro, há que se observarem dois requisitos cumulativos: existência de litisconsórcio e de prazo comum para os litisconsortes praticarem o ato processual. Se, por qualquer razão, não há prazo comum, mas exclusivo para apenas um dos litisconsortes, não há que se cogitar de prazo em dobro. Dessa forma, a razão da norma permanece idêntica, a de garantir acesso aos autos oportunizando a obtenção da tutela recursal que lhe pareça mais favorável. Tanto é assim que o CPC/2015 dispõe não se computar prazo diferenciado quando os autos do processo forem eletrônicos, permitindo aos litigantes amplo e irrestrito acesso aos autos. Daí porque se não houver sucumbência do litisconsorte, igualmente, não há se falar em prazo em dobro para recorrer. Assim, a inteligência da Súmula n. 641/STF resta preservada em relação aos recursos interpostos sob a vigência do CPC/2015.
REsp 1.709.562-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 16/10/2018, DJe 18/10/2018.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. GASTOS EXTRAPROCESSUAIS. CÁLCULO DAS DESPESAS PROCESSUAIS. ART. 20 DO CPC/1973. NÃO INCLUSÃO.

Os honorários advocatícios contratuais não se incluem nas despesas processuais do art. 20 do CPC/1973. Destaca-se, inicialmente, que o art. 20 do CPC/1973, ao tratar do custo do processo, imputou ao vencido, com base nos princípios da causalidade e da sucumbência, a responsabilidade final pelo pagamento dos gastos endoprocessuais, ou seja, aqueles necessários à formação, desenvolvimento e extinção do processo. Os gastos extraprocessuais – aqueles realizados fora do processo –, ainda que assumidos em razão dele, não se incluem dentre aquelas despesas às quais faz alusão o art. 20 do CPC/1973, motivo pelo qual nelas não estão contidos os honorários contratuais, convencionados entre o advogado e o seu cliente, mesmo quando este vence a demanda. Assim, os honorários advocatícios contratuais não se incluem na rubrica despesas processuais do art. 20 do CPC/1973, cabendo, pois, ao advogado buscar a via judicial adequada para exercer a sua pretensão de cobrança das respectivas verbas.

REsp 1.571.818-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 09/10/2018, DJe 15/10/2018.

MULTA POR DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INERENTES AO PODER FAMILIAR. ART. 249 DO ECA. EXCLUSÃO DA MULTA. IMPOSSIBILIDADE COM FUNDAMENTO NA HIPOSSUFICIÊNCIA FINANCEIRA OU VULNERABILIDADE FAMILIAR.

A hipossuficiência financeira ou a vulnerabilidade famíliar não é suficiente para afastar a multa pecuniária prevista no art. 249 do ECA. Cumpre ressaltar, inicialmente, que a sanção prevista no art. 249 do ECA, segundo a qual quem descumprir os deveres inerentes ao poder familiar está sujeito a multa, guarda indissociável relação com o rol de medidas preventivas, pedagógicas, educativas e sancionadoras previsto no art. 129 do mesmo estatuto, de modo que o julgador está autorizado a sopesá-las no momento em que impõe sanções aos pais, sempre em busca daquela que se revele potencialmente mais adequada e eficaz na hipótese concreta. Nesse contexto, é correto afirmar que a sanção pecuniária prevista no art. 249 do ECA, embora topologicamente distante do art. 129 do mesmo estatuto, igualmente compõe aquele mesmo rol, tratando-se de medida que, a despeito de seu cunho essencialmente sancionatório, igualmente possui caráter preventivo, coercitivo e disciplinador, buscando-se ainda que tais condutas não mais se repitam a bem dos filhos. Por esse motivo, é admissível que, em decisão fundamentada, o julgador adote, dentre as inúmeras possibilidades existentes no microssistema, aquelas que reputar como as medidas mais adequadas e as mais eficazes para cada situação específica, podendo deixar, inclusive, de aplicar a multa do art. 249 do ECA. A situação econômica, todavia, não deve parametrizar o exame da própria adequação da providência determinada, questão que melhor se amolda é ideia de que seja a medida efetivamente preventiva e inibidora da repetição das condutas censuradas. Daí porque, embora se reconheça que a regra do art. 249 do ECA não possui incidência e aplicabilidade absoluta, podendo ser sopesada com as demais medidas previstas no art. 129 do mesmo estatuto, é preciso concluir que a simples exclusão da multa não é a providência mais adequada.
REsp 1.658.508-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 23/10/2018, DJe 26/10/2018.

INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. MULTA COMINATÓRIA FIXADA EM DEMANDA PRETÉRITA. DESCUMPRIMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE.

É cabível o pedido de indenização por danos morais em razão de descumprimento de ordem judicial em demanda pretérita envolvendo as mesmas partes, na qual foi fixada multa cominatória. Inicialmente, cumpre salientar que a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a inscrição indevida em cadastro de inadimplentes gera dano moral passível de indenização, salvo constatada a existência de outras anotações preexistentes àquela que deu origem a ação reparatória (Súmula 385/STJ). Na hipótese, o Magistrado de primeiro grau julgou procedente pedido de indenização, tendo em vista a manutenção da negativação do nome da autora em cadastro de proteção ao crédito mesmo após determinação judicial de retirada, proferida em processo distinto no qual foi fixada multa cominatória. A referida indenização visa a reparar o abalo moral sofrido em decorrência da verdadeira agressão ou atentado contra dignidade da pessoa humana. A multa cominatória, por outro lado, tem cabimento nas hipóteses de descumprimento de ordens judiciais, sendo fixada justamente com o objetivo de compelir a parte ao cumprimento daquela obrigação. Encontra justificativa no princípio da efetividade da tutela jurisdicional e na necessidade de se assegurar o pronto cumprimento das decisões judiciais cominatórias. Verifica-se, portanto, que os institutos em questão têm natureza jurídica e finalidades distintas. A multa tem finalidade exclusivamente coercitiva e a indenização por danos morais tem caráter reparatório de cunho eminentemente compensatório, portanto, perfeitamente cumuláveis. 
REsp 1.689.074-RS, Rel. Min. Moura Ribeiro, por unanimidade, julgado em 16/10/2018, DJe 18/10/2018.

AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. CONTRATO DE AGÊNCIA. PROMOÇÃO DE VENDA DE QUOTAS DE CONSÓRCIO. ADMINISTRAÇÃO DE BENS DE TERCEIROS. APURAÇÃO UNILATERAL DA REMUNERAÇÃO. POSSE DE DOCUMENTOS RELEVANTES. DEVER DE PRESTAR CONTAS.

É cabível a propositura de ação de prestação de contas para apuração de eventual saldo, e sua posterior execução, decorrente de contrato relacional firmado entre administradora de consórcios e empresa responsável pela oferta das quotas consorciais a consumidores. De início, cumpre salientar que o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da utilização da ação de prestação de contas se orientou conforme a identificação da existência de uma relação de direito material consubstanciada em administração de interesses de terceiros. Com efeito, a natureza jurídica da relação de direito material encontra-se presente na ratio decidendi no enunciado n. 259/STJ ("a ação de prestação de contas pode ser proposta pelo titular de conta-corrente bancária"), bem como, na via reversa, serviu de fundamento central para o afastamento do interesse de agir de clientes bancários para discutir relações de mútuo feneratício. Isso porque a ação de prestação de contas possui rito especial, muito mais célere e simplificado, no intuito de obter o rápido acertamento de lançamentos havidos a crédito ou a débito para, ao final, declarar a existência de saldo em favor de uma das partes. E essa maior celeridade somente se justifica em razão da existência de uma relação jurídica, na qual as partes reconhecem a transferência da administração de seus bens ou interesses a outrem. Ao aceitar o encargo de administrar interesses jurídicos de terceiros, nasce também, por decorrência lógica, o dever de prestar ao titular do direito todas as informações necessárias a respeito da administração, especialmente aquelas que se referem a pagamentos e recebimentos realizados em seu nome e que demonstram o efetivo resultado da administração realizada. No caso em análise, o vínculo entre as partes litigantes é típico contrato de agência, regulado pelos arts. 710 e seguintes do CC/2002, por meio do qual a promotora das vendas se obriga a disponibilizar ao consumidor a aquisição de quotas consorciais, mediante remuneração, recolhendo propostas e transmitindo-as a administradora do consórcio (contratante). Dessa forma, é evidente o dever de prestação de contas, sendo corolário lógico o reconhecimento da legitimidade ativa e passiva das partes contratantes.

REsp 1.676.623-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 23/10/2018, DJe 26/10/2018.

AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. CORRETORA DE CRIPTOMOEDAS. RESCISÃO UNILATERAL DO CONTRATO DE CONTA-CORRENTE. PRÉVIA E REGULAR NOTIFICAÇÃO REALIZADA PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INEXISTÊNCIA DE PRÁTICA COMERCIAL ABUSIVA OU EXERCÍCIO ABUSIVO DO DIREITO.

O encerramento de conta-corrente usada na comercialização de criptomoedas, observada a prévia e regular notificação, não configura prática comercial abusiva ou exercício abusivo do direito. Diante da inegável repercussão nas novas relações jurídicas advindas do uso e da circulação das moedas digitais, notadamente a bitcoin, especializada doutrina passou a dela tratar, ressaltando, entre as suas características, a desnecessidade de um terceiro intermediário para a realização de transações e a ausência de autoridade estatal reguladora. Ressai evidenciado, portanto, que o serviço bancário de conta-corrente oferecido pelas instituições financeiras em nada repercute na circulação ou na utilização das moedas virtuais, que, como visto, não dependem de intermediários, possibilitando a operação comercial e/ou financeira direta entre o transmissor e o receptor da moeda digital. Nesse contexto, tem-se, a toda evidência, que a utilização de serviços bancários, especificamente o de abertura de conta-corrente, dá-se com o claro propósito de incrementar sua atividade produtiva de intermediação, não se caracterizando, pois, como relação jurídica de consumo — mas sim de insumo —, a obstar a aplicação das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor. Por consectário, o encerramento de conta-corrente, antecedido de regular notificação, não constitui prática abusiva comercial, na esteira da legislação consumerista. Ademais, destaca-se que a Lei n. 4.595/1964, recepcionada pela Constituição Federal de 1988 com status de lei complementar e regente do Sistema Financeiro Nacional, atribui ao Conselho Monetário Nacional competência exclusiva para regular o funcionamento das instituições financeiras (art. 4º, VIII). E, no exercício dessa competência, o Conselho Monetário Nacional, por meio da edição de resoluções do Banco Central do Brasil que se seguiram, destinadas a regulamentar a atividade bancária, expressamente possibilitou o encerramento do contrato de conta de depósitos, por iniciativa de qualquer das partes contratantes, desde que observada a comunicação prévia. Nessa linha de entendimento, atendo-se à natureza do contrato bancário, notadamente o de conta-corrente, o qual se afigura intuitu personae, bilateral, oneroso, de execução continuada, prorrogando-se no tempo por prazo indeterminado, não se impõe às instituições financeiras a obrigação de contratar ou de manter em vigor específica contratação, a elas não se aplicando o art. 39, II e IX, do Código de Defesa do Consumidor. Nessa medida, longe de encerrar abusividade, tem-se por legítima, sob o aspecto institucional, a recusa da instituição financeira em manter o contrato de conta-corrente, utilizado como insumo, no desenvolvimento da atividade empresarial de intermediação de compra e venda de moeda virtual, a qual não conta com nenhuma regulação do Conselho Monetário Nacional. De igual modo, sob o aspecto mercadológico, também se afigura lídima a recusa em manter a contratação, se sua atividade empresarial se apresenta, no mercado financeiro, como concorrente direta e produz impacto no faturamento da instituição financeira. Dessa maneira, o proceder levado a efeito pela instituição financeira não configura exercício abusivo do direito.
REsp 1.696.214-SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por maioria, julgado em 09/10/2018, DJe 16/10/2018.

ARROLAMENTO SUMÁRIO. ART. 659, § 2º, DO CPC/2015. HOMOLOGAÇÃO DA PARTILHA. PRÉVIO ATENDIMENTO DAS OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS PRINCIPAIS E ACESSÓRIAS RELATIVAS AO ITCMD. DESNECESSIDADE.

A homologação da partilha no procedimento do arrolamento sumário não pressupõe o atendimento das obrigações tributárias principais e tampouco acessórias relativas ao imposto sobre transmissão causa mortis. Inicialmente, cumpre salientar que o procedimento do arrolamento sumário é cabível quando todos os herdeiros forem capazes e estiverem concordes entre si quanto à partilha dos bens, sendo certo que a simplificação do procedimento em relação ao inventário e ao arrolamento comum afasta a possibilidade de maiores indagações no curso do procedimento especial, tais como a avaliação de bens do espólio e eventual questão relativa a lançamento, pagamento ou quitação de taxas judiciárias e tributos incidentes sobre a transmissão da propriedade, consoante o teor dos artigos 659 c/c 662 e seguintes do Código de Processo Civil. Consoante estas balizas legais, neste tocante, o Código de Processo Civil de 2015 dispõe que, no caso de arrolamento sumário, a partilha amigável será homologada de plano pelo juiz e, transitada em julgado a sentença, serão expedidos os alvarás referentes aos bens e rendas por ele abrangidos. Somente após, será o Fisco intimado para lançamento administrativo do imposto de transmissão e de outros tributos, porventura incidentes. Portanto, a obrigatoriedade de recolhimento de todos os tributos previamente ao julgamento da partilha (art. 664, § 5º, CPC) foi afastada pelo próprio art. 659, ao prever sua aplicação apenas ao arrolamento comum. O novo Código de Processo Civil de 2015, ao tratar do arrolamento sumário, permite que a partilha amigável seja homologada anteriormente ao recolhimento do imposto de transmissão causa mortis, e somente após a expedição do formal de partilha ou da carta de adjudicação é que a Fazenda Pública será intimada para providenciar o lançamento administrativo do imposto, supostamente devido.
REsp 1.751.332-DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, por unanimidade, julgado em 25/09/2018, DJe 03/10/2018.

IMPORTAÇÃO. DESPACHO ADUANEIRO. PAGAMENTO DOS DIREITOS ANTIDUMPING. REQUISITO IMPRESCINDÍVEL. RETENÇÃO DE MERCADORIA IMPORTADA. SÚMULA N. 323/STF. INAPLICABILIDADE.

A retenção de mercadoria importada até o pagamento dos direitos antidumping não viola o enunciado da Súmula n. 323/STF.A retenção de mercadoria importada até o pagamento dos direitos antidumping não viola o enunciado da Súmula n. 323/STF. Preliminarmente, destaca-se que o termo dumping origina-se do verbo to dump, que significa jogar, desfazer, esvaziar-se. Consiste na prática de medidas com o fim de possibilitar que mercadorias ou produtos possam ser oferecidos em um mercado estrangeiro a preço inferior ao vigente no mercado interno. O remédio adotado para essa prática comercial desleal é chamado de direito antidumping, ou seja, é o procedimento que agrega ao valor do produto importado uma quantia igual ou inferior àquela margem de preço diferenciado. Com efeito, o pagamento dos direitos antidumping representa condição para a importação dos produtos. O importador fica sujeito à sua exigência de ofício, além de multa e juros moratórios, se não cumprir a determinação, cuja imposição deve ser formalizada em auto de infração. Por essas razões, resta inaplicável o enunciado da Súmula n. 323 do Supremo Tribunal Federal, que rejeita a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos, porquanto não se pode confundir a apreensão com a retenção de mercadorias e consequente exigência de recolhimento de tributos e multa ou prestação de garantia, procedimento que integra a operação de importação. Outrossim, a quitação dos direitos antidumping é requisito para perfectibilização do processo de importação, sem o qual não pode ser autorizado o despacho aduaneiro. Não há como liberar pura e simplesmente as mercadorias à míngua de qualquer garantia. Nessa linha, existe precedente da 2ª Turma desta Corte (REsp 1.668.909-SC, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 20/6/2017, DJe 30/6/2017).
REsp 1.728.921-SC, Rel. Min. Regina Helena Costa, por unanimidade, julgado em 16/10/2018, DJe 24/10/2018.

AMEAÇAS DE EX-NAMORADO À MULHER VIA FACEBOOK. CRIME À DISTÂNCIA. INTERNACIONALIDADE CONFIGURADA. PEDIDO DE MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA AO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO. LEI MARIA DA PENHA. CONCRETUDE ÀS CONVENÇÕES INTERNACIONAIS FIRMADAS PELO BRASIL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.

Compete à Justiça Federal apreciar o pedido de medida protetiva de urgência decorrente de crime de ameaça contra a mulher cometido, por meio de rede social de grande alcance, quando iniciado no estrangeiro e o seu resultado ocorrer no Brasil. Inicialmente, cumpre salientar que, segundo o art. 109, V, da Constituição Federal, aos juízes federais compete processar e julgar "os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente". Encontrando-se o suposto autor das ameaças em território estrangeiro, uma vez que não se tem notícia do seu ingresso no país, tem-se um possível crime à distância, tendo em vista que as ameaças foram praticadas nos EUA, mas a suposta vítima teria tomado conhecimento do seu teor no Brasil. Observe-se que, de fato, não se tem, propriamente, crime previsto em tratado ou convenção internacional. Isto porque, embora o Brasil seja signatário de acordos internacionais que asseguram os direitos das mulheres, tais convenções não descrevem tipos penais. Em outras palavras, referidas convenções apenas apresentam conceitos e recomendações sobre a erradicação de qualquer forma de discriminação e violência contra as mulheres. Entretanto, em situação semelhante ao caso concreto, o argumento de ausência de tipificação em convenção internacional foi derrubado pelo Supremo quando da análise de crimes de pedofilia na Internet (RE 628.624). Segundo a tese vencedora, o Estatuto da Criança e do Adolescente é produto de tratado e convenção internacional subscritos pelo Brasil. Dessarte, à luz do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, embora as convenções internacionais firmadas pelo Brasil não tipifiquem ameaças à mulher, a Lei Maria da Penha, que prevê medidas protetivas, veio concretizar o dever assumido pelo Estado Brasileiro de proteção à mulher. Assim, é evidente a internacionalidade das ameaças que tiveram início nos EUA, por meio de rede social de grande alcance, o que resulta na competência da Justiça Federal.
CC 150.712-SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, por unanimidade, julgado em 10/10/2018, DJe 19/10/2018.

CESSÃO DE CRÉDITO DE TÍTULO JUDICIAL. CRÉDITO-PRÊMIO DE IPI. COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA. ART. 74 DA LEI N. 9.430/1996. INAPLICABILIDADE. SUCESSÃO PROCESSUAL. IMPOSSIBILIDADE.

Não é possível a sucessão processual em razão de cessão de crédito de título judicial, referente a crédito-prêmio de IPI, com a finalidade de oportunizar a compensação tributária pela cessionária. A Segunda Turma deste Tribunal Superior, há muito, tem decidido pela possibilidade da sucessão processual, na fase de execução, na hipótese de o crédito-prêmio de IPI ser objeto de cessão para terceiros. Para tanto, invoca o art. 567, II, do CPC/1973 ("Podem também promover a execução, ou nela prosseguir, o cessionário, quando o direito resultante do título executivo lhe foi transferido por ato entre vivos"); regra atualmente contida no art. 778 do CPC/2015. A Primeira Turma, por sua vez, avança quanto à natureza do crédito objeto da cessão para dar a melhor interpretação à controvérsia. Embora seja pacífico o entendimento jurisprudencial deste Tribunal Superior pela possibilidade de sucessão processual, na fase de execução, no caso de cessão de créditos de precatórios (art. 567 do CPC/1973), essa conclusão não pode ser estendida à cessão de crédito, cuja certificação declaratória de existência está contida no título judicial, sem a estipulação do quantum debeatur e, principalmente, quando esse crédito tem natureza de incentivo fiscal e objetivo único de favorecer a exportação de mercadorias por seu titular originário (exportador). De fato, tendo a cessão de crédito o fim de oportunizar à cessionária a compensação de créditos tributários, não se pode ignorar que a sentença transitada trata de estímulo fiscal, cuja condição de existência é a exportação. Autorizar a utilização nessa hipótese é chancelar manobra jurídica com o fim de burlar a legislação tributária tanto referente ao estímulo fiscal, quanto à compensação tributária prevista no art. 74 da Lei n. 9.430/1996, pois o termo "crédito" contido no referido artigo, desde sua redação original, e o "crédito judicial com trânsito em julgado" não englobam todo e qualquer crédito que o requerente queira opor à Fazenda Nacional, pois, obrigatoriamente, deve-se perquirir sobre a natureza da obrigação originadora do crédito. Aliás, o art. 286 do Código Civil dispõe, expressamente, que o "credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor [...]". Assim, é impossível a sucessão processual em razão de cessão de crédito de título judicial, referente a crédito-prêmio de IPI, com a finalidade de oportunizar a compensação tributária pela cessionária.
EREsp 1.390.228-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, por unanimidade, julgado em 26/09/2018, DJe 25/10/2018.


AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. DEPÓSITO PARCIAL DA DÍVIDA. IMPROCEDÊNCIA. EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO. PAGAMENTO INTEGRAL DA DÍVIDA E ENCARGOS. NECESSIDADE.

Em ação consignatória, a insuficiência do depósito realizado pelo devedor conduz ao julgamento de improcedência do pedido, pois o pagamento parcial da dívida não extingue o vínculo obrigacional. Inicialmente cumpre salientar que da análise dos artigos do Código Civil e do CPC de 1973, que trataram da ação de consignação em pagamento, nota-se: a) que a consignação de valor monetário é forma de pagamento integral da dívida vencida e que tem por objetivo extinguir a obrigação, ainda que se admita o depósito das parcelas vincendas, ainda não exigíveis (CC, arts. 334 e 336; CPC/1973, art. 890); b) que, em relação ao tema em debate, só tem lugar quando o credor não puder receber ou se recusar, sem justa causa, a receber ou dar quitação, ou pender litígio sobre o objeto (CC, art. 335); c) que devem concorrer os requisitos para a validade do pagamento, como tempo, modo, valor, sujeitos, lugar e acréscimos legais (CC, arts. 336 e 337; CPC/1973, arts. 890, § 1º, e 891); d) que a consignação em estabelecimento bancário (extrajudicial), assim como o ajuizamento do feito judicial, direito de ação que é, constitui faculdade ("poderá") do devedor (CPC/1973, art. 890, § 1º); e) que cessa para o devedor, sobre a importância depositada, a fluência de juros e os riscos, exceto se for julgada improcedente a consignatória (CPC/1973, art. 891); f) que o réu/credor, se alegar que o pagamento não é integral, deve indicar o montante que entende devido (CPC/1973, art. 896, inciso IV e parágrafo único); g) que com a procedência do pedido se dará a declaração de extinção da obrigação; e h) que existe possibilidade de julgamento de improcedência (CPC/1973, art. 891), caso em que o depósito não terá tido o efeito de fazer cessar a mora do devedor. A jurisprudência predominante do STJ, acerca da procedência parcial da ação em caso de depósito insuficiente, não é compatível com o princípio de direito civil de que não há mora simultânea, e nem com a disciplina processual da ação consignatória, a qual determina, como pressuposto para o exame do mérito, o depósito inicial da integralidade da dívida vencida, com o fito de extinção da obrigação. Os diversos julgados que representam o entendimento atualmente dominante desta Corte, na prática, suprimem a hipótese legal de improcedência do feito, ao arrepio do art. 891 do CPC/1973. Com efeito, não havendo depósito, a sentença será de extinção do processo sem exame do mérito (CPC 2015, art. 542, parágrafo único). Havendo depósito insuficiente, terá sido justa a recusa do credor, que não pode ser obrigado a receber em parte a prestação, se tal não foi convencionado, e, portanto, o resultado coerente com o ordenamento jurídico será a improcedência e não a procedência parcial do pedido. A aceitação de qualquer depósito, de qualquer valor, como hipótese de procedência parcial do pedido, privaria de efeito a regra legal segundo a qual cessa para o devedor "tanto que se efetue o depósito, os juros e os riscos, salvo se for julgada improcedente" a consignação (CPC/1973, art. 891; CPC/2015, art. 540); isso porque a ação seria sempre julgada parcialmente procedente, mesmo que manifestamente insuficiente o depósito para extinguir a obrigação, mesmo que justificada a recusa do credor, tendo o autor inadimplente dado causa ao ajuizamento da ação. Assim, quando o depósito não for integral, a solução imposta pelo ordenamento jurídico é o julgamento de improcedência do pedido consignatório.
REsp 1.108.058-DF, Rel. Min. Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF da 5ª Região), Rel. Acd. Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, por maioria, julgado em 10/10/2018, DJe 23/10/2018 (Tema 967)


10/11/2018

CORRUPÇÃO PASSIVA. ART. 317 DO CPC. EXPRESSÃO "EM RAZÃO DELA". EQUIPARAÇÃO A "ATO DE OFÍCIO". INVIABILIDADE. AÇÕES OU OMISSÕES INDEVIDAS FORA DAS ATRIBUIÇÕES FORMAIS DO FUNCIONÁRIO PÚBLICO. CONDENAÇÃO. POSSIBILIDADE.

O crime de corrupção passiva consuma-se ainda que a solicitação ou recebimento de vantagem indevida, ou a aceitação da promessa de tal vantagem, esteja relacionada com atos que formalmente não se inserem nas atribuições do funcionário público, mas que, em razão da função pública, materialmente implicam alguma forma de facilitação da prática da conduta almejada. De início, cumpre observar que recentes decisões do Supremo Tribunal Federal a respeito da interpretação do artigo 317 do Código Penal são no sentido de que "se exige, para a configuração do delito (de corrupção passiva), apenas o nexo causal entre a oferta (ou promessa) de vantagem indevida e a função pública exercida, sem que necessária a demonstração do mesmo nexo entre a oferta (ou promessa) e o ato de ofício esperado, seja ele lícito ou ilícito" (Voto da Ministra Rosa Weber no Inq 4.506/DF). Com efeito, nem a literalidade do art. 317 do CP, nem sua interpretação sistemática, nem a política criminal adotada pelo legislador parecem legitimar a ideia de que a expressão "em razão dela", presente no tipo de corrupção passiva, deve ser lida no restrito sentido de "ato que está dentro das competências formais do agente". A expressão "ato de ofício" aparece apenas no caput do art. 333 do CP, como um elemento normativo do tipo de corrupção ativa, e não no caput do art. 317 do CP, como um elemento normativo do tipo de corrupção passiva. Ao contrário, no que se refere a este último delito, a expressão "ato de ofício" figura apenas na majorante do art. 317, § 1º, do CP e na modalidade privilegiada do § 2º do mesmo dispositivo. Além disso, a desnecessidade de que o ato pretendido esteja no âmbito das atribuições formais do funcionário público fornece uma visão mais coerente e íntegra do sistema jurídico. A um só tempo, são potencializados os propósitos da incriminação – referentes à otimização da proteção da probidade administrativa, seja em aspectos econômicos, seja em aspectos morais – e os princípios da proporcionalidade e da isonomia. Conclui-se, que o âmbito de aplicação da expressão "em razão dela", contida no art. 317 do CP, não se esgota em atos ou omissões que detenham relação direta e imediata com a competência funcional do agente. Assim, o nexo causal a ser reconhecido é entre a mencionada oferta ou promessa e eventual facilidade ou suscetibilidade usufruível em razão da função pública exercida pelo agente.
REsp 1.745.410-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. Acd. Min. Laurita Vaz, por unanimidade, julgado em 02/10/2018, DJe 23/10/2018.

FALÊNCIA E RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SISTEMA RECURSAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO ESPECÍFICA NA LEI N. 11.101/2005 (LREF). AGRAVO DE INSTRUMENTO. CABIMENTO. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/2015. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA.

É cabível a interposição de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional, ainda que não haja previsão específica de recurso na Lei n. 11.101/2005 (LREF). Inicialmente, a Lei de Recuperação Judicial e Falência - LREF estabeleceu, em seu art. 189, que, "no que couber", haverá aplicação supletiva da lei adjetiva geral, incidindo tão somente de forma subsidiária e desde que se constate evidente compatibilidade com a natureza e o espírito do procedimento especial. No que se refere à definição do regime jurídico do agravo de instrumento diante do microssistema da Lei n. 11.101/2005, sabe-se que ao contrário do Código de Processo Civil de 1973, que possibilitava a interposição do agravo de instrumento contra toda e qualquer interlocutória, o novo diploma processual definiu que tal recurso só se mostra cabível contra as decisões expressamente apontadas pelo legislador. Contudo, o rol taxativo do art. 1.015 do CPC de 2015, por si só, não afasta a incidência das hipóteses previstas na LREF, pois o próprio inciso XIII estabelece o cabimento do agravo de instrumento nos "outros casos expressamente referidos em lei". No entanto, há determinadas decisões judiciais tomadas no curso da recuperação judicial e da falência que, apesar de não haver previsão de impugnação pela lei de regência nem enquadramento no rol taxativo do NCPC, ainda assim, serão passíveis de irresignação por intermédio do agravo. Apesar da taxatividade, o STJ vem reconhecendo a possibilidade de interpretação extensiva ou analógica das hipóteses dispostas no rol do agravo de instrumento. Deveras, nas interlocutórias sem previsão específica de recurso incidirá o parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015, justamente porque, em razão das características próprias do processo falimentar e recuperacional, haverá tipificação com a ratio do dispositivo - qual seja, falta de interesse/utilidade de revisão da decisão apenas no momento do julgamento da apelação -, permitindo a impugnação imediata dos provimentos judiciais. De fato, a recuperação judicial não é procedimento linearmente disposto, importa um somatório de decisões com o objetivo de viabilizar a reestruturação da empresa - tendo como norte a superação do estado de crise -, que, por consectário lógico, devem ser de rápida solução, inclusive por sua influência no conteúdo de atos subsequentes e na conclusão do plano. Realmente, não parece haver lógica em se aguardar a sentença no processo de recuperação judicial, somente prolatada depois do cumprimento de todas as obrigações previstas no plano de recuperação judicial aprovado (LREF, art. 63), momento em que já teria havido, por outro lado, todas as definições a respeito do deferimento e processamento da recuperação, dos critérios da assembleia de credores, das habilitações, da homologação do plano, entre outras medidas que restariam implementadas de maneira irremediável no momento da apelação. Assim, há clara incompatibilidade do novo regime de preclusão previsto no novel diploma processual com o sistema recursal da recuperação judicial, haja vista que a incidência do regime de impugnação diferida das interlocutórias, apenas em apelação, tornaria sem utilidade o recurso, pois seu cabimento ocorreria apenas quando do exaurimento do procedimento. Inclusive, essa foi a conclusão adotada pela 1ª Jornada de Direito Processual Civil do CJF, nos termos do Enunciado n. 69, segundo o qual "a hipótese do art. 1.015, parágrafo único, do CPC abrange os processos concursais, de falência e recuperação".
REsp 1.722.866-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, por unanimidade, julgado em 25/09/2018, DJe 19/10/2018.

AÇÃO DE COBRANÇA. DISTRIBUIÇÃO DE LUCRO. SOCIEDADE EMPRESÁRIA LIMITADA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SÓCIO NÃO CONFIGURADA. CITAÇÃO DA SOCIEDADE. DESNECESSIDADE.

Na ação de cobrança, é desnecessária a citação da sociedade empresária se todos os que participam do quadro social integram a lide. Nos termos do art. 601, parágrafo único, do NCPC, na ação de dissolução parcial de sociedade limitada, é desnecessária a citação da sociedade empresária se todos os que participam do quadro social integram a lide. Assim, da mesma forma, não há motivo para reconhecer o litisconsórcio passivo na hipótese de simples cobrança de valores quando todos os sócios foram citados. Por conseguinte, não há que se falar em ilegitimidade passiva do sócio ou necessidade de litisconsórcio passivo necessário com a sociedade, tendo em conta que, se todos os sócios já integram a lide, consideram-se representados os interesses da sociedade empresária. Além do mais, na linha dos precedentes desta Corte, o princípio processual da instrumentalidade das formas, sintetizado pelo brocardo pas de nullité sans grief e positivado nos arts. 249 e 250, ambos do CPC/1973 (arts. 282 e 283, ambos do NCPC), impede a anulação de atos inquinados de invalidade quando deles não tenham decorrido prejuízos concretos.
REsp 1.731.464-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, por unanimidade, julgado em 25/09/2018, DJe 01/10/2018.

CONTRATOS COLIGADOS. ABERTURA DE CRÉDITO E SWAP. PRINCÍPIO DA GRAVITAÇÃO JURÍDICA. COMPROMISSO ARBITRAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA. POSSIBILIDADE.

Reconhecida a coligação contratual, é possível a extensão da cláusula compromissória prevista no contrato principal de abertura de crédito aos contratos de swap. Inicialmente registre-se que nos contratos coligados as partes celebram uma pluralidade de negócios jurídicos tendo por desiderato um conjunto econômico, criando entre eles efetiva dependência. Nesse sistema, o contrato reputado como sendo o principal determina as regras que deverão ser seguidas pelos demais instrumentos negociais que a este se ajustam. Assim, além da necessidade de interpretação em conjunto dos referidos contratos soma-se a incidência do princípio da gravitação jurídica, pelo qual, de acordo com a doutrina, tudo o que ocorre no contrato principal repercute no acessório. Dessa forma, não se mostra razoável que uma cláusula compromissória inserta no contrato principal de abertura de crédito não tenha seus efeitos estendidos aos contratos de swap.
REsp 1.639.035-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, por maioria, julgado em 18/09/2018, DJe 15/10/2018.

BEM IMÓVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. DIREITOS DO DEVEDOR FIDUCIANTE. PENHORA. IMPOSSIBILIDADE. BEM DE FAMÍLIA LEGAL. LEI N. 8.009/1990.

Os direitos do devedor fiduciante sobre imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária em garantia possuem a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal. Cinge-se a controvérsia a definir se os direitos (posse) do devedor fiduciante sobre o imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária em garantia podem receber a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal (Lei n. 8.009/1990) em execução de título extrajudicial (cheques). De início, para a aplicação da regra de impenhorabilidade do bem de família, a lei exige, em regra, que a propriedade pertença ao casal ou à entidade familiar, pois o legislador utilizou o termo "imóvel residencial próprio". Por conseguinte, se o imóvel sobre o qual incidiu a constrição pertence a terceiro não integrante do grupo familiar, este não pode, em regra, alegar a referida proteção legal. Contudo, a doutrina, alicerçada nos propósitos sociais tutelados pela Lei n. 8.009/1990, afirma que a proteção da impenhorabilidade também visa proteger a posse da família sobre o imóvel utilizado para a sua moradia, ainda que não tenha o título de propriedade. Nesse contexto, a exegese que melhor representa o objetivo legal compreende que a expressão "imóvel residencial próprio" engloba a posse advinda de contrato celebrado com a finalidade de transmissão da propriedade, a exemplo do compromisso de compra e venda ou de financiamento de imóvel para fins de moradia. Isso porque não se pode perder de vista que a proteção abrange o imóvel em fase de aquisição, sob pena de impedir que o devedor adquira o bem necessário à habitação da entidade familiar. Assim, tratando-se de contrato de alienação fiduciária em garantia, no qual, havendo a quitação integral da dívida, o devedor fiduciante consolidará a propriedade para si (art. 25, caput, da Lei n. 9.514/1997), deve prevalecer a regra de impenhorabilidade.
REsp 1.677.079-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 25/09/2018, DJe 01/10/2018.

CONTRABANDO DE CIGARROS. INDÍCIOS DE TRANSNACIONALIDADE NA CONDUTA DO AGENTE. DESNECESSIDADE. CRIME QUE TUTELA INTERESSE DA UNIÃO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.

Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes de contrabando e de descaminho, ainda que inexistentes indícios de transnacionalidade na conduta. Destaque-se, de início, que a jurisprudência desta Corte definia a competência da Justiça Federal para o julgamento dos crimes de contrabando e descaminho, nos termos da Súmula n. 151/STJ. No julgamento do CC 149.750/MS, de 26/4/2017, modificou-se tal orientação para limitar a competência federal, no caso de contrabando, às hipóteses em que for constatada a existência de indícios de transnacionalidade na conduta do agente. No entanto, o referido conflito de competência tratava de crime distinto (violação de direito autoral), no qual a fixação da competência federal decorre da hipótese do art. 109, V, da Constituição Federal (crime que o Brasil se obrigou a reprimir em tratado internacional), hipótese na qual se exige efetivamente indícios de transnacionalidade para a competência federal. Essa compreensão ficou consolidada, até que, no julgamento do CC 159.680/MG (realizado em 8/8/2018), a Terceira Seção decidiu pela competência federal para o julgamento do crime de descaminho, ainda que inexistentes indícios de transnacionalidade na conduta. Embora o referido precedente verse acerca de figura penal distinta (descaminho), o entendimento ali acolhido deve prevalecer também para o crime de contrabando. Primeiro, porque o crime de contrabando, tal como o delito de descaminho, tutela prioritariamente interesse da União, que é a quem compete privativamente (arts. 21, XXII e 22, VII, ambos da CF) definir os produtos de ingresso proibido no país, além de exercer a fiscalização aduaneira e das fronteiras, mediante atuação da Receita Federal e Polícia Federal. Segundo, para preservar a segurança jurídica. Ora, a jurisprudência desta Corte, na esteira do entendimento firmado na Súmula n. 151/STJ, tradicionalmente sinalizava que a competência para o julgamento de tais delitos seria da Justiça Federal, afigurando-se desarrazoada a adoção de entendimento diverso, notadamente sem um motivo jurídico relevante para tanto.
CC 160.748-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, por unanimidade, julgado em 26/09/2018, DJe 04/10/2018.

PLANOS DE SAÚDE. INTERNAÇÃO PSIQUIÁTRICA SUPERIOR A 30 DIAS POR ANO CONTRATUAL. COPARTICIPAÇÃO. VALIDADE.

Não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor para a hipótese de internação superior a 30 (trinta) dias decorrentes de transtornos psiquiátricos. Cinge-se a discussão a determinar a interpretação que deve prevalecer na Segunda Seção acerca da abusividade ou não de cláusula em contrato de plano de saúde, que impõe coparticipação do contratante, após o período de 30 (trinta) dias, à razão de 50% (cinquenta por cento) do valor das despesas hospitalares e honorários médicos de internação para tratamento psiquiátrico. Inicialmente, cumpre salientar que o art. 12, II, "a" da Lei n. 9.656/1998, veda às operadoras de plano de saúde a limitação de prazo, valor máximo e quantidade de cobertura de internações hospitalares. Contudo, o art. 16, inc. VIII da mesma lei, determina que conste em qualquer modalidade de produto, serviço ou contrato de assistência médica, hospitalar e odontológica, com clareza, "a franquia, os limites financeiros ou o percentual de coparticipação do consumidor ou beneficiário, contratualmente previstos nas despesas com assistência médica, hospitalar e odontológica". Além disso, da própria definição de "plano privado de assistência à saúde" que consta no art. 1º da lei, extrai-se a possibilidade de a prestação continuada de serviços "ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor". Percebe-se, assim, que a Lei n. 9.656/1998 autoriza, expressamente, a possibilidade de coparticipação do contratante em despesas médicas específicas, desde que figure de forma clara e expressa a obrigação para o consumidor no contrato.

EAREsp 793.323-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, por unanimidade, julgado em 10/10/2018, DJe 15/10/2018.

09/11/2018

PREVIDÊNCIA PRIVADA ABERTA. BENEFÍCIO COMPLEMENTAR. REVISÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. TAXA REFERENCIAL. APLICAÇÃO INIDÔNEA A PARTIR DE 5/9/1996. SUBSTITUIÇÃO POR UM ÍNDICE GERAL DE PREÇOS DE AMPLA PUBLICIDADE. NECESSIDADE. INCIDÊNCIA DO IPCA NA FALTA DE REPACTUAÇÃO.

A Taxa Referencial (TR) não pode ser utilizada como fator de correção monetária dos benefícios da previdência privada aberta, a partir de 5/9/1996, devendo o indexador ser substituído por um Índice Geral de Preços de Ampla Publicidade, que será o IPCA, na ausência de repactuação. A Segunda Seção do STJ, em apreciação aos embargos de divergência, pacificou o entendimento que encontrava dissonância no âmbito das Turmas responsáveis pelas matérias relativas a Direito Privado, sobre a possibilidade de utilização da Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária de benefício previdenciário complementar suportado por entidade aberta de previdência privada, sobretudo a partir de setembro de 1996. Inicialmente cumpre salientar que foram editados diversos normativos pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) disciplinando, ao longo dos anos, os indexadores idôneos para atualizar as contribuições e os benefícios previdenciários suplementares, sobretudo para as entidades abertas de previdência privada. A substituição de um indexador por outro é possível desde que idôneo para medir a inflação, recompondo a obrigação contratada. Não pode incidir, dessa forma, índice aleatório, que privilegie, por um lado, a entidade de previdência privada ou, por outro, o participante. Nesse contexto, foram adotados, pelos órgãos governamentais competentes, como referência monetária para os contratos de previdência privada aberta, na ordem, a ORTN, a OTN, o IPC, o BTN e a TR, esta até a edição da Circular SUSEP n. 11/1996. Registre-se que o Supremo Tribunal Federal reiterou o entendimento acerca da inidoneidade da aplicação da remuneração da caderneta de poupança (TR) para mensurar o fenômeno inflacionário, já que sua fórmula de cálculo é desvinculada da variação de preços da economia, implicando violação do direito de propriedade (art. 5º, XXII, da Constituição Federal) a sua imposição como índice de correção monetária, justamente por constituir uma restrição desproporcional, inadequada para promover os fins aos quais se destina. Os próprios órgãos reguladores do setor, atentos à problemática, reconheceram a TR como fator inadequado de correção monetária nos contratos de previdência privada aberta, editando o CNSP a Resolução n. 7/1996 (atualmente, Resolução n. 103/2004) e a SUSEP, a Circular n. 11/1996 (hoje, Circular n. 255/2004) a fim de orientar a repactuação dos contratos para substituí-la por um Índice Geral de Preços de Ampla Publicidade: INPC/IBGE, IPCA/IBGE, IGPM/FGV, IGP-DI/FGV, IPC/FGV ou IPC/FIPE, apropriados para fazer frente à inflação. É por isso que, após a edição da Circular/SUSEP n. 11/1996, em 5/9/1996, a TR não pode mais subsistir como índice de atualização dos valores oriundos dos contratos de previdência privada aberta. Além disso, consoante o art. 1º, parágrafo único, do Anexo I da Circular/SUSEP n. 255/2004, "no caso de extinção do índice pactuado, deverá ser utilizado o IPCA/IBGE, caso não tenha sido convencionado, no ato da contratação, índice substituto dentre aqueles previstos neste artigo".

EAREsp 280.389-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, por unanimidade, julgado em 26/09/2018, DJe 19/10/2018.

EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. IMPENHORABILIDADE DE VENCIMENTOS. ART. 649, § 2º, DO CPC/1973. DÍVIDA NÃO ALIMENTAR. EXCEÇÃO IMPLÍCITA. POSSIBILIDADE. GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL.

A regra geral de impenhorabilidade dos vencimentos do devedor, além da exceção explícita prevista no parágrafo 2º do art. 649, IV, do CPC/1973, também pode ser excepcionada quando preservado percentual capaz de manter a dignidade do devedor e de sua família. Trata a controvérsia em definir se a regra de impenhorabilidade das verbas previstas no art. 649, IV, do CPC/1973 encontra exceção apenas para o pagamento de verba alimentar (conforme exceção expressa constante do parágrafo 2º do mesmo artigo) ou se também se deverá permitir a penhora de parte de tais verbas no caso de a proporção penhorada do salário do devedor se revelar razoável, de modo a não afrontar a dignidade ou subsistência do devedor e de sua família. Inicialmente, consoante se revela da divergência, as Turmas integrantes da Primeira Seção não admitem a penhora das verbas previstas no art. 649, IV, do CPC/1973, a não ser no caso de débito alimentar, ao passo que as Turmas integrantes da Segunda Seção admitem também a penhora em caso de empréstimo consignado e em casos em que a remuneração do devedor comporta penhora parcial sem prejuízo à dignidade e subsistência do devedor e de sua família. Registre-se que a interpretação do preceito legal deve ser feita a partir da Constituição da República, que veda a supressão injustificada de qualquer direito fundamental. Assim, a impenhorabilidade de salários, vencimentos e proventos tem por fundamento a proteção à dignidade do devedor, com a manutenção do mínimo existencial e de um padrão de vida digno em favor de si e de seus dependentes. Por outro lado, o credor tem direito ao recebimento de tutela jurisdicional capaz de dar efetividade, na medida do possível e do proporcional, a seus direitos materiais. Ademais, o processo civil em geral, nele incluída a execução civil, é orientado pela boa-fé que deve reger o comportamento dos sujeitos processuais. Embora o executado tenha o direito de não sofrer atos executivos que importem violação à sua dignidade e à de sua família, não lhe é dado abusar dessa diretriz com o fim de impedir injustificadamente a efetivação do direito material do exequente. Dessa forma, só se revela necessária, adequada, proporcional e justificada a impenhorabilidade daquela parte do patrimônio do devedor que seja efetivamente necessária à manutenção de sua dignidade e da de seus dependentes.

EREsp 1.582.475-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, por maioria, julgado em 03/10/2018, DJe 16/10/2018.

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CONDENAÇÃO GENÉRICA AO PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS PERICIAIS. INCLUSÃO. ART. 20, § 2º, DO CPC/1973.

É adequada a inclusão dos honorários periciais em conta de liquidação quando o dispositivo da sentença com trânsito em julgado condena o vencido, genericamente, ao pagamento de custas processuais. O propósito recursal dos embargos de divergência consiste em determinar qual entendimento deve prevalecer no STJ acerca da interpretação do art. 20, §2º, do CPC/1973, em especial se o dispositivo de sentença com trânsito em julgado que condena o vencido ao pagamento apenas de custas processuais abrange as despesas decorrentes dos honorários periciais. Inicialmente, é preciso evitar o destemperado apego formalista, em prestígio da solução justa da crise de direito material levada ao Judiciário, sempre com foco na visão sistemática da legislação e em respeito à própria lógica processual moderna. Justamente nesse sentido que na hipótese de o pedido formulado na petição inicial ser julgado improcedente, não se pode imaginar que o réu seja compelido a arcar com custas ou despesas de um processo para cuja formação não deu causa. Em poucas palavras: aquele que vence não deve sofrer prejuízo por causa do processo. O fundamento deste raciocínio está umbilicalmente ligado ao princípio da sucumbência, como conteúdo epistêmico da ciência processual a ser observado na instauração dos litígios judiciais. A doutrina aduz que "fundamenta-se tal instituto na conclusão de que a atuação da lei não deve representar uma redução no patrimônio da parte em favor da qual esta foi aplicada. É do interesse do Estado que o emprego do processo não se resolva em prejuízo daquele que tem razão, face ao interesse do comércio jurídico de que os direitos tenham valor, tanto quanto possível, nítido e constante". Isso porque "à sentença cabe prover para que o direito do vencedor não saia diminuído de um processo em que foi proclamada a sua razão". A partir dessa perspectiva que se firmou a compreensão de se tratar de uma injusta surpresa para o vencedor do litígio se ver obrigado a arcar com os honorários periciais apenas e tão somente porque a sentença condenava o vencido ao pagamento de "custas" e não "despesas". Ademais, a própria noção da máxima eficiência da tutela jurisdicional justa aponta para a indispensável leitura do dispositivo genérico de condenação do sucumbente ao pagamento de custas e honorários, como o comando de ressarcimento integral das despesas processuais. Nesse contexto, é adequada a inclusão dos honorários periciais em conta de liquidação quando o dispositivo da sentença com trânsito em julgado condena o vencido, genericamente, ao pagamento de "custas processuais", por ser decorrência lógica do princípio da sucumbência.
EREsp 1.519.445-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, por maioria, julgado em 19/09/2018, DJe 10/10/2018.

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI N. 6.830/1980. DELIMITAÇÃO DOS MARCOS LEGAIS APLICADOS. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO PELO MAGISTRADO.

O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa. Essa tese foi adicionada por sugestão do Min. Og Fernandes para mais bem disciplinar a aplicação do repetitivo, que assim defendeu em seu voto-vista: "Transcorrido o período prescricional e constatada a falta de efetividade do exequente, será reconhecida a prescrição. Apenas não é imprescindível que haja decisão prévia sobre a suspensão do processo. Todavia, isso não dispensa o magistrado de, ao reconhecer a prescrição intercorrente, fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa. Sendo assim, está sendo observado o teor do caput do art. 40 da LEF. (...) Com isso, restará a possibilidade de o exequente, intimado da decisão que reconheceu a prescrição intercorrente, utilizar-se dos meios recursais cabíveis para questionar a contagem dos marcos legais indicados na decisão judicial e demonstrar eventual equívoco do ato judicial impugnado".

REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018.

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI N. 6.830/1980. NULIDADE POR FALTA DE INTIMAÇÃO. DEMONSTRAÇÃO DO PREJUÍZO. NECESSIDADE.

A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/1973, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial – Tema 566, onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Embora a jurisprudência do STJ já tenha entendido que é necessário intimar a Fazenda Pública antes da decisão de decretação da prescrição intercorrente, consoante a literalidade do art. 40, § 4º, da LEF as duas previsões legais de intimação da Fazenda Pública dentro da sistemática do art. 40, da LEF são formas definidas pela lei cuja desobediência não está acompanhada de qualquer cominação de nulidade, ou seja, a teor do art. 244 do CPC: "Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade". Sendo assim, se ao final do referido prazo de 6 (seis) anos contados da falta de localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40,caput, da LEF) a Fazenda Pública for intimada do decurso do prazo prescricional, sem ter sido intimada nas etapas anteriores, terá nesse momento e dentro do prazo para se manifestar (que pode ser inclusive em sede de apelação), a oportunidade de providenciar a localização do devedor ou dos bens e apontar a ocorrência no passado de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Esse entendimento é o que está conforme o comando contido no art. 40, § 3º, da LEF. Por outro lado, caso a Fazenda Pública não faça uso dessa prerrogativa, é de ser reconhecida a prescrição intercorrente. O mesmo raciocínio é aplicável caso se entenda que a ausência de intimação das etapas anteriores tem enquadramento nos arts. 247 e 248 do CPC. Isto porque o princípio da instrumentalidade das formas recomenda que a Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC), ao alegar a nulidade pela falta de intimação demonstre o prejuízo que sofreu e isso somente é possível se houver efetivamente localizado o devedor ou os bens penhoráveis ou tenha ocorrido qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Desse modo, a jurisprudência do STJ evoluiu da necessidade imperiosa de prévia oitiva da Fazenda Pública para se decretar a prescrição intercorrente para a análise da utilidade da manifestação da Fazenda Pública na primeira oportunidade em que fala nos autos a fim de ilidir a prescrição intercorrente. Evoluiu-se da exigência indispensável da mera formalidade para a análise do conteúdo da manifestação feita pela Fazenda Pública.
REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018 (Temas 570 e 571)

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INTERRUPÇÃO. EFETIVA CONSTRIÇÃO PATRIMONIAL. EFETIVA CITAÇÃO. ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI N. 6.830/1980.

A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo – mesmo depois de escoados os referidos prazos –, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera. Inicialmente, registre-se que o art. 40, caput, da LEF não dá qualquer opção ao Juiz (verbo: "suspenderá") diante da constatação de que não foram encontrados o devedor ou bens penhoráveis. De observar também que o art. 40, § 3º, da LEF quando se refere à localização do devedor ou dos bens para a interrupção da prescrição intercorrente ("§ 3º - Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução") não se refere à localização daqueles por parte da Fazenda Pública, mas a sua localização por parte do Poder Judiciário. Isto porque a palavra "encontrados", se interpretada à luz do princípio constitucional da eficiência, somente pode se referir a encontrados pelo Poder Judiciário. Explica-se. A Fazenda Pública de posse de um indicativo de endereço ou bem penhorável peticiona em juízo requerendo a citação ou penhora consoante as informações dadas ao Poder Judiciário. Essa petição, por si só, não satisfaz o requisito do art. 40, § 3º, da LEF. Para todos os efeitos, o devedor ou os bens ainda não foram encontrados (trata-se de mera indicação). É preciso também que a providência requerida ao Poder Judiciário seja frutífera, ou seja, que resulte em efetiva citação ou penhora (constrição patrimonial). Desse modo, estarão "Encontrados que sejam, [...] o devedor ou os bens", consoante o exige o art. 40, § 3º, da LEF. Outrossim, a providência requerida ao Poder Judiciário deve resultar em efetiva citação ou penhora - constrição patrimonial (isto é: ser frutífera/eficiente), ainda que estas ocorram fora do prazo de 6 (seis) anos. Indiferente ao caso que a penhora (constrição patrimonial) perdure, que o bem penhorado (constrito) seja efetivamente levado a leilão e que o leilão seja positivo. Cumprido o requisito, a prescrição intercorrente se interrompe na data em que protocolada a petição que requereu a providência frutífera, até porque, não é possível interromper a prescrição intercorrente fora do prazo de 6 (seis) anos, já que não se interrompe aquilo que já se findou. Isto significa que o Poder Judiciário precisa dar resposta às providências solicitadas pelo exequente dentro do prazo de 6 (seis) anos, ainda que para além desse prazo. Nesse sentido, a demora do Poder Judiciário para atender aos requerimentos tempestivos (feitos no curso do prazo de seis anos) há que ser submetida à mesma lógica que ensejou a publicação da Súmula n. 106/STJ ("Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência"). Se a providência requerida for infrutífera, decreta-se a prescrição, salvo se o Poder Judiciário excepcionalmente reconhecer a sua culpa (aplicação direta ou analógica da Súmula n. 106/STJ), o que deve ser averiguado de forma casuística, já que depende de pressupostos fáticos. Neste ponto, observa-se que a ausência de inércia do exequente de que trata o art. 40 da LEF é uma ausência de inércia qualificada pela efetividade da providência solicitada na petição. Essa é a característica específica do rito da LEF a distingui-lo dos demais casos de prescrição intercorrente. Decorre de leitura particular que se faz do art. 40, § 3º, da LEF que não está presente em nenhum outro procedimento afora a execução fiscal.
REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018 (Tema 568)

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI N. 6.830/1980. FINAL DO PRAZO DE 1 (UM) ANO DE SUSPENSÃO. INÍCIO AUTOMÁTICO DO PRAZO PRESCRICIONAL.

Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão, inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo), durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/1980 - LEF, findo o qual o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. A compreensão de que o prazo de suspensão do art. 40, da LEF somente tem início mediante peticionamento da Fazenda Pública ou determinação expressa do Juiz configura grave equívoco interpretativo responsável pelos inúmeros feitos executivos paralisados no Poder Judiciário ou Procuradorias, prolongando indevidamente o início da contagem do prazo da prescrição intercorrente. Essa interpretação equivocada já foi rechaçada no leading case que originou a Súmula n. 314/STJ (EREsp 97.328/PR). Desse modo, havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não decisão judicial nesse sentido (essas decisões e despachos de suspensão e arquivamento são meramente declaratórios, não alterando os marcos prescricionais), inicia-se automaticamente o prazo prescricional de 5 (cinco) anos durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição.
REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018 (Temas 567 e 569)

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI N. 6.830/1980. PRAZO DE 1 (UM) ANO DE SUSPENSÃO DO PROCESSO. CIÊNCIA DA FAZENDA PÚBLICA QUANTO À NÃO LOCALIZAÇÃO DO DEVEDOR OU INEXISTÊNCIA DE BENS PENHORÁVEIS NO ENDEREÇO FORNECIDO. INÍCIO AUTOMÁTICO.

O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/1980 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução. Sem prejuízo do disposto anteriormente: 1.1) nos casos de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido antes da vigência da Lei Complementar n. 118/2005), depois da citação válida, ainda que editalícia, logo após a primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução; e, 1.2) em se tratando de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido na vigência da Lei Complementar n. 118/2005) e de qualquer dívida ativa de natureza não tributária, logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor ou de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução. O espírito da Lei de Execuções Fiscais, em seu art. 40, é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais. Nessa lógica, com o intuito de dar cabo dos feitos executivos com pouca ou nenhuma probabilidade de êxito, estabeleceu-se então um prazo para que fossem localizados o devedor ou encontrados bens sobre os quais pudessem recair a penhora. Dito de outra forma, não havendo a citação de qualquer devedor (o que seria apenas marco interruptivo da prescrição) e/ou não sendo encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora (o que permitiria o fim da inércia processual), inicia-se automaticamente o procedimento visto no art. 40 da Lei n. 6.830/1980, e respectivo prazo ao fim do qual restará prescrito o crédito fiscal. Esse é o teor da Súmula n. 314/STJ: "Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente". Na construção do sistema, o referido prazo foi segmentado em duas partes. A primeira parte tem por termo inicial a falta de localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40, caput, da LEF) e por termo final o prazo de 1 (um) ano dessa data (art. 40, §§ 1º e 2º, da LEF). Durante essa primeira parte, a execução fiscal fica suspensa com vista dos autos aberta ao representante judicial da Fazenda Pública (art. 40, § 1º, da LEF). Já a segunda parte tem por termo inicial o fim da primeira parte, isto é, o fim do prazo de 1 (um) ano da data da frustração na localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40, § 2º, da LEF), e por termo final o prazo prescricional próprio do crédito fiscal em cobrança (quinquenal, no caso dos créditos tributários - art. 174, do CTN), consoante o art. 40, § 4º, da LEF. Nessa segunda parte, a execução fiscal fica arquivada no Poder Judiciário, sem baixa na distribuição. Desse modo, se o crédito fiscal em cobrança for crédito tributário tem-se um prazo de 6 (seis) anos contados da constatação da falta de localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40, caput, da LEF) para que a Fazenda Pública encontre o devedor ou os referidos bens. Dentro desse prazo é que pode pedir as providências genéricas como a citação por edital e a penhora via BACEN-JUD, não havendo qualquer incompatibilidade. Considerando a jurisprudência desta Casa que entende ser o fluxo dos prazos do art. 40 da LEF automático, o prazo de 1 (um) ano de suspensão tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor e/ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido. Isto porque nem o Juiz e nem a Procuradoria da Fazenda Pública são os senhores do termo inicial do prazo para a contagem da primeira parte (prazo de 1 ano de suspensão), somente a lei o é (ordena o art. 40: "[...] o juiz suspenderá [...]"). Assim, não cabe ao juiz ou à Procuradoria fazendária a escolha do melhor momento para o seu início. Constatada a ausência de bens pelo oficial de justiça e intimada a Fazenda Pública, inicia-se o prazo, na forma do art. 40, caput, da LEF. O que importa para a aplicação da lei é que a Fazenda Nacional tenha tomado ciência da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido. Isso é o suficiente para inaugurar o prazo ex lege.
REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 12/09/2018, DJe 16/10/2018 (Tema 566).