Translate

20/02/2016

DIREITO PENAL. USO INDEVIDO DE INFORMAÇÃO PRIVILEGIADA.


Subsume-se à figura típica prevista no art. 27-D da Lei n. 6.385/1976 a conduta de quem, em função do cargo de alta relevância que exercia em sociedade empresária, obteve informação sigilosa acerca da futura aquisição do controle acionário de uma companhia por outra (operação cujo estudo de viabilidade já se encontrava em estágio avançado) - dado capaz de influir de modo ponderável nas decisões dos investidores do mercado, gerando apetência pela compra dos ativos da sociedade que seria adquirida - e, em razão dessa notícia, adquiriu, no mesmo dia, antes da divulgação do referido dado no mercado de capitais, ações desta sociedade, ainda que antes da conclusão da operação de aquisição do controle acionário. O art. 27-D da Lei n. 6.385/1976 ("Utilizar informação relevante ainda não divulgada ao mercado, de que tenha conhecimento e da qual deva manter sigilo, capaz de propiciar, para si ou para outrem, vantagem indevida, mediante negociação, em nome próprio ou de terceiro, com valores mobiliários") foi editado para assegurar a todos os investidores o direito à equidade da informação, condição inerente à garantia de confiabilidade do mercado de capitais, sem a qual ele perde a sua essência, notadamente a de atrair recursos para as grandes companhias. A legislação penal brasileira não explicitou, entretanto, o que venha a ser "informação relevante", fazendo com que o intérprete recorra a outras leis ou atos normativos para saber o alcance da norma incriminadora. A par disso, convém destacar que, segundo doutrina, "insider trading é, simplificadamente, a utilização de informações relevantes sobre uma companhia, por parte das pessoas que, por força do exercício profissional, estão 'por dentro' de seus negócios, para transacionar com suas ações antes que tais informações sejam de conhecimento do público". Assim, "o insider compra ou vende no mercado a preços que ainda não estão refletindo o impacto de determinadas informações sobre a companhia, que são de seu conhecimento exclusivo". Cumpre esclarecer que as "informações" apenas terão relevância para a configuração do crime do art. 27-D da Lei n. 6.385/1976 se a sua utilização ocorrer antes de serem divulgadas no mercado de capitais. Isso porque os fatos com potencial de influência sobre as decisões dos investidores devem ser comunicados publicamente, conforme determinam os arts. 3º e 6º, parágrafo único, da Instrução Normativa n. 358/2002 da CVM, bem como o art. 157, § 4º, da Lei n. 6.404/1976. Da leitura dos referidos comandos normativos, conclui-se que, quando o insider detiver informações relevantes sobre sua companhia, deverá informá-las ao mercado tão logo seja possível (arts. 3º da Instrução Normativa n. 358/2002 da CVM e 157, § 4º, da Lei n. 6.404/1976), ou, no caso em que não puder fazê-lo, por entender que sua revelação colocará em risco interesse da empresa (art. 6º da Instrução Normativa), deverá abster-se de negociar com os valores mobiliários referentes às informações privilegiadas, enquanto não forem divulgadas. Em termos gerais, pode-se encontrar a definição de "informação relevante" nos arts. 155, § 1º, da Lei n. 6.404/1976 e 2º da Instrução n. 358/2002 da CVM. Registre-se, nesse contexto, que a Instrução Normativa n. 358/2002 da CVM, em seu art. 2º, elenca 22 (vinte e duas) hipóteses como exemplos de fatos potencialmente relevantes, o que constitui, sem dúvida, importante fonte hermenêutica para a seara criminal, assim como a Lei de Sociedade Anônimas. Entretanto, compete ao aplicador da lei a valoração em concreto da relevância da informação, conforme o momento e a realidade em que ocorreram, até porque o rol mencionado não é taxativo, mas exemplificativo. De mais a mais, conforme entendimento doutrinário, "além desse critério de índole normativa, a informação 'deve ter em relação à realidade que descreve um mínimo de materialidade ou objetividade ou, noutros termos, a consciência mínima para permitir a sua utilização por um investidor médio', ou seja, a informação deve estar dotada de potencialidade para 'influir, de modo ponderável, na decisão dos investidores do mercado de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela companhia, tal como prevê o artigo 157, § 4º, da Lei n. 6.404/1976'". Acrescenta-se, ainda, que, "para que se possa fazer um juízo de prognose relativamente à idoneidade da informação", sugere-se fazer "uma comparação: 'se tal informação quando publicada fosse, num juízo de previsibilidade reportado ao momento ex ante da operação, suscetível de gerar apetência pela compra ou venda de ativos, tal informação revelava idoneidade para influenciar a evolução da cotação. Se as alterações que poderia induzir fossem sensíveis, será informação privilegiada". Nessa linha intelectiva, seguindo definição doutrinária, pode-se dizer que informação relevante é aquela que: "a) não foi tornada pública; b) é capaz de influir de modo ponderável na cotação de títulos ou valores mobiliários (price sensitive); c) seja precisa ou concreta". REsp 1.569.171-SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 16/2/2016, DJe 25/2/2016.

Nenhum comentário:

Postar um comentário