É suficiente, para a
comprovação da materialidade do delito previsto no art. 184, § 2º,
do CP, a perícia realizada, por amostragem, sobre os aspectos
externos do material apreendido, sendo desnecessária a identificação
dos titulares dos direitos autorais violados ou de quem os
represente. No que diz respeito à comprovação da
materialidade dos delitos contra a propriedade intelectual, a Lei
10.695/2003 (Lei Antipirataria), além de modificar o art. 184 do CP,
incluiu, para facilitar a apuração desses crimes, os arts. 530-A e
seguintes no CPP, prevendo a possibilidade de elaboração de laudo
pericial por apenas um perito. Previu-se, também, nos crimes de ação
penal pública incondicionada - aos quais se aplica o procedimento
previsto nos arts. 530-B a 530-H -, a possibilidade de a autoridade
policial agir de ofício, apreendendo o produto ilícito e tomando as
medidas necessárias para cessar a atividade criminosa. Daí o debate
sobre: (a) se a materialidade do crime previsto no art. 184, § 2º,
do CP pode ser comprovada mediante laudo pericial feito por
amostragem do produto apreendido; (b) se é suficiente a análise de
características externas do material apreendido para a aferição da
falsidade necessária à tipificação do delito descrito no art. 184, §
2º, do CP; e, ainda, (c) se, para a configuração do delito em
questão, é dispensável a identificação individualizada dos titulares
dos direitos autorais violados ou de quem os represente. Quanto ao
primeiro ponto em debate (a), realmente, o art. 530-D do CPP dispõe
que "Subsequente à apreensão, será realizada, por perito oficial,
ou, na falta deste, por pessoa tecnicamente habilitada, perícia
sobre todos os bens apreendidos e elaborado o laudo que deverá
integrar o inquérito policial ou o processo". Entretanto, ainda que
esse dispositivo legal literalmente disponha que a perícia deve ser
realizada sobre "todos os bens apreendidos", a materialidade do
crime previsto no art. 184, § 2º, do CP pode ser comprovada mediante
laudo pericial feito por amostragem do produto apreendido, já que
basta a apreensão de um único objeto para que, realizada a perícia e
identificada a falsidade do bem periciado, tenha-se como configurado
o delito em questão. Nesse sentido, a Sexta Turma do STJ (HC
213.758-SP, DJe 10/4/2013) já definiu que "há critérios estatísticos
aptos a permitir que o perito conclua sobre a falsidade ou
autenticidade dos bens a partir de exemplares representativos da
amostra apreendida [...] contraproducente a análise de dezenas ou
mesmo de centenas de produtos praticamente idênticos para fins de
comprovação da materialidade do delito de violação de direito
autoral. Entender de forma diversa o disposto no art. 530-D do
Código de Processo Penal apenas dificultaria a apuração do delito em
questão e retardaria o término do processo judicial, em
inobservância ao princípio constitucional da razoável duração do
processo (CF, art. 5º, LXXVIII)", de modo que "a exigência do
legislador de que a perícia seja realizada sobre todos os bens
apreendidos se presta, na verdade, não para fins de comprovação da
materialidade delitiva, mas para fins de dosimetria da pena, mais
especificamente para a exasperação da reprimenda-base, uma vez que
se mostra mais acentuada a reprovabilidade do agente que reproduz,
por exemplo, com intuito de lucro, 500 obras intelectuais, [...] do
que aquele que, nas mesmas condições reproduz apenas 20". Do mesmo
modo, a Quinta Turma do STJ (AgRg no REsp 1.451.608-SP, DJe
5/6/2015) também entende que a materialidade do delito previsto no
art. 184, § 2º, do CP pode ser comprovada mediante perícia por
amostragem no material apreendido. Em relação ao segundo ponto (b),
deve-se destacar que o STJ já possui o entendimento de que é
dispensável excesso de formalismo para a constatação da
materialidade do crime de violação de direito autoral, de modo que a
simples análise de características externas dos objetos apreendidos
é suficiente para a aferição da falsidade necessária à configuração
do delito descrito no art. 184, § 2º, do CP. Nessa perspectiva,
registre-se que, conforme a Quinta Turma do STJ, a análise das
características externas, tais como a padronização das impressões
gráficas, presença de logotipo padrão, códigos IFPI, nome do
fabricante, cor do disco, e a conclusão de que os objetos não
possuem características de fabricação comuns, são suficientes a
atestar a falsificação, "até mesmo porque, na maioria dos casos, o
conteúdo da mídia falsificada é idêntico ao produto original,
situando a diferença unicamente em seus aspectos externos" (AgRg no
REsp 1.359.458-MG, DJe 19/12/2013). Ademais, seguindo o intuito da
legislação pátria de facilitar o combate à pirataria, não seria
razoável exigir minúcias no laudo pericial, como a análise do
conteúdo das mídias apreendidas, mesmo porque "a caracterização da
materialidade delitiva [...] pode ser afirmada [até mesmo] por
exames visuais sobre a mídia fraudada" (AgRg no REsp 1.441.840-MG,
Quinta Turma, DJe 10/6/2014). Com a mesma compreensão, a Sexta Turma
do STJ (AgRg no REsp 1.499.185-MG, DJe 9/3/2015). Por fim, no
tocante à terceira questão em debate (c), de fato, para a
configuração do crime em questão, é dispensável a identificação
individualizada dos titulares dos direitos autorais violados ou de
quem os represente. Isso porque a violação de direito autoral
extrapola a individualidade do titular do direito, devendo ser
tratada como ofensa ao Estado e a toda a coletividade, visto que
acarreta a diminuição na arrecadação de impostos, reduz a oferta de
empregos formais, causa prejuízo aos consumidores e aos
proprietários legítimos e fortalece o poder paralelo e a prática de
atividades criminosas conexas à venda desses bens, aparentemente
inofensiva. Sob essa orientação, posicionam-se tanto a Quinta Turma
(HC 273.164-ES, DJe 5/2/2014) quanto a Sexta Turma (AgRg no AREsp
416.554-SC, DJe 26/3/2015) do STJ. Além disso, o tipo penal descrito
no art. 184, § 2º, do CP, é perseguido, nos termos do art. 186, II,
do mesmo diploma normativo, mediante ação penal pública
incondicionada, de modo que não é exigida nenhuma manifestação do
detentor do direito autoral violado para que se dê início à ação
penal. Consequentemente, não é coerente se exigir a sua
individualização para a configuração do delito em questão.
Saliente-se, ainda, que o delito previsto no art. 184, § 2º, do CP é
de natureza formal. Portanto, não demanda, para sua consumação, a
ocorrência de resultado naturalístico, o que corrobora a
prescindibilidade de identificação dos titulares dos direitos
autorais violados ou de quem os represente para a configuração do
crime em questão. REsp 1.456.239-MG e REsp 1.485.832-MG, Rel. Min. Rogerio
Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 12/8/2015, DJe
21/8/2015.
Tá Difícil? Quer por assunto?! 💡INFORMATIVOS STJ, POR ASSUNTO. Os informativos são divididos de forma a sistematizar os assuntos tratados na Constituição Federal, leis e doutrinas. Por: Karla Viviane Ribeiro Marques e Allan dos Anjos Moura Marques. *Observar atualizações no site do STJ
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