Se, no âmbito de Assembleia
Geral de Credores, a maioria deles - devidamente representados pelas
respectivas classes - optar, por meio de dispositivo expressamente
consignado em plano de recuperação judicial, pela supressão de todas
as garantias fidejussórias e reais existentes em nome dos credores
na data da aprovação do plano, todos eles - inclusive os que não
compareceram à Assembleia ou os que, ao comparecerem, abstiveram-se
ou votaram contrariamente à homologação do acordo - estarão
indistintamente vinculados a essa determinação.
Inicialmente, cumpre destacar que se afigura absolutamente
possível que o Poder Judiciário, sem imiscuir-se na análise da
viabilidade econômica da empresa em crise, promova controle de
legalidade do plano de recuperação judicial que, em si, em nada
contemporiza a soberania da assembleia geral de credores. Nesse
contexto, dispõe o art. 59 da Lei n. 11.101/2005 que a concessão de
recuperação judicial enseja a novação das obrigações originariamente
assumidas pela recuperanda, sem prejuízo das garantias e observado o
disposto no § 1º do art. 50 da referida lei, o qual preceitua que,
na hipótese de alienação de bem objeto de garantia real, a supressão
da garantia ou sua substituição enseja o consentimento do correlato
credor. Salientado isso, cumpre afastar, peremptoriamente, argumento
no sentido de que a novação operada pela homologação do plano de
recuperação judicial importaria, por si, na imediata extinção da
obrigação principal originária e, por conseguinte, das garantias
àquela ofertadas, pois, concebidas como obrigação acessória. Isso
porque a "novação prevista na lei civil é bem diversa daquela
disciplinada na Lei n. 11.101/2005. Se a novação civil faz, como
regra, extinguir as garantias da dívida, inclusive as reais
prestadas por terceiros estranhos ao pacto (art. 364 do Código
Civil), a novação decorrente do plano de recuperação traz como
regra, ao reverso, a manutenção das garantias (art. 59,
caput, da Lei n. 11.101/2005), sobretudo as reais, as quais
só serão suprimidas ou substituídas 'mediante aprovação expressa do
credor titular da respectiva garantia', por ocasião da alienação do
bem gravado (art. 50, § 1º). Assim, o plano de recuperação judicial
opera uma novação sui generis e sempre sujeita a uma
condição resolutiva, que é o eventual descumprimento do que ficou
acertado no plano (art. 61, § 2º, da Lei n. 11.101/2005)" (REsp
1.326.888-RS, Quarta Turma, DJe 5/5/2014). No mesmo sentido: REsp
1.260.301-DF, Terceira Turma, DJe 21/8/2012. Portanto, em regra, a
despeito da novação operada pela recuperação judicial, preservam-se
as garantias, no que alude à possibilidade de seu titular exercer
seus direitos contra terceiros garantidores e impor a manutenção das
ações e execuções promovidas contra fiadores, avalistas ou
coobrigados em geral, a exceção do sócio com responsabilidade
ilimitada e solidária (§ 1º do art. 49 da Lei n. 11.101/2005). E,
especificamente sobre as garantias reais, estas somente poderão ser
supridas ou substituídas, por ocasião de sua alienação, mediante
expressa anuência do credor titular de tal garantia, nos termos do §
1º do art. 50 da referida lei. Apesar disso, o art. 49, § 2º, da Lei
n. 11.101/2009 prevê, expressamente, a possibilidade de o plano de
recuperação judicial dispor de modo diverso no tocante às garantias
anteriormente ajustadas: "As obrigações anteriores à recuperação
judicial observarão as condições originalmente contratadas ou
definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo
se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação
judicial". Diante disso, na hipótese em análise, mostra-se
inadequado restringir a supressão das garantias reais e
fidejussórias, tal como previsto no plano de recuperação judicial
aprovado pela assembleia geral, somente aos credores que tenham
votado favoravelmente nesse sentido, conferindo tratamento
diferenciado aos demais credores da mesma classe, em manifesta
contrariedade à deliberação majoritária. Aliás, compreensão diversa,
por óbvio, teria o condão de inviabilizar a consecução do plano, o
que refoge dos propósitos do instituto da recuperação judicial.
Salienta-se, ainda, que a extinção das obrigações, decorrente da
homologação do plano de recuperação judicial, encontra-se
condicionada ao efetivo cumprimento de seus termos. Não implementada
a aludida condição resolutiva, por expressa disposição legal, "os
credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas
condições originariamente contratadas" (art. 61, § 2º, da Lei n.
11.101/2005). Mais do que isso. A não implementação da condição
resolutiva ensejará, forçosamente, a decretação da falência. Quando
a lei afirma que o credor terá a seu favor a restituição de seus
direitos e garantias nas condições originariamente contratadas,
significa que o credor, na fase concursal, terá o benefício da
preferência, segundo a garantia de que é titular, no recebimento de
seu crédito. Ele não fará jus, por exemplo, ao bem sobre o
qual recaia a sua garantia. Com o decreto de falência, vende-se o
ativo para pagar o passivo, na ordem de preferência legal, segundo a
natureza dos créditos. Logo, não há razão, nem sequer prática, para
impedir que os credores, caso assim entendam necessária à consecução
do plano de recuperação judicial, transacionem a supressão das
garantias de que são titulares. Ademais, assinala-se que a
necessidade de que os credores com garantia real consintam, por
ocasião da alienação do bem dado em garantia, com a substituição ou
supressão da garantia, contemplada no art. 50, § 1º, da Lei n.
11.101/2005, afigura-se absolutamente preservada, na medida em que
todos os credores, representados pelas respectivas classes, ao
aprovarem o plano de recuperação judicial que dispôs sobre tal
matéria (supressão das garantias reais e fidejussórias), com ela
anuíram, inegavelmente. Descabido, portanto, permitir que o plano de
recuperação judicial, tal como aprovado, não seja integralmente
observado pelas partes envolvidas, a pretexto da aplicação do § 1º
do art. 50 da Lei n. 11.101/2005. REsp 1.532.943-MT, Rel. Min. Marco Aurélio
Bellizze, julgado em 13/9/2016, DJe 10/10/2016.
Tá Difícil? Quer por assunto?! 💡INFORMATIVOS STJ, POR ASSUNTO. Os informativos são divididos de forma a sistematizar os assuntos tratados na Constituição Federal, leis e doutrinas. Por: Karla Viviane Ribeiro Marques e Allan dos Anjos Moura Marques. *Observar atualizações no site do STJ
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