A cláusula de incomunicabilidade imposta a um bem transferido
por doação ou testamento só produz efeitos enquanto viver o beneficiário, sendo
que, após a morte deste, o cônjuge sobrevivente poderá se habilitar como
herdeiro do referido bem, observada a ordem de vocação hereditária. Isso porque a cláusula
de incomunicabilidade imposta a um bem não se relaciona com a vocação
hereditária. Assim, se o indivíduo recebeu por doação ou testamento bem imóvel
com a referida cláusula, sua morte não impede que seu herdeiro receba o mesmo
bem. São dois institutos distintos: cláusula de incomunicabilidade e vocação
hereditária. Diferenciam-se, ainda: meação e herança. Ressalte-se que o art.
1.829 do CC enumera os chamados a suceder e define a ordem em que a sucessão é deferida.
O dispositivo preceitua que o cônjuge é também herdeiro e nessa qualidade
concorre com descendentes (inciso I) e ascendentes (inciso II). Na falta de
descendentes e ascendentes, o cônjuge herda sozinho (inciso III). Só no inciso
IV é que são contemplados os colaterais. Pode-se imaginar, por exemplo, a
hipótese em que um bem é doado ao cônjuge (ou legado a ele) com cláusula de
inalienabilidade. Dá-se o divórcio e o bem, em virtude daquela cláusula, não
compõe o monte a ser partilhado. Outra hipótese, bem diferente, é a do cônjuge
que recebe a coisa gravada com aquela cláusula e falece. O bem, que era
exclusivo dele, passa a integrar o monte que será herdado por aqueles que a lei
determina. Monte, aliás, eventualmente composto por outros bens também exclusivos
que, nem por isso, deixam de fazer parte da herança. Não se desconhece a
existência de precedente da 4ª Turma, no qual se decidiu, por maioria, que
"estabelecida, pelo testador, cláusula restritiva sobre o quinhão da
herdeira, de incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade, o
falecimento dela não afasta a eficácia da disposição testamentária, de sorte
que procede o pedido de habilitação, no inventário em questão, dos sobrinhos da
de cujus" (REsp 246.693-SP, DJ 17/5/2004). Ressalte-se, contudo, que a
jurisprudência mais recente do STJ, seguindo a doutrina e a jurisprudência do
STF, voltou a orientar-se no sentido de que "a cláusula de
inalienabilidade vitalícia tem vigência enquanto viver o beneficiário, passando
livres e desembaraçados aos seus herdeiros os bens objeto da restrição"
(REsp 1.101.702-RS, Terceira Turma, DJe 9/10/2009). Por outro lado, a linha
exegética segundo a qual a incomunicabilidade de bens inerente ao regime de
bens do matrimônio teria o efeito de alterar a ordem de vocação hereditária
prevista no CC/2002 não encontra apoio na jurisprudência atualmente consolidada
na Segunda Seção (REsp 1.472.945-RJ, Terceira Turma, DJe 19/11/2014; REsp
1.382.170-SP, Segunda Seção, DJe 26/5/2015; AgRg nos EREsp 1.472.945-RJ,
Segunda Seção, DJe 29/6/2015). REsp 1.552.553-RJ, Rel.
Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 24/11/2015, DJe 11/2/2016.
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